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   Capitulo 4  O papado  | 
 
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   A doutrina
  dos teólogos papistas  | 
 
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   O papa é o sucessor de Pedro, e portanto
  o chefe visível da Igreja de Cristo. Ele tem entre outros poderes, o de fazer
  santo alguém morto em fama de santidade, de abrir o reino dos céus e de fechá-lo
  a quem quer porque possui as chaves dele, e quando define doutrinas em
  matéria de fé e de moral é infalível. ‘O Papa é o sucessor de são
  Pedro na sede de Roma e no primado, ou seja, no apostolado e
  episcopado universal; portanto o cabeça visível, Vigário de Jesus Cristo
  cabeça invisível, de toda a Igreja, a qual por isso se diz Católica-Romana’
  (Giuseppe Perardi, op. cit., pag. 198). Ele é definido bispo universal
  porque Jesus disse a Pedro para apascentar os seus cordeiros e as suas
  ovelhas (cfr. João 21:15-18); chefe da Igreja e príncipe dos apóstolos porque
  Jesus disse ainda a Pedro: "Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a
  minha Igreja" (Mat. 16:18). Além destas passagens os teólogos papistas
  tomam outras, que citaremos e explicaremos em seguida, para sustentar o
  primado de Pedro. Mas por que motivo é dito que precisamente ele, o ‘bispo’
  de Roma, e não um outro bispo duma outra cidade, é o sucessor de Pedro, e
  portanto o chefe da Igreja? Porque - diz a tradição papista - Pedro foi a
  Roma, lá fundou a Igreja, a pastoreou por mais de vinte anos deixando depois
  o seu ministério aos seus sucessores. Ainda este homem é chamado santo padre,
  tem o poder de declarar santo alguém que morreu e tem as chaves do reino dos
  céus.  | 
 
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   O papa é definido também infalível quando fala
  ‘ex-catedra’. Eis o que diz o catecismo a tal respeito: ‘O Papa, sozinho,
  não pode errar ao ensinar-nos as verdades reveladas por Deus, ou seja, é
  infalível como a Igreja (quando como Pastor e Mestre de
  todos os cristãos, define doutrinas acerca da fé e costumes)’
  (Giuseppe Perardi, op. cit., pag. 207). A infalibilidade papal foi
  declarada dogma pelo concílio Vaticano I em 1870 nestes termos: ‘Nós
  ensinamos, e definimos ser dogma divinamente revelado que o Romano Pontífice,
  quando fala ex cathedra, isto é, quando cumprindo o seu ofício de
  pastor e mestre de todos os cristãos, em virtude da sua suprema autoridade
  apostólica, define que uma doutrina referente à fé ou costumes deve ser
  professada por toda a igreja, pela assistência divina que lhe foi prometida
  na pessoa de Pedro, goza daquela infalibilidade que o Redentor divino quis
  dotada a sua Igreja quando define alguma doutrina sobre a fé ou costumes.
  Portanto estas definições do Bispo de Roma são irreformáveis por virtude
  própria, e não pelo consenso da Igreja [1].
  Se, porém, alguém ousar contrariar esta nossa definição, o que Deus não
  permita, - seja anátema.’ (Concílio Vaticano I, Sess. IV, cap. IV) [2].  | 
 
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   Confutação  | 
 
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   Aquele que é
  chamado papa não é o bispo universal   | 
 
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   O título de bispo universal foi dado pela
  primeira vez pelo imperador Focas (que em 602 tinha subido ao trono de
  Constantinopola depois de ter morto o seu predecessor e a sua família) ao
  bispo de Roma Bonifácio III (607), título que contudo tinha sido recusado
  pelo seu predecessor Gregório I (590-604). Esta é a origem deste apelativo
  dado ao chefe da igreja romana. Passemos
  agora a demonstrar com as Escrituras que aquele que é chamado papa não é o
  bispo universal.  | 
 
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   Ora,
  segundo a Escritura todos os crentes que estão sobre a terra têm sim bispos
  (os anciãos) que os vigiam e os apascentam por ordem de Deus, mas acima deles
  não está de modo nenhum o chefe do Estado do Vaticano, mas o nosso Senhor
  Jesus Cristo que Pedro chama o Pastor e Bispo das nossas almas. Eis quem é o
  Bispo universal, Jesus Cristo, o Filho de Deus que está sentado à direita de
  Deus. Mas então quem é este que definem papa? Certamente um impostor, que
  tomou um título que de modo nenhum lhe convém. As seguintes Escrituras
  testificam que Jesus Cristo é o Pastor da sua Igreja.   | 
 
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    Isaías disse dele: "Como pastor
  apascentará o seu rebanho; entre os seus braços recolherá os cordeirinhos, e
  os levará no seu regaço; as que amamentam guiará suavemente" (Is.
  40:11);  | 
 
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    Deus disse através de Ezequiel do seu
  Cristo: "E suscitarei sobre elas um só pastor, e ele as apascentará; o
  meu servo Davi é que as apascentará; ele lhes servirá de pastor" (Ez.
  34:23);  | 
 
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  Miquéias disse do Cristo: "E ele permanecerá, e apascentará o seu
  rebanho com a força do Senhor.." (Mic. 5:3);  | 
 
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  Em Zacarias está escrito: "Assim diz o Senhor meu Deus: Apascenta as
  minhas ovelhas..." (Zac. 11:4);  | 
 
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  Jesus disse: "Eu sou o bom Pastor, e conheço as minhas ovelhas, e das
  minhas sou conhecido..." (João 10:14); e: "Ainda tenho outras
  ovelhas que não são deste aprisco; também me convém agregar estas, e elas
  ouvirão a minha voz, e haverá um rebanho e um Pastor" (João 10:16).  | 
 
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   É
  verdade que Jesus, depois que foi ressuscitado dos mortos, disse a Simão
  Pedro: "Apascenta os meus cordeiros.... Apascenta as minhas ovelhas...
  Apascenta as minhas ovelhas" (João 21:15,16,17),
  mas Pedro nunca se arrogou o título de bispo supremo da Igreja de Cristo,
  tanto é verdade que na sua primeira epístola diz aos santos: "Porque
  éreis desgarrados, como ovelhas; mas agora tendes voltado ao Pastor e Bispo
  das vossas almas" (1 Ped. 2:25) (que não era ele, mas Jesus Cristo). E
  aos anciãos ele diz: "Aos anciãos, que estão entre vós, admoesto eu, que
  sou também ancião com eles, e testemunha das aflições de Cristo, e
  participante da glória que se há de revelar: Apascentai o rebanho de
  Deus..." (1 Ped. 5:1,2); depois diz-lhes como devem fazê-lo e por
  fim diz-lhes: "E, quando se manifestar o sumo Pastor, recebereis a
  imarcescível coroa da glória" (1 Ped. 5:4). Pedro portanto de modo
  nenhum se considerava o bispo universal mas apenas um dos bispos (os anciãos)
  que apascentavam a Igreja de Deus naqueles dias. Para ele o Bispo universal
  era Cristo Jesus.  | 
 
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   Estas são as razões pelas quais nós não
  aceitamos o chefe do Estado do Vaticano como Bispo supremo da Igreja, porque
  a Escritura testifica que o Pastor e Bispo das nossas almas é só Cristo
  Jesus, e que o apóstolo Pedro não foi constituído Pastor supremo da Igreja
  primitiva com a autoridade de transmitir aos seus sucessores esta dignidade;
  e portanto não é verdade que Pedro transmitiu o seu bispado a um seu sucessor
  (que segundo os teólogos católicos foi um bispo da Igreja de Roma do primeiro
  século depois de Cristo).  | 
 
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   O apóstolo
  Pedro não foi constituído cabeça da Igreja e não deixou sucessores   | 
 
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   O chefe do Estado do Vaticano não pode ser
  definido de nenhuma maneira o sucessor de Pedro. A razão é porque Jesus nunca
  conferiu a Simão Pedro o primado sobre os outros apóstolos e sobre a Igreja
  dizendo-lhe para depois transmiti-lo a outros; por conseguinte os que ensinam
  que ele estava à cabeça da Igreja de então e que o seu primado tenha sido por
  ele transmitido a algum outro ensinam uma falsa doutrina e enganam os que a
  aceitam. Agora demonstraremos pelas Escrituras o quanto acabado de dizer
  começando por explicar a passagem do "Tu és Pedro..." (Mat. 16:18)
  em Mateus, porque é sobre esta que os teólogos papistas se apoiam para
  explicar que Pedro foi constituído por Cristo cabeça e fundamento da Igreja,
  e portanto que foi o primeiro papa.  | 
 
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   Ora, Jesus disse a Pedro: "Tu és Pedro, e
  sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não
  prevalecerão contra ela; e eu te darei as chaves do reino dos céus; e tudo o
  que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que desligares na terra
  será desligado nos céus" (Mat. 16:18,19). Estas palavras Jesus as
  dirigiu a Pedro depois que este lhe disse diante dos outros discípulos:
  "Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo" (Mat. 16:16), e nós cremos
  nele, com efeito, cremos que Jesus Cristo edificou a sua Igreja sobre a única
  pedra angular que existe em todo o templo de Deus e que é ele mesmo, o Filho
  de Deus, e não Pedro, nada tirando ao facto de Pedro ser uma parte do
  fundamento posto por Cristo sobre si. Que "esta pedra", a quem
  Jesus fez referência nessa resposta a Simão Pedro, é o próprio Jesus Cristo,
  e que o facto de pouco antes ele se ter dirigido a Pedro dizendo-lhe:
  "Tu és Pedro.." não significa que esta pedra é Pedro, o se deduz
  também pelo confronto com estas palavras que Jesus disse aos Judeus: "A
  pedra que os edificadores rejeitaram, essa foi posta como pedra angular... E
  quem cair sobre esta pedra será despedaçado; mas aquele sobre quem ela cair
  será reduzido a pó" (Mat. 21:42,44). Porquê? Porque nestas palavras
  Jesus dizendo "sobre esta pedra" se referiu a ele mesmo e não a
  algum outro; certo não disse ‘sobre mim mesmo’, mas é evidente que falou dele
  e não de algum outro. Portanto, também o "sobre esta pedra"
  presente no discurso de Jesus a Pedro significa sobre Cristo e não sobre
  Pedro. Por isso, como Jesus quando disse "quem cair sobre esta
  pedra" não quis dizer: ‘Quem cair sobre Simão Pedro’, assim também
  quando ele disse: "Sobre esta pedra edificarei a minha Igreja" não
  disse: ‘Sobre Simão Pedro edificarei a minha igreja’, porque em ambos os
  discursos "esta pedra" é ele mesmo e nenhum outro.  | 
 
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   As seguintes Escrituras testificam claramente
  que Pedro não foi constituído por Cristo nem o fundamento da Igreja, nem o
  príncipe dos apóstolos e nem o chefe supremo da Igreja.  | 
 
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  Paulo diz aos Efésios: "Assim que já não sois estrangeiros, nem
  forasteiros, mas concidadãos dos santos, e da família de Deus; edificados
  sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, de que Jesus Cristo é a
  principal pedra angular; no qual todo o edíficio, bem ajustado, cresce para
  templo santo no Senhor" (Ef. 2:19-21). A casa de Deus é uma casa
  espiritual formada por pedras vivas, isto é, por homens e mulheres
  vivificados por Cristo, e tem como fundamento na base dela Cristo Jesus, a
  pedra angular. Mas sobre Cristo foi posto um outro fundamento por Deus que é
  constituído pelos apóstolos e pelos profetas, e de facto nós filhos de Deus
  nos baseamos na nossa vida sobre os ensinamentos de Cristo Jesus, sobre os
  dos apóstolos e sobre as palavras dos profetas. Mas permanece o facto de a
  Cabeça e o Fundamento da Igreja permanecer sempre Cristo porque ele é o
  Salvador do corpo. Como podeis ver nas palavras de Paulo não se entrevê a
  mínima prova da supremacia do apóstolo Pedro sobre os outros apóstolos,
  precisamente porque Pedro é um dos apóstolos que formam o fundamento da
  Igreja e não o único apóstolo de que é formado o fundamento.  | 
 
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  O apóstolo Paulo diz aos Coríntios: "Segundo a graça de Deus que me foi
  dada, pus eu, como sábio arquiteto, o fundamento, e outro edifica sobre ele;
  mas veja cada um como edifica sobre ele. Porque ninguém pode pôr outro
  fundamento além do que já está posto, o qual é Jesus Cristo" (1 Cor.
  3:10,11). Estas palavras de Paulo, junto com estas outras palavras suas
  escritas aos Romanos: "De maneira que desde Jerusalém, e arredores, até
  ao Ilírico, tenho pregado o evangelho de Jesus Cristo. E desta maneira me
  esforcei por anunciar o evangelho, não onde Cristo foi nomeado, para não
  edificar sobre fundamento alheio" (Rom. 15:19,20), confirmam que o
  fundamento da Igreja de Deus é Cristo Jesus, e não Pedro ou o seu presumido
  sucessor como antes afirma a igreja romana.   | 
 
