5. Como foram salvos os santos do Antigo Testamento? Pela sua fé ou pelas suas obras?


Pela fé. Que diz de facto a Escritura? Ela diz que pela fé "os antigos alcançaram bom testemunho" (Heb. 11:2), onde por bom testemunho se entende que os antigos foram declarados por Deus justos, pessoas que a ele eram agradáveis, em virtude da sua fé em Deus.

Tomemos por exemplo Abel, não diz porventura a Escritura que "pela fé Abel ofereceu a Deus mais excelente sacrifício que Caim, pela qual alcançou testemunho de que era justo, dando Deus testemunho das suas oferendas, e por meio dela depois de morto, ainda fala.." (Heb. 11:4)? Portanto Deus testemunhou de Abel que ele era justo, em virtude da sua fé, e não dos seus sacrifícios.

Vejamos agora o que diz a Escritura de Enoque, o sétimo depois de Adão: "Pela fé Enoque foi trasladado para não ver a morte; e não foi achado, porque Deus o trasladara; pois antes da sua trasladação alcançou testemunho de que agradara a Deus" (Heb. 11:5). Naturalmente ele agradara a Deus mediante a sua fé, como no caso de Abel portanto também ele foi justificado pela fé.

Passemos agora a Noé; a Escritura diz dele: "Pela fé Noé, divinamente avisado das coisas que ainda não se viam, temeu e, para salvação da sua família, preparou a arca, e por essa fé condenou o mundo, e foi feito herdeiro da justiça que é segundo a fé" (Heb. 11:7). Como se pode ver Noé preparou a arca pela fé, pela fé condenou o mundo de então, e pela mesma fé foi feito herdeiro da justiça que é segundo a fé. Presta muita atenção em particular a este ter sido feito herdeiro da justiça que é segundo a fé, porque isto explica que o facto de Noé ter sido declarado justo foi em virtude da sua fé em Deus (que naturalmente foi acompanhada por uma vida justa). Não poderia ser doutra forma, porque "a herança é pela fé, para que seja segundo a graça" (Rom. 4:16).

Mas falemos agora de Abraão, nosso pai, porque não se pode falar da justificação debaixo do Antigo Testamento sem falar dele. Paulo fala muito da fé de Abraão tomando-a como exemplo de fé através da qual se é justificado, não obstante Abraão tivesse vivido quando ainda a justiça de Deus em Cristo não tinha ainda sido manifestada. Eis o que diz Paulo: "Que diremos, pois, ter alcançado Abraão, nosso pai segundo a carne? Porque, se Abraão foi justificado pelas obras, tem de que se gloriar, mas não diante de Deus.Pois, que diz a Escritura? Creu Abraão a Deus, e isso lhe foi imputado como justiça. Ora, àquele que faz qualquer obra não lhe é imputado o galardão segundo a graça, mas segundo a dívida. Mas, àquele que não pratica, mas crê naquele que justifica o ímpio, a sua fé lhe é imputada como justiça. Assim também Davi declara bem-aventurado o homem a quem Deus imputa a justiça sem as obras, dizendo: Bem-aventurados aqueles cujas maldades são perdoadas, e cujos pecados são cobertos. Bem-aventurado o homem a quem o Senhor não imputa o pecado. Vem, pois, esta bem-aventurança sobre a circuncisão somente, ou também sobre a incircuncisão? Porque dizemos que a fé foi imputada como justiça a Abraão. Como lhe foi, pois, imputada? Estando na circuncisão ou na incircuncisão? Não na circuncisão, mas na incircuncisão. E recebeu o sinal da circuncisão, selo da justiça da fé quando estava na incircuncisão, para que fosse pai de todos os que crêem, estando eles também na incircuncisão; a fim de que também a justiça lhes seja imputada; e fosse pai da circuncisão, daqueles que não somente são da circuncisão, mas que também andam nas pisadas daquela fé que teve nosso pai Abraão, que tivera na incircuncisão. Porque a promessa de que havia de ser herdeiro do mundo não foi feita pela lei a Abraão, ou à sua posteridade, mas pela justiça da fé. Porque, se os que são da lei são herdeiros, logo a fé é vã e a promessa é aniquilada. Porque a lei opera a ira. Porque onde não há lei também não há transgressão. Portanto, a herança é pela fé, para que seja segundo a graça, a fim de que a promessa seja firme a toda a posteridade, não somente à que é da lei, mas também à que é da fé que teve Abraão, o qual é pai de todos nós, (como está escrito: Por pai de muitas nações te constituí) perante aquele no qual creu, a saber, Deus, o qual vivifica os mortos, e chama as coisas que não são como se já fossem. O qual, em esperança, creu contra a esperança, para que se tornasse pai de muitas nações, conforme o que lhe fora dito: Assim será a tua descendência. E não enfraqueceu na fé, nem atentou para o seu próprio corpo já amortecido, pois era já de quase cem anos, nem tampouco para o amortecimento do ventre de Sara. E não duvidou da promessa de Deus por incredulidade, mas foi fortificado na fé, dando glória a Deus, e estando certíssimo de que o que ele tinha prometido também era poderoso para o fazer. Assim isso lhe foi também imputado como justiça. Ora, não só por causa dele está escrito, que lhe fosse tomado em conta, mas também por nós, a quem será tomado em conta, os que cremos naquele que dentre os mortos ressuscitou a Jesus nosso Senhor; o qual por nossos pecados foi entregue, e ressuscitou para nossa justificação" (Rom. 4:1-25). Quereria fazer-te notar em particular estas palavras "recebeu o sinal da circuncisão, selo da justiça da fé quando estava na incircuncisão" porque elas mostram muito claramente que Abraão foi justificado quando creu na promessa que Deus lhe fez, por isso antes de ser circunciso na carne. Pela graça portanto.

