4. A graça pode-se perder ou em outras palavras, aqueles que tiveram uma real experiência com Deus podem perder o seu estado de graça?


A resposta a esta pergunta é afirmativa; a Escritura diz claramente que existe esta eventualidade ou possibilidade.

Vejamos quais são as Escrituras que testificam isto.

O escritor aos Hebreus afirma quanto se segue: "Porque é impossível que os que uma vez foram iluminados, e provaram o dom celestial, e se fizeram participantes do Espírito Santo, e provaram a boa palavra de Deus, e os poderes do mundo vindouro, e depois caíram, sejam outra vez renovados para arrependimento; visto que, quanto a eles, estão crucificando de novo o Filho de Deus, e o expondo ao vitupério. Pois a terra que embebe a chuva, que cai muitas vezes sobre ela, e produz erva proveitosa para aqueles por quem é lavrada, recebe a bênção da parte de Deus; mas se produz espinhos e abrolhos, é rejeitada, e perto está da maldição; o seu fim é ser queimada" (Heb. 6:4-8). A respeito destas palavras queria dizer algumas coisas para explicá-las. Antes de tudo quero dizer que aqueles dos quais se diz "e depois caíram" são identificados como verdadeiros crentes. Por que digo isto? Porque alguns quando explicam estas palavras querem fazer passar aqueles dos quais fala o escritor por não crentes, ou melhor, por não verdadeiros crentes, em suma por alguém que parecia exteriormente um crente mas na realidade não o era. Isto é falso porque as características enunciadas pelo escritor não deixam minimamente pensar uma coisa do género, e também porque o escritor se dirigia a crentes e não faria sentido avisá-los de um perigo que para eles não existia porque eram verdadeiros crentes tomando como exemplo o que podia suceder a crentes fingidos! E não só, dizemos também que as palavras supracitadas se referem a crentes maduros, bem versados na Palavra de Deus, e não a meninos em Cristo. Mas vejamos de mais perto as palavras antes mencionadas.

Aqueles que foram uma vez iluminados são os crentes que, depois de terem vivido uma vida nas trevas, pela Palavra de Deus que é luz e o Espírito Santo que foi enviado ao mundo para convencer o mundo do pecado, da justiça e do juízo, reconheceram as suas transgressões e decidiram invocar o Senhor para que tivesse piedade deles. Uma grande luz se levantou sobre eles naquele bem-aventurado dia; as trevas se dissiparam e a luz do Senhor veio sobre eles. Eles foram portanto feitos idóneos para ver a luz. Que a passagem se refere a crentes é confirmado pelo facto de mais adiante o escritor dizer àqueles irmãos para se recordarem "dos dias passados, em que, depois de serdes iluminados , suportastes grande combate de aflições …." (Heb. 10:32).

Uma vez iluminados eles provaram o dom celestial, que é de se entender como a vida eterna porque o dom de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus nosso Senhor (cfr. Rom. 6:23). João diz referindo-se a Jesus que Ele é "o verdadeiro Deus e a vida eterna" (1 João 5:20). Evidentemente quem prova o dom celestial prova a bondade de Deus, prova quanto o Senhor é bom e de facto Pedro falando aos santos diz: "Se é que já provastes que o Senhor é bom" (1 Ped. 2:3).

Provado o dom celestial eles também se fizeram participantes do Espírito Santo o que significa que eles receberam o Espírito Santo, ou seja, que eles receberam o batismo com o Espírito Santo com a evidência de falar em outras línguas conforme o Espírito concede que se fale. Como quando se recebe Cristo se passa a ser participante de Cristo (cfr. Heb. 3:14), assim quando se recebe o batismo com o Espírito Santo se é feito participante do Espírito Santo que é o penhor da nossa herança.

Além de terem recebido o Espírito Santo eles provaram a boa palavra de Deus porque têm o seu deleite na Palavra de Deus, pelo que a meditam e a praticam; ela se tornou a sua alegria. O seu interesse na palavra de Deus portanto não é superficial mas profundo.

Eles receberam também dons da parte do Espírito Santo, com efeito, provaram os poderes do mundo vindouro. Os dons do Espírito Santo não são poderes deste mundo. Portanto eles receberam algum dos seguintes dons: dons de revelação (palavra de sabedoria, palavra de ciência, discernimento dos espíritos); dons de palavra (profecia, diversidade de línguas, interpretações de línguas); dons de operação (milagres, curas, fé).