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  O apóstolo Pedro na sua primeira epístola diz: "Chegando-vos para ele,
  pedra viva, reprovada, na verdade, pelos homens, mas para Deus eleita e
  preciosa, vós também, como pedras vivas, sois edificados casa espiritual...
  Por isso também na Escritura se contém: Eis que ponho em Sião uma pedra
  angular, eleita e preciosa; e quem nela crer não será confundido" (1
  Ped. 2:4-6), e aos principais sacerdotes e aos anciãos disse do Cristo:
  "Ele é a pedra que foi rejeitada por vós, os edificadores, a qual foi
  posta como pedra angular" (Actos 4:11). Portanto Pedro definiu Jesus
  pedra viva, eleita e preciosa e também a pedra angular que Deus tinha
  prometido pôr em Sião depois de ter sido rejeitada pelos edificadores;
  portanto ele mesmo reconheceu que Cristo era a primeira pedra de toda a
  construção e que todos os crentes (ele incluído) eram como pedras vivas que
  se deviam chegar à pedra viva que é Cristo. Que fazem antes os teólogos católicos
  romanos? Desconhecem Cristo Jesus como a pedra angular, e de facto a igreja
  romana não tem como fundamento Cristo Jesus, mas o papado que funda a sua
  existência sobre a mentira e sobre a hipocrisia. Se a igreja romana estivesse
  verdadeiramente fundada sobre Cristo Jesus (como diz estar) ela se ateria às
  palavras de Cristo e não anularia o ensinamento de nosso Senhor Cristo Jesus
  e o dos apóstolos.  | 
 
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  Marcos diz: "Chegaram a Cafarnaum. E estando ele em casa,
  perguntou-lhes: Que estáveis discutindo pelo caminho? Mas eles se calaram,
  porque pelo caminho haviam discutido entre si qual deles era o maior. E ele,
  sentando-se, chamou os doze e lhes disse: se alguém quiser ser o primeiro,
  será o derradeiro de todos e o servo de todos" (Mar. 9:33-35). Ora, se
  Pedro tivesse sido o príncipe dos apóstolos de certo Jesus o teria dito nesta
  ocasião em que os discípulos tinham discutido entre eles para saber quem era
  o maior; mas por aquilo que diz Marcos, Jesus não declarou Pedro o maior dos
  apóstolos. Ele disse que quem dentre eles queria ser o primeiro devia ser o
  servo de todos. E além disso, importa dizer que dado que esta disputa entre
  os discípulos aconteceu depois que Jesus declarou bem-aventurado Simão Pedro
  pela sua confissão de fé e lhe disse: "Tu és Pedro, e sobre esta pedra
  edificarei a minha igreja..." (Mat. 16:18), é evidente que os discípulos
  a essas palavras de Jesus dirigidas a Pedro não lhes tinham de modo nenhum
  dado a interpretação que lhes dão os teólogos papistas. Porquê? Porque doutra
  forma eles não teriam discutido entre si quem era o maior, tendo sido a
  questão resolvida anteriormente por Jesus.  | 
 
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    Paulo aos Gálatas chama Tiago, Cefas, e João
  "aqueles que pareciam ser alguma coisa" (Gal. 2:6) e também aqueles
  "que gozam maior consideração" (Gal. 2:6 Riveduta), e diz que eles
  eram "considerados como as colunas" (Gal. 2:9) na Igreja. Também
  nestas palavras de Paulo, Pedro não ocupa uma posição de domínio sobre os
  outros apóstolos ou sobre a Igreja de Deus porque é contado entre as colunas
  da Igreja junto com outros dois apóstolos. Da forma como, pelo contrário,
  falam os teólogos católicos romanos Pedro era a coluna portante da inteira
  Igreja. Em quem crer pois? Em Paulo, de certo, porque ele falava da parte de
  Deus em Cristo  | 
 
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  Depois que Jesus foi elevado ao céu, antes que chegasse o dia de Pentecostes,
  o apóstolo Pedro levantou-se no meio dos irmãos que estavam congregados, que
  chegavam quase a cento e vinte pessoas, e disse antes de tudo que tinha sido
  necessário que se cumprisse o que o Espírito Santo tinha dito através de Davi
  acerca de Judas Iscariotes, depois disse estas palavras: "É necessário,
  pois, que, dos homens que conviveram conosco todo o tempo em que o Senhor
  Jesus entrou e saiu dentre nós, começando desde o batismo de João até ao dia em
  que de entre nós foi recebido em cima, um deles se faça conosco testemunha da
  sua ressurreição" (Actos 1:21,22). E isso foi feito porque lançaram
  sortes entre Matias e José, e tendo sido sorteado Matias ele foi acrescentado
  aos onze. Notai que não foi Pedro a decidir quem devia tomar o lugar de
  Judas, mas a sorte. Isto confirma que Pedro no seio da Igreja não possuía o
  lugar de ‘chefe da Igreja’, como antes assegura a cúria romana, porque doutra
  forma teria escolhido ele o sucessor de Judas.  | 
 
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  Em Jerusalém quando se reuniram os apóstolos e os anciãos para discutir uma
  importante questão que tinha surgido, isto é, se circuncidar os Gentios e
  mandar-lhes observar a lei ou não, o apóstolo Pedro não ocupou a posição de
  príncipe dos apóstolos ou de bispo universal. Está escrito de facto: "E,
  havendo grande contenda levantou-se Pedro e disse-lhes: Varões irmãos, bem
  sabeis que já há muito tempo Deus me elegeu dentre vós, para que os gentios
  ouvissem da minha boca a palavra do evangelho, e cressem. E Deus, que conhece
  os corações, lhes deu testemunho, dando-lhes o Espírito Santo, assim como
  também a nós; e não fez diferença alguma entre eles e nós, purificando os
  seus corações pela fé. Agora, pois, por que tentais a Deus, pondo sobre a
  cerviz dos discípulos um jugo que nem nossos pais nem nós podemos suportar?
  Mas cremos que seremos salvos pela graça do Senhor Jesus Cristo, como eles
  também" (Actos 15:7-11). Depois de Pedro falaram também Paulo e Barnabé,
  e por fim Tiago que foi o que julgou que não se devia perturbar os crentes
  dentre os Gentios, mas ordenar-lhes que se abstivessem das coisas
  sacrifícadas aos ídolos, da fornicação, das coisas sufocadas e do sangue.
  Ora, se Pedro tivesse tido a prioridade em todas as coisas seguramente isso
  se teria manifestado em Jerusalém naquela importante reunião, mas é
  necessário dizer que, ainda uma vez, da sua embandeirada supremacia não há a
  mínima prova. Pedro sim falou em primeiro, mas aquele que disse o que era
  necessário dizer aos Gentios evitar foi Tiago e não Pedro, de facto ele
  disse: "Pelo que julgo que não se deve perturbar aqueles, dentre os
  gentios, que se convertem a Deus..." (Actos 15:19). E cuidai que o que
  Tiago disse não foi um conselho mas um juízo; digo isto porque os
  sustentadores do primado de Pedro tendem com os seus discursos a fazê-lo
  passar por uma simples sugestão.  | 
 
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  "Os apóstolos, pois, que estavam em Jerusalém, ouvindo que Samaria
  recebera a Palavra de Deus, enviaram para lá Pedro e João; os quais, tendo
  descido, oraram por eles, para que recebessem o Espírito Santo. Porque sobre
  nenhum deles tinha ainda descido; mas somente eram batizados em nome do
  Senhor Jesus. Então lhes impuseram as mãos, e receberam o Espírito
  Santo" (Actos 8:14-17). Também neste caso não emerge da maneira mais
  absoluta que Pedro fosse o Príncipe dos apóstolos ou o chefe da Igreja. Notai
  de facto que Pedro foi enviado a Samaria juntamente com João pelos apóstolos
  que estavam em Jerusalém, e que tanto Pedro como João oraram pelos
  Samaritanos para que recebessem o Espírito Santo, o que está a indicar que
  ambos tinham o dom de impor as mãos aos crentes para que recebessem o
  Espírito Santo e não apenas Pedro.   | 
 
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  Pedro, tanto antes do dia de Pentecostes, como no dia de Pentecostes, como
  depois, e mais precisamente no caso da cura do coxo no templo, quando ele e
  João compareceram diante do Sinédrio, quando Ananias levou os denários aos
  pés dos apóstolos, e quando Simão ofereceu a ele e a João dinheiro para
  receber a autoridade de impor as mãos aos crentes para que recebessem o
  Espírito Santo, digo, em todas estas diferentes circunstâncias, ele se
  manifestou ser o primeiro a falar entre os apóstolos (cfr. Actos 1:15; 2:14;
  3:12; 4:8; 5:3; 8:20), mas não o primeiro em importância entre os apóstolos.
  Vos recordo a tal propósito que Paulo e Barnabé tinham sido ambos separados
  por ordem do Espírito Santo em Antioquia, e ambos tinham sido enviados pelo
  Espírito Santo a fazer aquela obra, mas entre os dois Paulo era o primeiro a
  falar, de facto, em Listra as multidões depois de ter visto a cura feita por
  Paulo o chamaram Mercúrio "porque era o primeiro a falar" (Actos
  14:12 Riveduta). Para confirmação disto vos recordo que em Antioquia da
  Psídia, quando os chefes da sinagoga mandaram dizer a Barnabé e Paulo que se
  tinham uma palavra de exortação a dizer ao povo a podiam dizer, foi Paulo a
  levantar-se e a falar em primeiro aos presentes (cfr. Actos 13:16). Mas tudo
  isto não nos leva a dizer que Paulo era superior a Barnabé ou o seu chefe. A
  mesma coisa se pode dizer do apóstolo Pedro em relação aos outros apóstolos;
  ele falava em primeiro, mas não tinha o primado nem sobre eles e nem sobre a
  Igreja.  | 
 
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   Mas tudo isso que temos dito até aqui, embora
  seja provado pelas sagradas Escrituras, não encontra de modo algum o favor da
  igreja romana que lançou o seguinte anátema contra quem não reconhecer que o
  papa é por direito divino sucessor de Pedro sobre toda a Igreja: ‘Se,
  portanto, alguém disser que não é por instituição do próprio Cristo senhor,
  isto é, por direito divino que Pedro tem perpétuos sucessores no primado
  sobre toda a Igreja; ou que o Romano Pontífice não é o sucessor de Pedro
  neste primado; seja anátema’ (Concílio Vaticano I (1869-1870), Sess. IV, cap.
  II). Oh! quanto é verdadeira a palavra do profeta: "Nada sabem, nem
  entendem; porque se lhe untaram os olhos, para que não vejam, e o coração,
  para que não entendam" (Is. 44:18).  | 
 
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   Explicação de
  algumas passagens tomadas para sustentar o primado de Pedro  | 
 
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   Os teólogos romanos para sustentar que Jesus
  conferiu o primado do poder da Igreja a Pedro além das passagens mais
  conhecidas que são: "Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha
  igreja" (Mat. 16:18), "Te darei as chaves do reino dos céus"
  (Mat. 16:19), e "Apascenta os meus cordeiros... Apascenta as minhas ovelhas...
  Apascenta as minhas ovelhas" (João 21:15,16,17); tomam diversas outras
  passagens da Escritura que se referem a Simão Pedro. Vejamo-las, para ver se
  efectivamente estão a indicar que o apóstolo Pedro recebeu o primado sobre a
  Igreja primitiva.  | 
 
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  "Simão, Simão, eis que Satanás vos pediu para vos cirandar como trigo;
  mas eu roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça; e tu, quando te
  converteres, confirma teus irmãos" (Lucas 22:31,32). Jesus disse estas
  palavras a Pedro na noite em que ele foi traido e os teólogos afirmam que
  este "confirma teus irmãos" está a indicar que Pedro recebeu a
  missão de reafirmar os seus irmãos, isto é, os apóstolos, entendendo com isto
  que também o papa, como é sucessor, recebeu a missão de confirmar os fiéis.
  Nós não temos nada a dizer sobre o facto de Jesus ter confiado a Simão Pedro
  a tarefa de confirmar os seus irmãos, pois isso é verdade. Mas com estas
  palavras Jesus não conferiu a Pedro nenhuma supremacia sobre os outros
  apóstolos, ou sobre a Igreja. Pedro recebeu de Jesus aquela particular missão
  naquela particular circunstância sabendo que os seus discípulos estariam dali
  a pouco dispersos e grandemente entristecidos por causa da sua morte; mas
  esta missão particular foi circunscrita no tempo e a Pedro. Queremos dizer
  com isto que a missão de confirmar os irmãos Jesus não a estendeu a
  presumidos sucessores de Pedro por todas as épocas vindouras, como antes
  afirmam os teólogos romanos. É sabido depois que os papas tomam estas
  palavras de Jesus para se arrogarem a todo o direito; entre os quais o
  direito de fazer todo tipo de leis eclesiásticas para confirmar os membros da
  igreja romana. E além disso queremos recordar, para sustento do facto de que
  não há uma particular pessoa (o chamado sucessor de Pedro) posta na Igreja
  pelo Senhor para confirmar todos os fiéis, que Paulo aos Coríntios diz que o
  Senhor os confirmaria conforme está escrito: "O qual vos confirmará
  também até ao fim, para serdes irrepreensíveis no dia de nosso Senhor Jesus
  Cristo" (1 Cor. 1:8), e não Cefas, ou seja Simão Pedro, apesar de Cefas
  ainda estar vivo quando ele escreveu e tanto é verdade que na Igreja de
  Corinto haviam alguns que diziam ser de Cefas! Ora, ó teólogos romanos, à luz
  de quanto está escrito o que tendes a dizer? Se Pedro tinha que confirmar
  toda a Igreja como é que quando ainda estava vivo Paulo diz aos santos de
  Corinto que o Senhor os confirmaria? Certo, Deus se usa também dos seus
  ministros para confirmar os seus filhos, de facto, Paulo diz aos
  Tessalonicenses: "Enviamos Timóteo, nosso irmão, e ministro de Deus na
  propagação do evangelho de Cristo, para vos confirmar e vos confortar na
  vossa fé; para que ninguém seja abalado por estas tribulações" (1 Tess.
  3:2,3); e Lucas diz que Paulo e Barnabé "tendo anunciado o evangelho
  naquela cidade e feito muitos discípulos, voltaram para Listra, e Icônio e
  Antioquia, confirmando os ânimos dos discípulos..." (Actos 14:21,22);
  mas de certo, e o dizemos com firmeza e clareza, Ele não se usará do papa dos
  Católicos para nos confirmar na fé, porque este não é um ministro de Cristo
  mas de Satanás. Não importa quanto os teólogos romanos embandeirem este
  versículo da Escritura que diz que Pedro deve confirmar os seus irmãos; este
  que se diz ser o sucessor de Pedro quer seduzir as mentes dos discípulos de
  Cristo e não confirmar as suas almas.  | 
 