Em virtude destes exemplos acabados de ver, devemos portanto dizer que também a justificação que acontecia debaixo do Antigo Testamento era feita por Deus mediante a fé dos que criam n`Ele. Esta fé naturalmente implicava também a fé no Messias que devia vir na plenitude dos tempos para fazer a propiciação dos nossos pecados, porque aqueles homens creram em tudo o que Deus tinha preanunciado (mesmo que porventura só através dos símbolos) dever acontecer com a vinda do seu Ungido.

Aliás, não se pode pensar que debaixo do Antigo Testamento Deus justificasse o homem pelas suas obras, porque desta maneira forneceria ao homem a possibilidade de se gloriar na sua presença, coisa que Deus detesta e em todo o tempo evitou que acontecesse. Há muitas histórias debaixo do Antigo Testamento que nos ensinam como Deus sempre operou na antiguidade de maneira a impedir a quem quer que fosse de se poder gloriar na sua presença. Quero só citar o exemplo de Gideão, em torno do qual se tinham reunido trinta e dois mil homens para ir combater contra os Midianitas e libertar assim Israel, mas a quem Deus disse: "Muito é o povo que está contigo, para eu dar aos midianitas em sua mão; a fim de que Israel não se glorie contra mim, dizendo: A minha mão me livrou. Agora, pois, apregoa aos ouvidos do povo, dizendo: Quem for medroso e tímido, volte, e retire-se apressadamente das montanhas de Gileade. Então voltaram do povo vinte e dois mil, e dez mil ficaram" (Juízes 7:2-3). E também depois, lhe disse que eram ainda demasiados os homens, tanto que no fim só ficaram trezentos (Juízes 7:4-8), através dos quais Deus deu os Midianitas na mão de Gideão. Se numa situação do género Deus quis tirar a Israel a possibilidade de se gloriar pela libertação que ele operou em seu favor, quanto mais Deus quis tirar aos homens também debaixo do Antigo Testamento a possibilidade de se poderem gloriar na sua presença a propósito da sua justificação.

Deus é sábio, Ele operou sempre de maneira a tomar toda a glória para si e nunca concedê-la a nenhum outro, e isto também em relação à salvação. A Ele seja a glória agora e eternamente. Amen.



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