Ora, se eles depois caíram, e repito SE DEPOIS CAÍRAM, então para eles não há mais alguma possibilidade de se arrependerem e voltar ao Senhor. Queria porém dizer que este "e depois caíram" não se refere a uma qualquer queda porque está também escrito que "sete vezes cairá o justo, e se levantará" (Prov. 24:16). Mas a uma queda da qual ninguém se pode mais levantar, de facto, prosseguindo o escritor diz que neste caso, isto é, se caíram nesta queda, então "é impossível que...sejam outra vez renovados para arrependimento; visto que, quanto a eles, estão crucificando de novo o Filho de Deus, e o expondo ao vitupério …". Que é de entender assim esse "e depois caíram" é confirmado pelo facto de o Senhor conceder um tempo para arrependimento a quem peca, ou seja, a quem cai. Nas Escrituras do Novo Testamento temos o exemplo daqueles seus servos que cometiam fornicação com Jezabel na igreja de Tiatira (cfr. Apoc. 2:21-22) dos quais o Senhor disse que se não se arrependessem das obras dela os lançaria num leito de dores (cfr. Apoc. 2:22). Há também o exemplo daqueles crentes que no seio da igreja de Corinto tinham pecado, eles tinham recebido um tempo para se arrependerem, com efeito, Paulo diz deles: "Dantes pecaram, e não se arrependeram da imundícia, da fornicação e da desonestidade que cometeram" (2 Cor. 12:21). Reitero portanto que a eventual queda de Hebreus 6:6 não se refere a uma qualquer queda.

Ora, dito no que é que não consiste esta queda, dizemos no que consiste. Esta queda consiste na voluntária negação do Senhor, no abandono da fé, e na decisão de não seguir mais o Senhor. Não num desvio da verdade de que ainda alguém se pode arrepender e voltar ao Senhor, de facto Tiago diz: "Irmãos, se algum de entre vós se tem desviado da verdade, e alguém o converter, saiba que aquele que fizer converter do erro do seu caminho um pecador, salvará da morte uma alma, e cobrirá uma multidão de pecados" (Tiago 5:19-20), e Paulo falando da forma de como o servo do Senhor se deve comportar diz: "E ao servo do Senhor não convém contender, mas sim ser manso para com todos, apto a ensinar, sofredor, instruindo com mansidão os que resistem, a ver se porventura Deus lhes dará arrependimento para conhecerem a verdade, e tornarem a despertar, desprendendo-se dos laços do diabo, em que à vontade dele estão presos" (2 Tim. 2:24-26); mas num desvio eterno, do qual não haverá mais a possibilidade de voltar ao Senhor. A propósito da impossibilidade de arrependimento de novo destes, queria fazer notar que é óbvio que se a Escritura diz que "se depois caíram é impossível de novo levá-los para arrependimento", isto significa que um dia foram levados ao arrependimento; isto confirma pois que se trata de verdadeiros crentes. O que espera então aqueles que caem desta maneira? O diz ainda o escritor aos Hebreus com estas palavras mais adiante: "Porque, se pecarmos voluntariamente, depois de termos recebido o conhecimento da verdade, já não resta mais sacrifício pelos pecados, mas uma expectação horrível de juízo, e ardor de fogo, que há de devorar os adversários. Quebrantando alguém a lei de Moisés, morre sem misericórdia, pela palavra de duas ou três testemunhas. De quanto maior castigo cuidais vós será julgado merecedor aquele que pisar o Filho de Deus, e tiver por profano o sangue do pacto com que foi santificado, e ultrajar ao Espírito da graça? Porque bem conhecemos aquele que disse: Minha é a vingança, eu darei a recompensa, diz o Senhor. E outra vez: O Senhor julgará o seu povo. Horrenda coisa é cair nas mãos do Deus vivo" (Heb. 10:26-31). Portanto a estes os espera o fogo que devorará os adversários, a punição que os espera é definida um castigo maior do que aquele que merece quem violou a lei de Moisés. E por que motivo? Porque pisou o Filho de Deus e teve por profano o sangue do Pacto (isto é, o de Jesus Cristo) com o qual foi santificado (ulterior confirmação esta que um dia tinha-se tornado um santo participante portanto de uma vocação celestial), e ultrajou o Espírito Santo. O ultraje ao Espírito Santo (ou blasfémia contra o Espírito Santo) portanto é algo que faz parte da negação do Senhor por parte de um crente, e não há perdão para ele. Que deste pecado contra o Espírito Santo não se pode obter a remissão é confirmado por Jesus Cristo que disse que "todo pecado e blasfémia se perdoará aos homens; mas a blasfémia contra o Espírito não será perdoada" (Mat. 12:31).

Concluo de responder a esta precisa pergunta recordando-vos estas palavras do apóstolo Paulo: "Palavra fiel é esta: que, se morrermos com ele, também com ele viveremos; se tivermos constância na prova, também com ele reinaremos; se o negarmos, também ele nos negará; se formos infiéis, ele permanece fiel: não pode negar-se a si mesmo" (2 Tim. 2:11-13). O nosso propósito deve ser pois o de morrer com Cristo, para viver com ele; e ter constância na prova para um dia reinar com ele; longe de nós negar o Senhor, neste caso também ele nos negará e nós iremos para a perdição. Certo, durante esta nossa peregrinação falhamos em muitas coisas, mas temos a promessa que ele permanece fiel para connosco. Como diz, com efeito, o apóstolo João: "Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo, para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda a iniquidade" (1 João 1:9). Oh, Senhor nosso Deus quão grande é a tua fidelidade para connosco. A Ti seja a glória agora e eternamente. Amen.



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