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  "Jesus, fixando nele o olhar, disse: Tu és Simão, filho de João; tu
  serás chamado Cefas (que quer dizer Pedro)" (João 1:42). Segundo os
  teólogos romanos Jesus lhe impôs o nome de Pedro para significar que se
  serviria dele como pedra sobre a qual depois constituiria, como sobre
  fundamento, a sua Igreja. Nós, pelo contrário, dizemos que se bem que Jesus
  lhe deu este sobrenome a Simão, que significa ‘rocha’, isso não deixa
  entrever da maneira mais absoluta que o apóstolo Simão Pedro foi constituído
  único fundamento da Igreja. Pedro como os outros apóstolos são parte do
  fundamento sobre o qual a Igreja foi edificada; também os outros apóstolos
  são portanto pedras como ele o é. E para confirmar que mesmo se Pedro recebeu
  este sobrenome não é o único fundamento da Igreja recordamos que João diz que
  o muro da nova Jerusalém "tinha doze fundamentos, e neles estavam os
  nomes dos doze apóstolos do Cordeiro" (Ap. 21:14), e não o de Pedro
  somente. O facto de Jesus ter sobrenomeado Pedro Simão, tem de certo o seu
  motivo, porque Jesus não sobrenomeava as pessoas ao acaso ou sem motivo.
  Julgamos que Jesus tenha querido sobrenomeá-lo dessa maneira por causa da
  firmeza e da resolução vista neste seu discípulo. Tenhamos também presente
  que Jesus sobrenomeou igualmente Tiago e João, os filhos de Zebedeu, e não só
  Simão; Marcos diz de facto que Jesus lhes "pôs o nome de Boanerges, que
  significa: Filhos do trovão" (Mar. 3:17). Mas não é por Jesus ter posto
  este nome àqueles dois irmãos, que nós dizemos que eles receberam especiais
  poderes na Igreja.  | 
 
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  "E Entrando num dos barcos, que era o de Simão, pediu-lhe que o
  afastasse um pouco da terra; e, sentando-se, ensinava do barco as
  multidões" (Lucas 5:3). Segundo os teólogos romanos também o facto de
  Jesus ter pregado do barco de Pedro e não do barco de um outro discípulo
  testifica o primado de Pedro. Louca
  dedução! Mas não é de admirar. Os teólogos romanos nos habituaram a ouvir
  coisas piores do que estas! Mas eu quereria dizer: ‘Mas então também o dono
  do jumento sobre o qual Jesus montou e entrou em Jerusalém teria que
  forçosamente ter uma posição altíssima na Igreja de Deus!’; e ainda: ‘Mas
  então também o dono da casa na qual Jesus escolheu comer a Páscoa teria que
  forçosamente ter uma eminente posição na Igreja, porque foi naquele aposento
  que Jesus instituiu a santa ceia!’. E desta passagem poderia
  prosseguir mas me fico por aqui.  | 
 
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  Mateus diz: "Ora, os nomes dos doze apóstolos são estes: O primeiro,
  Simão, chamado Pedro, e André, seu irmão; Tiago, filho de Zebedeu, e João,
  seu irmão; Felipe e Bartolomeu; Tomé e Mateus, o publicano; Tiago, filho de
  Alfeu, e Tadeu; Simão Cananeu, e Judas Iscariotes, aquele que o traiu"
  (Mat. 10:2-4). Com base na interpretação da cúria romana, o facto de Pedro
  ser nomeado em primeiro, e de estar escrito "o primeiro, Simão, chamado
  Pedro", significa que Pedro foi constituído por Cristo o príncipe dos
  apóstolos. Mas isso não pode ser verdade porque tempo depois, quando entre os
  discípulos surgiu a disputa para saber quem era o maior, Jesus não lhes
  disse: ‘Por que disputais? Não sabeis que o primeiro dentre vós é Pedro?’,
  mas lhes disse: "Qualquer que entre vós quiser ser o primeiro, será
  vosso servo" (Mat. 20:27). O facto de Pedro ser nomeado em primeiro na
  lista dos apóstolos não significa de modo nenhum que ele fosse o príncipe dos
  apóstolos porque este seu primado sobre os apóstolos não emerge das
  Escrituras. Se fosse assim como dizem os teólogos romanos Pedro deveria ser
  nomeado sempre em primeiro, mas ele nem sempre vem citado em primeiro: Paulo
  diz por exemplo: "E conhecendo Tiago, Cefas e João, que eram
  considerados como as colunas, a graça que me havia sido dada, deram-nos as
  destras, em comunhão..." (Gal. 2:9), citando Pedro em segundo lugar,
  depois de Tiago; o anjo que apareceu às mulheres disse-lhes: "Mas ide,
  dizei a seus discípulos, e a Pedro, que ele vai adiante de vós para a
  Galiléia..." (Mar. 16:7), citando Pedro depois dos outros discípulos.  | 
 
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  Paulo diz que Jesus Cristo "ressuscitou ao terceiro dia, segundo as
  Escrituras; que apareceu a Cefas, e depois aos doze..." (1 Cor. 15:4,5).
  Também isto, ou seja, que Jesus apareceu em primeiro a Pedro, e depois a
  todos os outros apóstolos, segundo os teólogos romanos, testifica o primado
  de Pedro. Mas nós consideramos antes que aqui não se vê nenhum primado, mas
  apenas o facto de Jesus ter aparecido primeiro a Pedro para que pudesse
  confirmar os seus irmãos, como lhe tinha dito antes de ser preso. E depois
  recordemos que se Pedro foi o primeiro dos discípulos a quem Jesus apareceu,
  é também verdade que ele "apareceu primeiramente a Maria Madalena"
  (Mar. 16:9) que foi anunciá-lo aos seus discípulos que, ouvindo que ele vivia
  e lhe tinha aparecido, não creram nela. Mas também aqui devemos dizer que o
  facto de Jesus ter aparecido primeiro a uma mulher do que a um homem não quer
  dizer que a mulher seja superior ao homem, ou que Maria Madalena por isso
  teve um qualquer primado entre as mulheres.  | 
 
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  Pedro disse em Jerusalém: "Irmãos, bem sabeis que já há muito tempo Deus
  me elegeu dentre vós, para que os gentios ouvissem da minha boca a palavra do
  evangelho, e cressem" (Actos 15:7). Deus escolheu entre os doze Pedro
  para fazer ouvir o Evangelho aos Gentios; esta escolha, para os teólogos
  romanos, testifica a supremacia de Pedro sobre os outros discípulos. Não é de
  modo nenhum verdade porque Deus não escolheu Pedro para aquela tarefa por ele
  ser o chefe dos apóstolos, mas por outros seus motivos. Recordemos que Pedro,
  embora Deus o tenha enviado àqueles Gentios para anunciar o Evangelho, foi
  constituído apóstolo da circuncisão e não apóstolo dos gentios porque neste
  ofício Deus constituiu Paulo. Aos Gálatas com efeito Paulo diz: "Aqueles
  que pareciam ser alguma coisa ... viram que o evangelho da
  incircuncisão me fora confiado, como a Pedro o da circuncisão" (Gal.
  2:6,7); portanto Pedro foi enviado por Deus aos Judeus enquanto Paulo aos
  Gentios. Mas isso não indica nem que Pedro tivesse o primado na evangelização
  dos homens e nem que fosse príncipe sobre Paulo e sobre os outros apóstolos.  | 
 
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   Fico-me por aqui com as passagens que se
  referem a Pedro que os teólogos romanos tomam para sustentar o primado de
  Pedro, mesmo se existem outras. Mas que lição tiramos nós de tudo isto? Pela
  enésima vez esta; que quando alguém quer sustentar uma falsa doutrina se usa
  também daquelas passagens da Escritura que segundo ele podem contribuir para
  confirmá-la dando-lhe as suas pessoais interpretações, mas também que ao
  fazer isso ele fica confuso. Neste caso os teólogos romanos para sustentar o
  primado de Pedro e a sucessão deste primado fazem acrobacias exegéticas
  verdadeiramente audazes; mas a sua estultícia é manifesta a todos os que
  conheceram a verdade e manejam bem a Palavra de Deus.  | 
 
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   Aquele que é
  chamado papa não é o vigário de Cristo   | 
 
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   Como vimos a igreja romana afirma que o chefe
  do Estado do Vaticano é o vigário de Cristo na terra, isto é, aquele que faz
  as vezes dele. Perardi exprime-se assim a tal respeito: ‘Este representa
  Jesus Cristo nesta terra, faz as vezes dele, e por isso rege e governa a
  Igreja em nome d`Ele’ (Giuseppe Perardi, op. cit., pag. 182).  | 
 
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   A Escritura, pelo contrário, ensina que Cristo
  antes de voltar ao seu Pai não deixou o seu lugar a Pedro estebelecendo-o seu
  vigário na terra. O Senhor, antes de ir embora, prometeu aos seus discípulos
  que enviaria o Espírito Santo o qual os guiaria em toda a verdade e
  anunciaria muitas outras coisas, de facto disse: "Ainda tenho muito que
  vos dizer, mas vós não o podeis suportar agora. Mas, quando vier aquele
  Espírito de verdade, ele vos guiará em toda a verdade, porque não falará de
  si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido, e vos anunciará o que há-de vir.
  Ele me glorificará, porque há de receber do que é meu, e vo-lo há de
  anunciar" (João 16:12-14). Jesus não disse aos seus: ‘Tendes convosco
  Pedro o qual vos guiará na verdade e vos fará saber as outras coisas que
  tenho a dizer-vos!’, portanto este que se define vigário de Cristo mente,
  porque na terra está o Espírito Santo que nos guia na verdade e nos faz
  entender qual seja a vontade do Senhor. Certo, Deus constituiu na sua Igreja
  os apóstolos, os profetas, os evangelistas, os pastores e doutores a fim de
  nos aperfeiçoar e de nos edificar mas também eles são guiados pelo Espírito
  da verdade. Enquanto o chamado papa não é guiado pelo Espírito da verdade mas
  é seduzido pelo diabo e isto é manifesto pelo facto de ele anular o
  Evangelho; portanto como pode ser considerado um ministro de Deus constituído
  por Deus para a edificação da sua Igreja?  | 
 
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   Aquele que é chamado papa não é infalível ‘ex cathedra’  | 
 
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   Começamos por dizer que os teólogos papistas
  dizem que o papa é infalível só quando ensina como papa, e não também quando
  ensina exprimindo o seu parecer pessoal; e que como homem, pode operar bem e
  operar mal, ou seja, pode pecar; mas em nosso juízo estas afirmações são só
  afirmações confortáveis que servem apenas para dizer, no caso do seu papa
  dizer alguma coisa de torto também aos olhos dos seus fiéis seguidores ou se
  fizer culpado de algum grave delito, que ele é um homem como todos os outros;
  portanto na substância constituem um escudo contra eventuais críticas. Mas nós dizemos: mas na prática qual é
  aquele Católico romano que não considera infalível as declarações do seu papa
  não feitas ‘ex catedra’? Mas qual é aquele fiel católico que ousa pôr em
  discussão as afirmações do seu papa feitas não ‘ex catedra’ quando o concílio
  Vaticano II disse que ‘esta Religiosa submissão da vontade e da inteligência
  deve ser, de modo particular, prestada ao autêntico magistério do Romano
  Pontífice mesmo quando não fala ‘ex catedra’ (Concílio Vaticano II, Sess. V.
  cap. III)? [3] E depois ainda: como
  fazem os teólogos para afirmar que o papa como homem pode pecar [4] e depois ao mesmo tempo afirmar que ninguém
  pode ‘reexaminar um juízo pronunciado pela sé apostólica - de quem não há
  autoridade maior -, como a ninguém é lícito julgar um juízo dado por ela’
  (Concílio Vaticano I, Sess. IV, cap. III), quando a Escritura diz:
  "Não deixarás de repreender o teu próximo" (Lev. 19:17)? Como
  podeis ver nos encontramos pela enésima vez perante contradições que fazem
  compreender que o dogma da infalibilidade papal na realidade se estende
  também às declarações que não são catalogadas entre aquelas feitas ‘ex
  catedra’. Este seu dogma serve para incutir temor aos Católicos romanos
  fazendo-lhes crer que eles em Roma têm um chefe que possui uma particular
  assistência do Espírito Santo quando fala ‘ex catedra’, em virtude da qual
  não pode errar nessas suas declarações porque o Espírito Santo fala pela sua
  boca, e por isso quem se rebela às suas declarações é como se se rebelasse ao
  próprio Deus. Este dogma portanto é verdadeiramente uma arma poderosa nas
  mãos destes anticristos que se sucedem nos vértices da igreja católica romana
  porque mediante ele podem em qualquer momento confirmar ou introduzir a seu agrado
  tudo aquilo que mais lhes convier para dominar espiritualmente e
  materialmente as pessoas que estão debaixo deles. Eles sabem que qualquer
  coisa que digam ‘ex catedra’ haverão milhões de pessoas em todo o mundo que
  se terão que mostrar de acordo com eles senão quiserem incorrer na excomunhão
  por se terem rebelado ao chefe da Igreja e portanto a Cristo.   | 
 
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   Mas a questão da infalibilidade papal, dado que
  ela foi declarada dogma só em 1870, faz surgir muitas perguntas como: ‘Mas se
  o papa desde 1870 em diante é declarado infalível quando fala em matéria de
  fé e de moral, como é que - e sobre isto estão de acordo muitos Católicos -
  muitos papas do passado quando falaram em matéria de fé erraram
  grandemente?’, e ainda: ‘Se as heresias que subscreveram os papas reconhecidos
  heréticos pelos próprios estudiosos católicos não eram declarações ex catedra
  quais eram as suas declarações ex catedra?’ Quando foi na substância que os
  papas falaram à inteira Igreja e de maneira definitiva? Alguns respondem a
  estes quesitos dizendo que os papas antes de 1854 não exercitavam a
  infalibilidade papal?! Como! - nós respondemos - então só desde 1854 em
  diante sob Pio IX o Espírito Santo começaria a assistir desta maneira o chefe
  da vossa igreja? Significa isso porventura que antes daquele tempo a Igreja
  de Deus sobre a face da terra não tinha um guia infalível em matéria de fé e
  de moral e que era necessário esperar Pio IX para tê-lo? Quis fazer este
  discurso para demonstrar quanto absurdo e contraditório é o dogma da
  infalibilidade papal. Agora demonstraremos antes de tudo como Pedro, de quem
  o chamado papa se diz o seu sucessor, não foi um homem infalível.  | 
 
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   O apóstolo Pedro não foi infalível nem antes
  nem depois de Jesus lhe ter dito: "Tu és Pedro, e sobre esta pedra
  edificarei a minha Igreja.." (Mat. 16:18), e disso exibimos as seguintes
  provas escriturais.   | 
 
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  Depois que Jesus dirigiu essas palavras a Simão Pedro, ele disse que tinha
  que ir a Jerusalém sofrer muitas coisas dos anciãos, dos principais
  sacerdotes e dos escribas e ser morto e ressuscitar ao terceiro dia. "E
  Pedro, tomando-o de parte, começou a repreendê-lo, dizendo: Senhor, tem
  compaixão de ti; de modo nenhum te acontecerá isso. Ele, porém, voltando-se, disse a Pedro: Para
  trás de mim, Satanás, que me serves de escândalo; porque não compreendes as
  coisas que são de Deus, mas só as que são dos homens" (Mat. 16:22,23). Pedro
  tinha crido que Jesus era o Cristo, mas como todos os outros Judeus pensava
  que o Cristo viria para restabelecer o reino em Israel e não para morrer pela
  nação de Israel; em outras palavras para reinar e não para se fazer meter na
  cruz. Esta é a razão pela qual quando ouviu dizer a Jesus que tinha que
  sofrer e ser morto se pôs a repreender o Senhor porque ele ainda não
  compreendia as coisas de Deus mas só compreendia as coisas dos homens. A
  compreensão das coisas de Deus ele adquiriu depois que Jesus Cristo
  ressuscitou. Jesus repreendeu severamente Pedro, chamando-o Satanás, porque
  aquelas palavras que ele disse as disse da parte de Satanás.  | 
 
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    Pedro negou o Senhor três vezes na
  noite em que Jesus foi traido (cfr. Lucas 22:54-62), mas depois se converteu.  | 
 
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    Paulo conta aos Gálatas como e por que se
  opôs a Pedro em Antioquia: "Quando, porém, Cefas veio a Antioquia,
  resisti-lhe na cara, porque era repreensível. Pois antes de chegarem alguns
  da parte de Tiago, ele comia com os gentios; mas quando eles chegaram, se foi
  retirando e se apartava deles, temendo os que eram da circuncisão. E os
  outros judeus também dissimularam com ele, de modo que até Barnabé se deixou
  levar pela sua dissimulação. Mas, quando vi que não andavam retamente
  conforme a verdade do evangelho, disse a Cefas na presença de todos: Se tu,
  sendo judeu, vives como os gentios, e não como os judeus, como é que obrigas
  os gentios a viverem como judeus?..." (Gal. 2:11-14). Pedro era
  repreensível, segundo Paulo, porque se pôs a dissimular e a obrigar os
  Gentios a viver como Judeus, e por isso Paulo o repreendeu perante todos.  | 
 
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  Quando Pedro em Jope teve a visão na qual o Senhor lhe disse: "Levanta-te,
  Pedro, mata e come" (Actos 10:14), ele respondeu: "De modo nenhum,
  Senhor, porque nunca comi coisa alguma comum e imunda" (Actos 10:14), e
  por esta sua resposta o Senhor o repreendeu, de facto, lhe disse: "Não
  faças tu comum ao que Deus purificou" (Actos 10:15). Pedro sabia que
  Jesus tinha declarado todos os alimentos puros porque o tinha ouvido afirmar:
  "Não compreendeis que tudo o que de fora entra no homem não o pode
  contaminar, porque não entra no seu coração, mas no ventre, e é lançado fora?"
  (Mar. 7:18,19), mas naquela visão chamou imundos alimentos que Deus tinha
  purificado e por isso o Senhor o admoestou.  | 
 
| 
   Como podeis ver também Pedro falhou em algumas
  coisas, mas aliás também ele era um homem da mesma natureza que nós. Tiago disse que "Todos falhamos [ ou tropeçamos] em muitas coisas" (Tiago 3:2)
  incluindo-se entre os que falham. E se ele, que era considerado uma
  coluna na Igreja de então, admitiu falhar, quem é este que foi definido
  infalível ex catedra? Certamente não um ministro de Cristo, mas um ministro
  de Satanás que engana as pessoas fazendo-lhes crer que ele quando fala em
  matéria de fé não pode errar.  | 
 
| 
   Alguém dirá: Mas as epístolas de Pedro não são
  porventura infalíveis? Com certeza que o são, porque foram por ele escritas
  debaixo do impulso e guia do Espírito Santo. Mas certamente não se pode dizer que as epístolas dos papas sejam por
  eles escritas porque são movidos pelo Espírito Santo de Deus. E que dizer
  depois dos discursos de Pedro transcritos nos Actos dos apóstolos? Também
  esses são infalíveis porque foram pronunciados pelo Espírito Santo. Mas
  também neste caso não se podem de modo algum comparar os discursos solenes do
  papa a esses de Pedro porque eles estão cheios de todo o género de mentiras.  | 
 
| 
   Ora, os teólogos católicos romanos ensinam que
  o papa ao ensinar as verdades reveladas por Deus - verdades de fé ou verdades
  de moral - é infalível como é infalível a igreja e dizem que o facto de o
  papa ser infalível resulta do Evangelho. Eis como se exprime Perardi no seu
  manual a tal respeito: ‘São Pedro (e na sua pessoa o Papa seu sucessor) é
  fundamento da Igreja; ele deve confirmar na fé os outros Pastores, deve
  apascentar todo o rebanho. Mas a Igreja não pode estar fundada sobre o erro;
  ela não estaria fundada sobre a verdade se o Papa não fosse infalível, pois é
  a pedra fundamental dela; nem o Papa poderia confirmar de modo certo os
  outros na fé, e em vez de apascentar o rebanho, ele poderia envenená-lo com o
  erro, se pudesse errar no ensinamento’ (Giuseppe Perardi, op. cit.,
  pag. 208). Nós dizemos antes com o auxílio da sagrada Escritura que ele falha
  ao ensinar porque da sua boca saiem muitas mentiras mesmo quando ensina em
  matéria de fé e de costumes. E depois nos vêm dizer que ele foi estabelecido
  por Deus para confirmar na fé os pastores? Mas este não confirma na fé
  absolutamente ninguém porque em vez de pregar a palavra da fé como fazia
  Simão Pedro a anula com os seus preceitos. E depois nos vêm dizer que Deus o
  constituiu para apascentar o rebanho? Mas onde as conduz todas estas ovelhas
  que o seguem? Certamente não sobre o caminho da verdade que leva ao céu, mas
  sobre o da mentira que leva ao lago ardente de fogo e enxofre. A obra deste e
  dos seus bispos é uma obra de destruição porque ele destroi a vereda pela
  qual as ovelhas deveriam entrar para obter a vida de Deus. Bem profetizou o
  profeta Isaías deste quando disse: "Os que guiam este povo o
  desencaminham; e os que por eles são guiados são devorados" (Is. 9:16).
  Não, este não é de modo nenhum a pedra fundamental da Igreja, antes não é
  sequer uma das pedras vivas de que é composta a Igreja de Deus; não, nós não
  dizemos que ele poderia envenenar o povo se falhasse no ensinamento, mas
  dizemos que ele o envenena realmente porque a sua língua está cheia de
  peçonha mortal.   | 
 
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   A verdadeira Igreja não sente de modo nenhum a
  necessidade deste chamado papa em matéria de fé ou de moral, ainda que este
  se declare infalível neste campo, porque ela possui o Espírito da verdade que
  a guia, a instrui, e a confirma: e nós sabemos que Ele não pode falhar.
  Também a Escritura constitui uma infalível guia para a Igreja. Isto porém não
  significa que não pode acontecer que os condutores ou aqueles por eles
  conduzidos introduzam na Igreja heresias de perdição. Porque isso pode
  acontecer, antes está estabelecido que aconteça nestes últimos dias porque se
  devem cumprir as seguintes Escrituras: "Dentre vós mesmos se levantarão
  homens, falando coisas perversas para atrair os discípulos após si"
  (Actos 20:30), "entre vós haverá também falsos doutores, que
  introduzirão encobertamente heresias de perdição" (2 Ped. 2:1);
  "importa que haja entre vós seitas, para que os aprovados se tornem
  manifestos entre vós" (1 Cor. 11:19); "Mas o Espírito expressamente
  diz que em tempos posteriores alguns apostatarão da fé, dando ouvidos a
  espíritos enganadores, e a doutrinas de demônios" (1 Tim. 4:1). Mas
  permanece o facto que o Espírito de Deus e a Palavra de Deus continuarão a
  guiar os fiéis que efectuam a sua salvação com temor e tremor de maneira a
  que não se percam. Podem vir a faltar
  ministros de Deus mas jamais virá a faltar a guia de Deus.  | 
 
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   As provas da falibilidade dos papas   | 
 
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   No
  curso dos séculos se sucederam centenas de papas na igreja romana. Ora,
  mediante os seguintes exemplos de papas que subscreveram heresias, se
  contradisseram e foram declarados heréticos, demonstraremos a falibilidade
  dos papas mesmo nas suas declarações oficiais:  | 
 
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    Libério (352-366) aderiu formalmente à
  heresia ariana (que negava a divindade de Jesus Cristo) [5], subscrevendo a profissão de fé herética do concílio
  de Sermio e chegando até a excomungar Atanásio que defendia a divindade de
  Cristo. Tanto os seus predecessores como ele próprio tinham já
  condenado a heresia de Ário; a seguir, os seus sucessores condenaram a
  heresia ariana.  | 
 
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  Inocêncio I (401-417) escreveu ao concílio de Milevis que os bebés estavam
  obrigados a receber a comunhão e que se morressem batizados mas não
  comungados, iriam igualmente para o inferno. A seguir, esta doutrina foi
  anulada pelo concílio de Trento em 1562 com a seguinte declaração:
  ‘Finalmente, o mesmo santo sínodo ensina que as crianças que carecem do uso
  da razão, por nenhuma necessidade estão obrigadas à comunhão sacramental da
  Eucaristia, porquanto, estando regeneradas e incorporadas em Cristo pelo
  lavacro do Batismo, não podem naquela idade perder a graça de filhos de Deus,
  que já adquiriram’ (Concílio de Trento, Sess. XXI, cap. IV), e ainda o
  concílio tridentino anatemizou quem a sustentar com a seguinte declaração:
  ‘Se alguém disser que a comunhão eucarística é necessária às crianças, antes
  de chegarem à idade da razão, seja anátema’ (Concílio de Trento, Sess. XXI,
  can. 4).  | 
 
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  Hormisdas (514-523) em 514 declarou heréticos certos monges da Scythia,
  porque sustentavam que um da Trindade tinha sofrido a morte da cruz; mas João
  II em 532 declarou aqueles monges ortodoxos (ou seja, pessoas que sustentavam
  uma doutrina recta) [6].  | 
 
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  Vigílio (537-555) em 553 com uma declaração oficial definiu conformes à
  doutrina católica alguns escritos denominados ‘Três capítulos’ (que ele próprio
  tinha condenado em 548). Mas o quinto concílio ecuménico (Constantinopolitano
  II) realizado em Constantinopola de 5 de Maio a 2 de Junho de 553 declarou
  solenemente que aqueles mesmos escritos deviam ser considerados heréticos.
  Mas Vigílio se resolveu a aceitar o concílio e as suas conclusões só a 8 de
  Dezembro. Ele retratou as suas recentes posições contrárias à condenação dos
  ‘Três capítulos’, de facto, escreveu ao patriarca de Constantinopola
  reconhecendo o seu erro e concluía dizendo-lhe: ‘Portanto o que fiz em defesa
  dos ‘Três capítulos’ é anulado com a definição do presente nosso escrito’ (Epístola
  a Eutíquio, Patriarca de Constantinopola, de 8 de Dezembro de 553).  | 
 
| 
   
  Gregório I dito Magno (590-604) disse que as crianças não batizadas vão
  direito para o inferno e lá em baixo sofrem pela eternidade. Ora, esta
  doutrina é condenada pela igreja romana porque ela diz que as crianças se
  morrerem não batizadas vão para um lugar chamado limbo (onde segundo eles não
  há alguma pena) e não mais para o inferno como antes afirmou Gregório I.
  Ainda Gregório afirmou que quem tomava o título de bispo universal era
  precursor do anticristo; enquanto Gregório VII (1073-1085) afirmou que o
  bispo de Roma é e deve ser chamado bispo universal; eis as suas palavras: ‘Só
  o pontífice romano tem o direito de ser chamado universal’ (Dictatus
  papae, ponto 2).  | 
 
| 
   
  Honório I (625-638) aprovou e ensinou a heresia dos monotelitas (os
  monotelitas afirmavam que em Cristo haviam duas naturezas, mas uma só vontade
  e uma só acção, a divina). Eis as suas palavras: ‘Nós confessamos uma vontade
  única de Nosso Senhor Jesus Cristo, porque nele não estava vontade alguma da
  carne, nem repugnante ao querer divino’. Por esta sua tomada de posição foi
  condenado como herético pelo sexto concílio ecuménico em 681. Os papas
  sucessivos, confirmaram a condenação: entre estes Leão II que em 682 escreveu
  ao imperador Constantino dizendo ‘excomungar todos os heréticos, entre os
  quais Honório que não fez resplandecer a doutrina apostólica nesta igreja de
  Roma, mas que por uma profana traição tentou subverter a fé imaculada e todos
  os que morreram no seu erro’.  | 
 
| 
   
  Adriano II (867-872) declarou válido o matrimónio civil, enquanto Pio VII
  (1800-1823) o condenou.  | 
 
| 
   
  Pascoal II (1099-1118) e Eugénio III (1145-1153) autorizaram o duelo,
  enquanto Júlio II (1503-1513) e Pio IV (1559-1565) o proibiram.  | 
 
| 
    João XXII (1316-1334) em 1331 ensinou
  que as almas dos santos não tinham a visão de Deus antes da ressurreição da
  carne. Esta heresia foi condenada pelo seu sucessor Bento XII (1334-1342). E
  ainda João XXII na Bula Cum inter nonnullos de 1323 afirmou: ‘Dizer
  que Cristo e os apóstolos não possuíam nada significa falsear as Escrituras’
  (citado por Peter de Rosa em Vicari di Cristo [ Vigários de Cristo] , Milano 1989, pag. 226) [7]; segundo ele portanto Cristo e os apóstolos
  não tinham vivido pobres. Isto antes de tudo contrasta a
  Palavra de Deus, e em segundo lugar está em plena contradição com o que
  tinham afirmado os seus predecessores Honório III, Inocêncio IV, Alexandre
  IV, Bonifácio VIII.  | 
 
| 
    Sisto V (1585-1590) em 1590 mandou
  publicar uma edição da Vulgata (que ele pessoalmente tinha reescrito para
  corrigir os erros que existiam nas edições publicadas até àquele tempo) e com
  uma bula declarou: ‘Na plenitude do poder apostólico, decretamos e declaramos
  que esta edição... aprovada pela autoridade Nos concedida pelo Senhor, deve
  ser recebida e considerada como verdadeira, legítima, autêntica e
  incontestada em todas as discussões públicas e privadas, nas leituras, nas
  pregações e nas explicações’. Pouco tempo depois da publicação da
  ‘sua’ Vulgata Sisto V morreu. Mas a Vulgata por ele publicada foi achada
  cheia de erros. O cardeal Bellarmino então para salvar a honra de Sisto V
  sugeriu ao seu sucessor Gregório XIV (1590-1591) corrigi-la e apresentá-la ao
  público com o nome de Sisto apresentando desculpas. Eis o que ele declarou na
  sua autobiografia Bellarmino: ‘Algumas, pessoas, cuja opinião tinha grande
  peso, consideravam que devia ser publicamente proibida; eu não era da mesma
  opinião e demonstrei ao Santo Padre que, em vez de proibir a versão da Bíblia
  em questão, seria melhor corrigi-la de modo tal a podê-la publicar sem
  prejuízos para a honra do papa Sisto. Isso se podia fazer eliminando o mais
  rápido possível as modificações desaconselháveis e publicando depois o volume
  com o nome de Sisto e um prefácio em que se explicava que na primeira edição
  se tinham verificado alguns erros devidos à pressa dos tipógrafos e de outras
  pessoas’ (em substância o cardeal lhe sugeriu para mentir). A Vulgata de
  Sisto depois de ter sido corrigida foi publicada em 1592 por Clemente VIII
  (1592-1605) que foi obrigado a retirar as cópias da anterior Vulgata que
  tinham sido introduzidas no mercado.   | 
 
| 
   
  Paulo V (1605-1621) em 1616 mandou admoestar Galileu Galilei o qual
  sustentava que a terra além de mover-se sobre si mesma gira em torno do sol.
  Num documento do Santo Ofício datado de 25 de Fevereiro de 1616 se lê: ‘O
  Ilustríssimo Senhor Cardeal Millino notificou ao Acessor e ao Comissário do
  Santo Ofício, que referida a censura dos Padres Teólogos sobre a proposição
  do matemático Galileu, que o sol seja o centro do mundo e imóvel de movimento
  local, e que a terra se move também de movimento diurno, o Santíssimo (Paulo
  V) ordenou ao Ilustríssimo Senhor Cardeal Bellarmino, de chamar perante si o
  predito Galileu, e de admoestá-lo a abandonar a dita opinião; e se recusar
  obedecer, o Padre Comissário, em frente de um notário e de testemunhas, o
  intime para que se abstenha totalmente de ensinar, defender ou de qualquer
  modo tratar essa doutrina ou opinião; se não consentir seja encarcerado’. E assim fez Bellarmino, e Galileu deu as
  garantias exigidas. Mas em 1632 (sob Urbano VIII) Galileu fez imprimir o
  livro Diálogo de Galileu Galilei sobre os dois Máximos Sistemas do
  Mundo, Ptolemaico e o Copernicano no qual sob a forma de um diálogo
  sustentava as convicções que não deveria difundir. E assim a
  Inquisição o chamou a Roma e o processou condenando-o de heresia. No
  veredicto emanado contra ele em 1633 se lê: ‘...Dizemos, pronunciamos,
  sentenciamos e declaramos que tu, Galileu supradito, pelas coisas deduzidas
  no processo e por ti confessadas como acima, te tornaste para este Santo
  Ofício veementemente suspeito de heresia, a saber, por teres sustentado e
  crido doutrina falsa e contrária às Sagradas e Divinas Escrituras, que o Sol
  seja centro da Terra e que não se mova de oriente para ocidente e que a Terra
  se mova e não seja centro do mundo, e que se possa ter e defender por
  provável uma opinião depois de ter sido declarada e definida por contrária à
  Sagrada Escritura...’. E Galileu foi obrigado a abjurar as suas convicções e
  de facto afirmou jurando sobre o Evangelho: ‘...abjuro, amaldiçoo e detesto
  os supraditos erros e heresias, e geralmente qualquer outro erro, heresia e
  seita contrária à Santa Igreja...’. Em 1822 Pio VII ratificou um decreto da
  Inquisição autorizando todos os tratados copernicanos sobre astronomia,
  enquanto em 1835 as obras de Copérnico, Kepler e Galileu foram tiradas do
  Índice dos livros proibidos. Isto equivale a dizer que Paulo V e Urbano VIII,
  ao ensinar que a terra era imóvel e que o sol girava em torno dela e ao
  condenar como herética a tese de Galileu segundo a qual a terra roda em torno
  de si mesma e em torno do sol, erraram.   | 
 
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  Pio IX (1846-1878) em 1854 decretou a imaculada conceição de Maria, doutrina
  esta que vai abertamente contra a Escritura que ensina que só Jesus foi
  concebido sem pecado. Mas o que queremos fazer notar é que ela foi condenada
  por diversos predecessores de Pio IX (como Gelásio I, Gregório dito Magno,
  Inocêncio III e Leão Magno) e é contrária ao unânime consenso dos chamados
  pais.  | 
 
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   Estes
  não são senão alguns dos exemplos de heresias e de contradições papais que
  anulam a doutrina da infalibilidade do papa. Como pode portanto afirmar
  Giuseppe Perardi no seu Manual que ‘nunca houve Papa que tenha
  ensinado uma doutrina que tenha merecido censura; o Papa ensinou sempre a
  verdade, reprovou o erro nos outros chamando-os à verdade’ (Giuseppe Perardi,
  op. cit., pag. 209) e que ele não pode errar
  quando define doutrinas acerca da fé [8]?
  Como pôde este teólogo fazer tais afirmações quando Adriano VI (papa
  da igreja romana) em 1523 disse: ‘Se por Igreja romana se entende o seu chefe
  ou pontífice, é indiscutível que ele possa errar mesmo sobre assuntos
  concernentes a fé. O faz quando prega a heresia nos seus juízos ou nas suas
  decretais. Na verdade muitos pontífices romanos foram heréticos, e o último
  deles foi papa João XXII (1316-1334)’ (citado por Peter de Rosa in op. cit.,
  pag. 217)?   | 
 
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   E ainda dizemos: ‘Mas como pôde Pio IX, perante
  tantos exemplos de papas que ensinaram coisas falsas, declarar errada a
  seguinte afirmação: ‘Os Pontífices Romanos (...) erraram, mesmo nas
  definições de fé e de moral’ (Sílabo dos Erros, XXIII)? É preciso
  verdadeiramente ou muita ignorância ou muita má-fé para fazer semelhantes
  afirmações.  | 
 
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   E depois, não acabou, os teólogos romanos dizem
  também que as decisões dos papas são parte da tradição que deve ser venerada
  a par da Escritura! Mas como podem dizer isso quando os próprios papas se
  contradisseram entre eles e foram excomungados? Como podem confiar nesta sua
  tradição que se contradiz a si mesma e se anula a si mesma e contradiz e
  anula a Palavra de Deus? O expliquem os teólogos católicos romanos! Vede,
  para mais confirmações sobre a inatendibilidade da tradição, a parte onde
  confutei a tradição).  | 
 
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   Aquele que é
  chamado papa não é de modo nenhum o santo Padre (ou Pai)  | 
 
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   Que dizer depois do facto de o chefe do Estado
  do Vaticano se fazer chamar pai santo? Dizemos que tanto ele que se faz
  chamar assim como os que o chamam assim estão no erro. Jesus disse: "A
  ninguém sobre a terra chameis vosso pai; porque um só é o vosso Pai, aquele
  que está nos céus" (Mat. 23:9); portanto o nosso Pai está no céu e não
  sobre a terra. Para confirmação que nenhum outro, além de Deus, é digno de
  ser chamado Pai santo vos recordo que o Filho de Deus nos dias da sua carne
  chamou "Pai santo" (João 17:11) o seu Pai que está no céu; portanto
  imitemos Cristo.  | 
 
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   Aquele que é
  chamado papa não tem o poder de fazer santo ninguém   | 
 
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   A Enciclopédia
  Católica na palavra ‘canonização’ afirma: ‘A canonização é um acto ou
  sentença definitiva, com a qual o Sumo Pontífice decreta que um servo de
  Deus, já contado entre os beatos, seja inscrito no catálogo dos santos e se
  venere na Igreja universal com o culto devido a todos os canonizados’ (Enciclopédia
  Católica, vol. 3, 569) [9]. Aquele
  que é chamado papa portanto tem também o poder de declarar santos alguns que
  durante a sua vida se distinguiram por virtudes heróicas ou por qualidades
  suas particulares. Mas que diz a Escritura? Antes de tudo a Escritura diz que
  Aquele que santifica e declara santos é Cristo conforme está escrito:
  "Pois tanto o que santifica como os que são santificados, vêm todos de
  um" (Heb. 2:11); e depois ela ensina que todos os crentes são santos
  (tanto os que vivem sobre a terra como os que morreram e estão agora na
  presença do Senhor), porque eles foram santificados "pela oferta do
  corpo de Jesus Cristo, feita uma vez para sempre" (Heb. 10:10).  | 
 
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   As
  seguintes Escrituras testificam que nós filhos de Deus fomos santificados e
  por isso somos os santos que estão sobre a terra.   | 
 
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    Paulo escreveu aos Coríntios:
  "Paulo, chamado para ser apóstolo de Cristo Jesus pela vontade de Deus,
  e o irmão Sóstenes, à igreja de Deus que está em Corinto, aos santificados em
  Cristo Jesus" (1 Cor. 1:1,2), e ainda: "Não erreis: nem os
  devassos, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os
  sodomitas, nem os ladrões, nem os avarentos, nem os bêbados, nem os
  maldizentes, nem os roubadores herdarão o reino de Deus. E é o que alguns têm
  sido, mas haveis sido lavados, mas haveis sido santificados, mas haveis sido
  justificados em nome do Senhor Jesus, e pelo Espírito do nosso Deus" (1
  Cor. 6:9-11);  | 
 
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    aos Filipenses: "Paulo e Timóteo,
  servos de Cristo Jesus, a todos os santos em Cristo Jesus que estão em
  Filipos" (Fil. 1:1);  | 
 
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    aos Colossenses: "Paulo, apóstolo
  de Cristo Jesus pela vontade de Deus, e o irmão Timóteo, aos santos e fiéis
  irmãos em Cristo que estão em Colossos.." (Col. 1:1,2);  | 
 
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    aos Romanos: "Aquele que examina
  os corações sabe qual é a intenção do Espírito; e é ele que segundo Deus
  intercede pelos santos" (Rom. 8:27), e também: "Mas agora vou a
  Jerusalém para ministrar aos santos" (Rom. 15:25).  | 
 
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   Como
  podeis ver por vós mesmos os santos não são os canonizados pelo chefe do
  Estado do Vaticano mas os feitos tais por Deus pelo Espírito, por isso a
  canonização feita no seio da igreja romana é uma prática que se opõe à
  Escritura e que não tem nenhum valor. (Vede também ‘Aqueles que a igreja
  católica romana faz santos não eram mais do que pecadores que agora estão no
  inferno’ e ‘Os falsos milagres operados pelas relíquias dos seus santos’).  | 
 
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   Aquele que é chamado papa não tem as chaves do reino dos
  céus   | 
 
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   Jesus
  disse um dia a Pedro: "Eu te darei as chaves do reino dos céus; e tudo o
  que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que desligares na terra
  será desligado nos céus" (Mat. 16:19). Estas palavras são tomadas pelos
  teólogos católicos romanos para sustentar que como o chefe do Estado do
  Vaticano é o sucessor de Pedro, por conseguinte ele possui as chaves do reino
  de Deus, e por isso quem quer entrar no reino de Deus deve forçosamente
  entrar a fazer parte da igreja romana (e isto pode acontecer reconhecendo o
  chefe do Estado do Vaticano como chefe da Igreja); porque fora dela (a igreja
  romana), eles dizem, está a perdição, dentro, pelo contrário, há a salvação! Ora,
  as referidas palavras de Jesus ao apóstolo Pedro foram mal interpretadas pelos
  Católicos romanos: naturalmente eles esta errada interpretação (como muitas
  outras) têm todo o interesse em fazê-la e em conservá-la porque ela
  serve-lhes para fazer parecer aos homens que o chefe do Estado do Vaticano
  está investido de uma autoridade particular como o esteve o seu (presumido)
  predecessor Pedro! Já demonstrámos amplamente que aquele que eles chamam papa
  é um impostor, e não o sucessor de Pedro, porque Pedro não foi o primeiro
  vigário de Cristo que antes de morrer deixou o seu vicariato a um seu
  sucessor. Ora, vamos explicar a questão das chaves do reino dadas a Pedro.  | 
 
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   Nós
  cremos firmemente que Jesus deu as chaves do reino dos céus a Pedro mas isso
  não significa que Pedro recebeu a autoridade de fazer santo quem ele queria,
  ou de salvar e perder quem ele queria ou que recebeu uma particular
  autoridade que o elevava acima de todos os outros apóstolos e da Igreja
  inteira ou a de depôr os reis anticristãos dissolvendo os seus súbditos do
  juramento de fidelidade. Ora nós, usando-nos de outras Escrituras, faremos
  algumas considerações sobre as palavras de Jesus a Pedro, a fim de explicar o
  que são estas chaves do reino dos céus que Jesus deu a Pedro e no que
  consiste este poder de ligar e desligar.  | 
 
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  Jesus, o Filho de Deus, estava com o Pai no reino dos céus antes da fundação
  do mundo: ele desceu do céu. Se
  pois falou de chaves do reino dos céus, quer dizer que o reino de Deus tem
  uma porta pela qual lá se entra, doutra forma não se explica a imagem das
  chaves usada por Jesus.  | 
 
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    Jesus quando repreendeu os escribas e
  os Fariseus disse-lhes: "Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas!
  pois que fechais aos homens o reino dos céus; e nem vós entrais nem deixais
  entrar os que procuram entrar" (Mat. 23:13), e também: "Ai de vós,
  doutores da lei, que tirastes a chave da ciência; vós mesmos não entrastes, e
  impedistes os que entravam" (Lucas 11:52). Destas palavras emerge
  claramente que os escribas com os Fariseus fechavam o acesso ao reino dos
  céus tanto a eles como aos que procuravam lá entrar. Ora, para fechar
  o reino dos céus a eles e aos outros deviam necessariamente ter à sua
  disposição uma chave; e esta chave era a chave da ciência que eles tinham
  tirado. Eles sentavam-se na cadeira de Moisés e instruíam o povo mediante a
  lei mas com os seus ensinamentos tinham feito cair muitos no pecado porque
  eles eram preceitos de homens que anulavam a Palavra de Deus. Portanto os
  escribas e os Fariseus tinham tirado à Palavra de Deus o seu verdadeiro
  significado e a sua eficácia porque a tinham anulado com a sua tradição. É
  claro que falseando o sentido da Palavra de Deus, não só eles não entravam no
  reino dos céus como não entravam também os que eles instruíam. Jesus os
  chamou "guias cegos" (Mat. 23:16) precisamente por isso, porque,
  tendo anulada a Palavra de Deus, não eram idóneos para guiar o povo.
  Explicamos este conceito com um exemplo tirado das Escrituras: vós sabeis que
  um dia Jesus disse àquele jovem rico que lhe perguntou o que devia fazer de
  bom para herdar a vida eterna, que se queria entrar na vida devia guardar
  estes mandamentos: "Não matarás, não cometerás adultério, não furtarás,
  não dirás falso testemunho; Honra teu pai e tua mãe, e amarás o teu próximo
  como a ti mesmo" (Mat. 19:18,19). Como podeis ver entre os mandamentos
  enunciados por Cristo está também o de honrar pai e mãe, que era um dos
  mandamentos que os escribas e os Fariseus tinham anulado dizendo:
  "Qualquer que disser ao pai ou à mãe: É oferta ao Senhor o que poderias
  aproveitar de mim; esse não precisa honrar nem a seu pai nem a sua mãe"
  (Mat. 15:5,6). Portanto, como poderiam entrar na vida os escribas e os
  Fariseus e aqueles por eles guiados não guardando o mandamento de honrar o
  pai e a mãe como ensinava a lei do Senhor? Resumindo: a lei era a chave que
  os escribas e os Fariseus tinham para aceder eles próprios e para fazer
  aceder os outros ao reino dos céus, mas eles a tiraram porque anularam a lei
  com a sua tradição. Mas os escribas e os Fariseus fecharam o reino dos céus a
  eles próprios e às pessoas também porque não reconheciam em Jesus de Nazaré o
  Messias. Diziam de Jesus: "Este homem não é de Deus.." (João 9:16),
  e: "Nós sabemos que esse homem é pecador" (João 9:24), e ainda:
  "Este não expulsa os demônios senão por Belzebu, príncipe dos
  demônios" (Mat. 12:24); e como eles se sentavam na cadeira de Moisés
  estas coisas que eles diziam sobre Jesus eram aceites por muitos Judeus, os
  quais por isso eram impedidos pelas suas palavras de entrar no reino de Deus,
  dado que nele só se pode entrar reconhecendo em Jesus o Cristo de Deus.  | 
 
| 
   
  As chaves do reino dos céus de que falou Jesus a Pedro eram constituídas
  pelas sãs palavras do Senhor Jesus Cristo; palavras que ele tinha recebido do
  Pai e que deu também a Pedro. Dizemos também a Pedro e não só a Pedro porque
  Jesus deu a Palavra de Deus (as chaves para ligar e desligar) também aos
  outros apóstolos conforme está escrito: "Lhes dei as palavras que tu me
  deste, e eles as receberam..." (João 17:8).  | 
 
| 
    Pedro, por meio das chaves que
  recebeu de Jesus, no dia de Pentecostes permitiu a muitos Judeus entrar no
  reino de Deus. Naquele dia muitos Judeus, depois que o ouviram pregar,
  compungiram-se em seu coração e disseram a Pedro e aos outros apóstolos:
  "Que faremos, irmãos? Pedro então lhes respondeu: Arrependei-vos, e cada
  um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo, para remissão de vossos
  pecados; e recebereis o dom do Espírito Santo. Porque a promessa vos pertence
  a vós, a vossos filhos, e a todos os que estão longe: a quantos o Senhor
  nosso Deus chamar" (Actos 2:37-39). Notai que aqueles Judeus na
  substância perguntaram o que tinham que fazer para entrar no Reino de Deus e
  que Pedro o lhes disse com toda a franqueza. A resposta que Pedro lhes deu
  era a Palavra do Reino e para aqueles Judeus foi a chave que lhes permitiu
  entrar no Reino de Deus. Como podeis ver Pedro não fechou o reino dos céus
  àqueles Judeus, como faziam antes os escribas e os Fariseus, porque ele
  disse-lhes que Deus tinha feito Senhor e Cristo aquele Jesus que eles tinham
  crucificado (cfr. Actos 2:36) e o que eles tinham que fazer para entrar no
  reino dos céus segundo as palavras recebidas de Cristo Jesus.  | 
 
| 
    Segundo o que ensina a Escritura, todos
  os crentes possuem a chave para fazer entrar os pecadores a fazer parte da
  Igreja de Deus, porque todos os crentes conhecem a maneira em que se entra a
  fazer parte dela e a podem referir aos de fora. Quando um filho de Deus diz a
  alguém que ainda está perdido: ‘Arrepende-te dos teus pecados, crê no Senhor
  Jesus e serás salvo’, não está fazendo mais do que dizer-lhe aquilo que deve
  fazer para entrar no reino dos céus e por isso é um instrumento do qual Deus
  se usa para conduzir a ovelha perdida ao aprisco do Sumo Pastor.  | 
 
| 
    O facto de desligar e ligar está
  presente também nestas palavras que Jesus dirigiu a todos os seus discípulos:
  "Ora, se teu irmão pecar contra ti, vai, e repreende-o entre ti e ele
  só; se te ouvir, terás ganho teu irmão; mas se não te ouvir, leva ainda
  contigo um ou dois, para que pela boca de duas ou três testemunhas toda
  palavra seja confirmada. Se recusar ouvi-los, dize-o à igreja; e, se
  também recusar ouvir a igreja, considera-o como gentio e publicano. Em
  verdade vos digo: Tudo quanto ligardes na terra será ligado no céu; e tudo
  quanto desligardes na terra será desligado no céu" (Mat. 18:15-18).
  Neste caso o ligar na terra consiste em excluir da comunidade um irmão que
  peca contra um outro irmão e recusa ouvir tanto o irmão a quem fez o agravo,
  como as testemunhas, como também a Igreja; neste caso Jesus disse:
  "Considera-o como gentio e publicano" para significar que não se
  devem mais ter relações com este. O desligar na terra consiste antes em
  voltar a ter relação com um irmão que pecou contra um outro irmão e que
  depois de ter sido repreendido se arrepende do seu pecado. Pelas palavras de
  Jesus tanto o que ligarmos como o que desligarmos é ligado e desligado também
  no céu. Queria fazer-vos notar que o ligar está relacionado com a obstinação
  e o desligar com o arrependimento do irmão que depois de ter pecado é
  repreendido; a mesma coisa se pode dizer também do ligar e do desligar em
  relação aos que estão fora do reino de Deus, porque se o pecador ao ouvir a
  palavra da salvação se obstina em seu coração e não a aceita, ele é ligado
  por aquele que lhe anuncia o caminho da salvação, ou seja, é mantido fora do
  Reino porque os seus pecados lhe são retidos; enquanto se o pecador se
  arrepende e aceita a Palavra então é desligado da sua ligação ao pecado pela
  Palavra e é feito entrar no Reino de Deus porque os seus pecados lhe são
  perdoados. Em relação à autoridade de desligar recebida por Pedro, recordamos
  que tanto no dia de Pentecostes como no dia em que Pedro curou o coxo à porta
  do templo dita ‘Formosa’, muitos Judeus foram por ele ‘desligados’ da forte
  ligação da lei pela palavra da pregação porque eles, aceitando a palavra que
  ele lhes pregou, obtiveram de Deus a remissão dos seus pecados. Também a
  respeito de Cornélio e dos seus parentes se pode dizer que eles foram por ele
  ‘desligados’ pela palavra da sua pregação; porque o anjo que tinha aparecido
  a Cornélio lhe tinha dito que Simão lhe falaria de coisas pelas quais seria
  salvo ele e a sua casa. Em relação à autoridade de ligar é necessário antes
  dizer que os que durante a sua vida rejeitaram a palavra por ele pregada
  foram por ele ligados e permaneceram fora porque, rejeitando-a, os seus
  pecados lhes foram retidos. Por quanto respeita à autoridade de ligar e de
  desligar no interior da Igreja que também Pedro tinha recebido de Cristo,
  recordamos o caso de Simão em Samaria. Este crente, quando viu que pela
  imposição das mãos dos apóstolos era dado o Espírito Santo, ofereceu-lhes
  dinheiro dizendo-lhes que dessem também a ele aquela autoridade. Mas Pedro o
  repreendeu severamente pelo seu pecado dizendo-lhe: "Arrepende-te, pois,
  dessa tua maldade... pois vejo que estás em fel de amargura, e em laços de
  iniquidade" (Actos 8:22,23); ele fez o que o Senhor tinha dito que se
  devia fazer em relação a um irmão que tinha pecado, com efeito o repreendeu.
  Ora, nós não sabemos se Simão se arrependeu e foi desligado, ou se
  obstinou-se e foi ligado; certo é que se se arrependeu foi perdoado e ganho,
  mas se se obstinou em seu coração foi ligado e excluído da comunidade dos
  santos de Samaria.   | 
 
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   No passado houveram chefes do Estado Pontifício
  que excomungaram homens que proclamaram a verdade. Foram por eles
  excomungados pregadores do Evangelho, tradutores da Bíblia, e muitos outros;
  porque segundo os guias desta organização religiosa eles ameaçavam o cristianismo
  e queriam destruir a Igreja mediante os seus ensinamentos. Os guias cegos
  pensaram assim ter excluído da única e verdadeira Igreja homens perversos;
  mas as coisas não eram de modo nenhum assim, porque aqueles que eles chamavam
  perversos ou pestes, não saíram da Igreja de Deus mas sim entraram nela
  depois de saírem daquele cárcere subterrâneo que é a chamada santa igreja
  apostólica que é tal só de nome mas não de facto porque não é nem uma santa
  assembleia de resgatados e nem apostólica, porque os seus aderentes ainda não
  foram resgatados do poder de Satanás e ela de modo nenhum se atém à doutrina
  dos apóstolos. Graças sejam dadas a Deus, por meio de Cristo Jesus, por ter
  iluminado a mente de muitos destes ‘excomungados’ da igreja romana; porque por
  meio deles a palavra da fé começou a ser pregada com franqueza e com força,
  as sagradas Escrituras começaram a ser traduzidas na língua do povo e muitos
  puderam ser salvos pelo Evangelho.  | 
 
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   O chefe do Estado do Vaticano que neste momento
  é João Paulo II pretende ter as chaves do reino dos céus, mas os factos
  demonstram que ele não as possui e portanto não pode permitir o acesso ao
  reino de Deus a nenhum dos que confiam nas suas palavras. Ele ensina que
  Maria é ‘a porta do céu’, ‘a dispensadora dos dons celestes’ ‘a co-redentora
  com nosso Senhor’; portanto induz as pessoas a confiar em Maria para a sua
  salvação enganando-as. Ele ensina também que a vida eterna a se deve merecer
  fazendo boas obras enquanto a Escritura afirma que a vida eterna é dom de
  Deus. Como pode portanto afirmar ter as chaves do reino dos céus? De certo,
  este ensinando tais mentiras aos homens, fecha a ele próprio e aos outros o
  reino de Deus. A verdade é que este homem, junto com os seus colaboradores
  dispersos pelo mundo inteiro, está conduzindo milhões de almas à perdição. E
  depois os teólogos romanos se escandalizam quando nos ouvem pregar contra a
  tradição católica romana porque com ela eles anulam a Palavra de Deus; se
  escandalizam como se escandalizaram os Fariseus quando ouviram dizer a Jesus
  que não é o que entra pela boca que contamina o homem, mas o que sai dela. E por que é que os Fariseus se
  escandalizaram? Porque Jesus com aquelas palavras fez compreender às
  multidões que a tradição dos Fariseus era mentira. Mas que disse Jesus aos
  seus discípulos, quando soube por eles que os Fariseus tinham ficado
  escandalizados pelo seu discurso? "Toda a planta, que meu Pai celestial
  não plantou, será arrancada. Deixai-os; são cegos, guias de cegos. Ora,
  se um cego guiar outro cego, ambos cairão na cova" (Mat. 15:13,14).
  Estas palavras são aplicáveis à cúria romana.  | 
 
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   O luxo, as
  riquezas e o poder temporal daquele que se diz o vigário de Cristo e o
  sucessor de Pedro confirmam que ele não pode ser um servo de Deus   | 
 
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   Quando se fala do falso doutor que tem a sua
  residência aqui em Roma, mais precisamente na Cidade do Vaticano, e me refiro
  àquele que falsamente é chamado sumo pontífice, não se pode não falar do
  luxo, das riquezas e do poder temporal que ele possui. Ora, o papa dos
  Católicos romanos diz de fazer as vezes de Cristo na terra e de ser o
  sucessor de Pedro. Portanto seria de esperar ver um homem que segue as
  pisadas de Jesus Cristo e as do apóstolo Pedro, isto é, que andasse em toda a
  humildade como fizeram Jesus e Pedro. Mas nós dizemos: Onde está esta
  humildade nele? Nós não a vemos de modo nenhum. Vemos só altivez e luxo.
  Jesus era pobre e viveu humildemente na terra e isso o demonstrou
  abertamente, de facto, não tinha um lugar onde reclinar a cabeça, não andou
  vestido com trajes magníficos, e não viveu em delícias como faz aquele que se
  faz chamar o seu vigário que habita num palácio no Vaticano composto por
  centenas de divisões, veste vestimentas feitas com tecidos preciosos e
  adornadas de ouro e vive nas delícias. Um dia Jesus depois de ter morto a
  fome a uma multidão com apenas cinco pães e dois peixes, como soube que
  estavam vindo para arrebatá-lo para o fazerem rei, retirou-se para o monte
  sozinho, portanto recusou ser consagrado rei pelos homens, enquanto aquele
  que se proclama o seu vigário na terra quando se torna papa se faz declarar
  soberano de um Estado. Jesus diante de Pilatos disse que o seu reino não era
  deste mundo, mas o papa que se diz seu vigário antes demonstra procurar o
  poder temporal em todo o tempo e de querê-lo estender sempre mais sobre a
  terra de toda a maneira e não se envergonha de viver e de falar como um
  poderoso da terra. Jesus entrou em Jerusalém sobre um jumentinho mas ele
  viaja gozando de todo o conforto e de todo o luxo, exactamente como qualquer
  rei da terra, senão mais. Jesus veio para servir e para dar a sua vida por
  nós e portanto não tinha consigo guardas a protegê-lo para que os Judeus não
  lhe fizessem algum mal, mas este é escoltado por guarda-costas que têm ordem
  para matar caso a sua vida seja posta em perigo, e além disso é servido por
  um exército de guardas suíços; é verdadeiramente um príncipe da terra e não
  um homem que segue as pisadas de Cristo Jesus.  | 
 
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   Também Pedro era um homem humilde e pobre que
  não fazia de modo algum o tipo de vida que faz aquele que se diz o seu
  sucessor. À porta do templo dita ‘Formosa’, ele disse ao coxo: "Não
  tenho prata nem ouro...." (Actos 3:6), portanto não possuía sequer
  dinheiro para fazer uma esmola naquela ocasião, mas aquele está à cabeça de
  um império que ostenta enormes riquezas e como diz o Código de direito
  canónico ‘é o supremo administrador e dispensador de todos os bens
  eclesiásticos’ (Código de direito canónico, can. 1273). Parece um rei
  Salomão dos tempos modernos em riquezas (não em sabedoria), e não um apóstolo
  de Cristo que vive humildemente com o seu Deus como o foi Pedro. Em casa de
  Cornélio, quando Cornélio se lhe fez ao encontro e se lançou aos seus pés e o
  adorou, Pedro o tornou a levantar dizendo: "Levanta-te, que eu também
  sou homem!" (Actos 10:26),
  mas da forma como age este chamado sucessor de Pedro, é como se ele dissesse
  às pessoas: ‘Abaixai-vos diante de mim porque eu sou Deus para vós’. Sim,
  com efeito o papa dos Católicos considera ser Deus na terra. E tal o
  consideram os Católicos romanos porque é por eles adorado, beijado, e
  cantam-lhe cânticos. A cerimónia de coroação é um claro exemplo de como com
  efeito este homem é considerado ser Deus. Se lê por exemplo na Enciclopédia
  Católica que durante esta cerimónia ‘o pontífice vai ao trono onde recebe
  a última adoração. Os cardeais beijam o pé e a mão do papa que os
  abraça duas vezes, os patriarcas, os arcebispos e os bispos beijam-lhe o pé e
  o joelho direito, os abades mitrados e os penitenciários lhe beijam o pé’ (Enciclopédia
  Católica, vol. 6, 1781) [10]. Ou
  melhor, o papa é considerado maior do que Deus porque o cardeal Bellarmino,
  feito santo, declarou que os homens devem obedecer ao papa, mesmo se este
  ensina coisas tortas, antes que a Deus. Eis as suas palavras: ‘Se porém o
  Papa errasse, ordenando os vícios, ou proibindo as virtudes, a Igreja é obrigada
  a crer que os vícios sejam coisa boa, e as virtudes más, senão se quiser
  pecar contra a consciência. Se é obrigado ainda, nas coisas dúbias, estar ao
  juízo do Sumo Pontífice, e fazer aquilo que ele manda, e não fazer aquilo que
  ele proíbe, e para que não se aja contra consciência, se é obrigado a crer
  que seja bom o que ele manda, e mau o que ele proíbe’ (Bellarmino, De Rom.
  Pontifice, Lib. IV, cap. 23). Notai que no caso de o papa ensinar a perversão
  o Católico é obrigado a obedecer-lhe para não pecar contra a consciência! Mas
  nós dizemos: Mas não é porventura verdade o contrário? Isto é, não é
  porventura verdade que se o papa diz uma mentira, porque tal se demonstra à
  luz da Escritura, os homens não devem obedecer-lhe por causa da consciência?
  Certamente que assim é: mas não para muitos Católicos romanos cegados pelo
  diabo. Não há dúvida, das palavras de Bellarmino se evidencia que importa
  antes obedecer ao papa do que a Deus, que entre o que diz o papa e o que diz
  a Palavra de Deus, o que diz o primeiro é superior. E nós não podemos senão
  exprimir o nosso ódio por essas loucas palavras, que repito são produzidas
  pela boca de um ‘santo’ da igreja católica romana (o que significa que também
  as suas palavras são consideradas santas).   | 
 
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   Não
  se pode pois de modo nenhum dizer que este homem seja um exemplo de vida para
  os crentes como o foram os apóstolos. Paulo pôde bem dizer aos santos de
  Corinto: "Sede meus imitadores" (1 Cor. 11:1), e aos de Filipos:
  "O que também aprendestes, e recebestes, e ouvistes, e vistes em mim,
  isso fazei; e o Deus de paz será convosco" (Fil. 4:9), porque ele era
  imitador de Cristo e não de um qualquer déspota da terra, mas aquele que
  afirma ser nada menos que o vigário de Cristo não pode de modo algum dizer
  aos homens para viverem como ele vive para serem um exemplo neste mundo
  porque faz uma vida que se adequa a um príncipe e não a um ministro de
  Cristo. Como podem dizer portanto os Católicos que nós falamos mal do seu
  chefe sem razão quando ele com a sua conduta demonstra abertamente de não ter
  em nenhuma consideração os mandamentos de Cristo mas de exaltar-se contra
  Cristo? Se nós fôssemos caluniadores de um ministro de Cristo que se conduz
  de modo digno de Deus sem dar motivo de escândalo em coisa alguma certamente
  seríamos envergonhados pela sua própria conduta porque seria irrepreensível
  mas este de modo algum tem em consideração as palavras de Pedro: "Assim
  é a vontade de Deus, que, fazendo bem, tapeis a boca à ignorância dos homens
  insensatos" (1 Ped. 2:15). Se ele portanto fizesse a vontade de Deus
  (como pretende fazê-la), e se nós fôssemos insensatos teríamos a nossa boca
  tapada; mas nós não somos homens insensatos que têm prazer em dizer mal da
  recta conduta de alguém e por isso a nossa boca não pode ser de alguma
  maneira tapada porque diz a verdade. Jesus um dia disse estas palavras ao
  guarda do sumo sacerdote que o feriu: "Se falei mal, dá testemunho do
  mal" (João 18:23); portanto, se nós que dizemos a propósito daquele (que
  foi chamado pelo cardeal Bellarmino com quinze nomes diferentes que são:
  ‘Papa, Padre dos padres, Pontífice dos cristãos, Sumo Sacerdote, Príncipe dos
  sacerdotes, Vigário de Cristo, Cabeça do corpo da Igreja, Fundamento da
  Igreja, Pastor do aprisco de Cristo, Pai e Doutor de todos os fiéis, Reitor
  da casa de Deus, Guarda da Vinha de Deus, Esposo da Igreja, Primaz da Sede
  apostólica, Bispo universal’ [Bellarmino, De Rom. Pontif. lib. II,
  cap. 31]) que é um anticristo dizemos uma coisa não verdadeira o demonstrem
  os teólogos papistas que falámos mal.   | 
 
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   O apóstolo
  Pedro não fundou a Igreja de Roma e não foi bispo dela   | 
 
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   Os teólogos Católicos romanos, apoiando-se na
  tradição, afirmam que Pedro veio a Roma, fundou a Igreja de Roma exerceu o
  ofício de bispo universal em Roma por vinte e cinco anos (de 42 a 67) e antes
  de morrer transmitiu o seu cargo aos seus sucessores.   | 
 
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   Comecemos com a vinda de Pedro a Roma: a
  Escritura não fala dela como, pelo contrário, faz da vinda de Paulo, portanto
  não podemos confirmá-la com a Escritura. Isto não nos leva porém a dizer que
  Pedro nunca veio a Roma; pode também ser verdade que Pedro tenha vindo a
  Roma. Mas no caso de ter vindo é recusável o facto que ele tenha sido o
  fundador dela porque a Igreja de Roma já existia antes que ele lá fosse, de
  facto se presume que ela foi fundada por aqueles adventícios Romanos que no
  dia de Pentecostes depois de ter ouvido a pregação de Pedro se converteram a
  Cristo. Se Pedro tivesse sido o pastor dela ou um dos anciãos certamente
  Paulo na sua epístola à Igreja de Roma não teria omitido o seu nome quando no
  fim dela diz para saudar os santos referindo o nome deles, enquanto, ao
  contrário, o nome de Pedro não está incluído naquela lista (cfr. Rom.
  16:3-15). Pode alguma vez ser que o primeiro papa, o primeiro bispo
  universal, o vigário de Cristo, assim como o chama a igreja católica romana,
  o primeiro bispo de Roma não tenha sido citado minimamente por Paulo embora
  estivesse em Roma? Como se explica tudo isso. Explica-se com o facto que Pedro
  não estava nem em Roma naquele tempo e muito menos era bispo universal como
  antes querem fazer crer os Católicos. Mas os Católicos não se rendem perante
  a evidência, e dizem que a prova de que Pedro foi a Roma está na Escritura e
  se encontra na primeira epístola de Pedro onde ele diz: "A igreja que
  está em Babilónia eleita como vós, vos saúda.." (1 Ped. 5:13); onde por
  Babilónia se entende Roma. Não estamos por nada de acordo com esta
  interpretação dada a Babilónia, porque aqui por Babilónia deve-se entender a
  cidade de Babilónia e não a cidade de Roma. Por que é que Pedro alguma vez
  chamaria a Roma Babilónia? Mas quem é que também hoje escrevendo desde Roma
  diria que os santos que estão em Babilónia dão as suas saudações? Nós
  consideramos que se Paulo nas suas epístolas tinha chamado Roma desta maneira
  (cfr. Rom. 1:7; 2 Tim. 1:17), também Pedro se tivesse citado Roma a chamaria
  assim. O facto pois de falar de Babilónia quer dizer que naquele tempo quando
  escrevia aquela epístola se encontrava em Babilónia (no Oriente portanto) com
  os santos daquela cidade. Com isto porém não queremos dizer que Pedro nunca
  tenha estado em Roma, mas apenas que Babilónia é Babilónia, e não Roma.   | 
 
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   Depois de ter demonstrado que Pedro não foi
  constituído por Cristo cabeça da Igreja, e que não se sabe se tenha vindo a
  Roma mas sabe-se que se alguma vez veio a Roma não fundou aqui a Igreja, mas
  quando aqui veio a Igreja já existia e tinha um colégio de anciãos a
  conduzi-la, resulta claro pois que a chamada sucessão apostólica, que os
  teólogos católicos dizem possuir ininterrupta desde Pedro até agora, é uma
  invenção papista para fazer parecer verdadeiro o primado do chamado papa. Mas
  não é só uma invenção, demonstra-se também interrompida muitas vezes no curso
  da história; porque houveram períodos em que a sede de Roma esteve vacante [11] e períodos em que disputaram o papado dois
  e até três papas; sem depois falar do chamado ‘cativeiro de Avignon’ e dos
  papas declarados perversos pelos próprios historiadores católicos.   | 
 
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   Breve
  história do papado   | 
 
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   Demonstrámos portanto pelas Escrituras como
  aquele que é chamado papa não é nem o bispo universal, nem o sucessor de
  Pedro porque Pedro não foi bispo de Roma e não deixou sucessores, nem o chefe
  da Igreja de Deus, e nem o vigário de Cristo, e outras coisas a seu respeito.
  Queremos agora examinar em seus pontos mais importantes a história do
  papado a fim de compreender como tenha podido acontecer que da antiga Igreja
  de Roma, cuja fé era publicada por todo o mundo, tenha surgido este pequeno
  Estado comandado por aquele que se diz o bispo de Roma e o sucessor de Pedro
  o qual possui um enorme poder espiritual sobre centenas de milhões de pessoas
  de todo o mundo. Traçarei a história do papado falando tanto da origem do
  poder espiritual como do temporal detendo-me de quando em vez sobre aqueles
  eventos que mais contribuíram para desenvolver estes poderes; me deterei
  também a falar de alguns papas que se distinguiram pela sua arrogância,
  falsidade, impiedade, sede de dinheiro e de sangue, e pela sua dissolução e
  de algumas chacinas e guerras ocorridas por obra dos papas ou para a
  conquista do assento papal ou para a conservação do trono pontifício, ou para
  a salvaguarda dos interesses e dos territórios do papado ou para aumentar o
  seu território de jurisdição. Decidi inserir neste livro esta parte histórica
  sobre o papado porque cheguei à conclusão depois de ter estudado o
  catolicismo romano que sem ela faltaria no livro uma parte importante para a
  compreensão do catolicismo. Com efeito, considero que se um crente quer
  perceber bem o que é o catolicismo romano além de conhecer a fundo as suas
  doutrinas, deve conhecer a história do papado, senão toda, pelo menos uma
  parte. Só assim ele pode ter um quadro completo do catolicismo e pode
  demonstrar aos Católicos, além de com as sagradas Escrituras, também com os
  factos históricos registados pelos seus próprios historiadores e escritores
  que aquela instituição sobre a qual eles fundam todas as suas esperanças não
  é mais que uma instituição humana que não se baseia de modo nenhum sobre as
  palavras de Jesus a Pedro (como é afirmado por eles na sua ignorância) porque
  é apenas fruto de circunstâncias históricas verificadas nos primeiros oito
  séculos que permitiram o nascimento e o crescimento dela [12]; instituição que uma vez nascida para poder
  conservar-se viva e desenvolver-se recorreu a compromissos de variados
  géneros, a mentiras, à violência, à guerra, a prepotências de todo o género;
  cujos chefes que se sucederam no seu vértice fomentaram guerras e injustiças
  de todo o género, abençoando os malvados e amaldiçoando os justos, aprovando
  a iniquidade e reprovando a justiça, e introduzindo e dando aval a toda a
  sorte de falsas doutrinas.  | 
 
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   Do segundo ao quarto século  | 
 
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   Por volta do fim do segundo século o bispo de
  Roma começou a atribuir-se prerrogativas de supremacia sobre os outros
  bispos. O então bispo Vítor (189-199), com efeito, na controvérsia que
  existia acerca da Páscoa entre as igrejas do Oriente e as do Ocidente (os
  Orientais diziam que era necessário festejá-la a 14 de Nisan qualquer que
  fosse o dia em que calhasse, enquanto os Romanos diziam que era necessário
  festejá-la no Domingo mais próximo ao 14 de Nisan) pediu às comunidades da
  Ásia para se aterem à praxe romana que remontava, a seu dizer, à tradição apostólica;
  e no caso de recusa ameaçou a exclusão da comunhão eclesial. Mas as igrejas do Oriente se opuseram a Vítor
  por meio de Policrates bispo de Éfeso [13].   | 
 
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   Também no terceiro século o bispo de Roma
  continuou a considerar-se num certo sentido superior aos outros bispos, com
  efeito, Calisto I (217-222) considerava apoiando-se sobre "Tu és
  Pedro" ter o poder de ligar e desligar e portanto de acolher na igreja
  também os adúlteros porque a sua igreja estava perto do sepulcro de Pedro.
  Mas a Calisto se lhe opôs Tertuliano dizendo-lhe: ‘Quem és tu que (de tal
  modo) subvertes e deformas a intenção manifestada pelo Senhor, que conferia
  tal poder pessoalmente a Pedro?’ (Tertuliano, De pudicitia 21).  | 
 
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   Depois foi a vez de Estevão I (254-257) a
  considerar-se em posse de algo que os outros bispos não tinham, e portanto
  superior aos outros bispos, com efeito ele reivindicou a sucessão de Pedro
  por causa do lugar onde ele era bispo e de ter portanto a autoridade de
  acolher na igreja também os batizados pelos heréticos. Em outras palavras
  Estevão, apoiando-se na tradição, aceitava o batismo ministrado pelos
  heréticos pelo que aqueles que deixavam uma seita para entrar a fazer parte
  da Igreja, segundo ele, não necessitavam ser rebatizados, mas apenas que o
  bispo lhes impusesse as mãos. Mas a Estevão se opôs Cipriano, bispo de
  Cartago, o qual não considerava válido o batismo dos heréticos e por isso se
  um herético se convertia devia ser rebatizado. Ele não dizia porém rebatizado
  mas simplesmente batizado porque para ele aquele batismo não era verdadeiro.
  Cipriano disse numa sua carta a Quinto a propósito desta controvérsia: ‘Não
  é, aliás, caso de ditar uma norma em força de um costume [o evocado por
  Estevão]: toca à razão prevalecer’ (Carta 71, III. 1) [14]. E por se ter recusado a dar razão a
  Estevão foi por ele excomungado.   | 
 
| 
   Estas oposições recebidas por três bispos
  romanos no espaço de pouco mais de meio século testificam claramente que as
  igrejas naquele período não reconheciam que o bispo de Roma tivesse um
  primado jurisdicional de instituição divina sobre a Igreja universal; uma
  coisa do género era completamente estranha às igrejas de então. (É necessário
  dizer porém que nas relações com o bispo de Roma muitas igrejas tinham
  começado a mostrar um certo respeito, isto é, tinham começado a mostrar-lhe
  uma honra especial). O contrário, isto é, que as igrejas dos primeiros
  séculos depois de Cristo considerassem o bispo de Roma o seu chefe ou o bispo
  dos bispos, de quem elas dependiam e a quem deviam uma absoluta submissão, cujos
  juízos eram inapeláveis e não criticáveis porque pronunciados pelo vigário de
  Cristo na terra, não se pode demonstrar nem com os escritos do Novo
  Testamento e nem sequer com os escritos dos chamados pais tanto é verdade que
  até um escritor católico é obrigado a afirmar: ‘Não se pode assegurar para o
  período dos primeiros três séculos uma supremacia jurídica do bispo de Roma
  sobre a Igreja universal’.   | 
 
| 
   Mas por que motivos o bispo de Roma começou a
  considerar-se (e a ser considerado por alguns) superior aos outros bispos ou
  de qualquer modo digno de especial honra em relação a eles? Os motivos são os
  seguintes: 1) Roma era a capital do Império Romano e portanto a cidade mais
  importante de todo o Império e portanto também o bispo daquela cidade devia
  ser objecto de particular honra; 2) em Roma no tempo dos apóstolos havia uma
  Igreja famosa por todo o mundo pela sua fé à qual Paulo, o apóstolo dos
  Gentios, tinha escrito uma das suas mais longas epístolas, e segundo muitos
  uma das suas mais importantes; 3) a Igreja de Roma gozava fama de ser apegada
  à sã doutrina (chamada por muitos tradição apostólica) e adversa à heresia
  (por exemplo tinha-se oposto com força às heresias dos Gnósticos) [15], e ao cisma e a este propósito se fazia
  presente a carta do bispo romano Clemente (88-97) por ele escrita à Igreja de
  Corinto quando no seio dela jovens se tinham rebelado aos seus condutores:
  nesta carta Clemente exortava os crentes a submeterem-se aos anciãos
  constituídos pelos apóstolos [16]; 4)
  a tradição dizia que em Roma tinha morrido o apóstolo Paulo; 5) a tradição
  dizia que Pedro tinha ido a Roma e ali tinha ficado diversos anos a
  apascentar a Igreja daquela cidade (como bispo) e ali tinha também morrido
  mártir pelo que quem era bispo daquela cidade era automaticamente sucessor de
  Pedro. Mas entre todos os motivos aqui supracitados aquele que mais do que
  outro levou os bispos de Roma a se considerarem superiores aos outros foi
  este último citado, e de facto é sobre este que ainda hoje insistem os Católicos
  para sustentar o primado do seu bispo romano sobre toda a Igreja.  | 
 
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   Mas este primado (sobre a Igreja universal) do
  chamado sucessor de Pedro era preciso demonstrá-lo com as Escrituras, ou
  seja, era preciso demonstrar que Pedro tinha sido por Cristo constituído
  chefe da sua igreja na terra porque só assim o seu ‘sucessor’ poderia
  reivindicar ter um primado de origem divina. Eis pois que os bispos de Roma
  começaram a declarar, primeiro timidamente e depois cada vez com mais
  clareza, que em virtude das palavras de Jesus a Pedro: "Tu és Pedro, e
  sobre esta pedra edificarei a minha igreja... eu te darei as chaves do reino
  dos céus; e tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que
  desligares na terra será desligado nos céus" (Mat. 16:18-19) [17], o apóstolo Pedro tinha sido constituído
  Príncipe dos apóstolos, cabeça e fundamento da Igreja, e que o bispo de Roma,
  dado que era o seu sucessor (porque Pedro tinha estado em Roma e aqui tinha
  morrido), tinha por conseguinte recebido em herança o primado dado por Cristo
  a Pedro. Pode-se portanto dizer que as palavras de Jesus ditas a Pedro
  "tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja..." (e
  repito, junto com as palavras da tradição que afirmavam que Pedro tinha
  estado a Roma e ali tinha morrido mártir, sem as quais as palavras de Jesus
  não poderiam ser aplicadas ao bispo de Roma) começaram a um certo ponto da
  história da Igreja (desde o século III em diante) a servir aos bispos de Roma
  para sustentar o seu primado sobre toda a Igreja, em outras palavras eles se
  puseram a interpretar daquela maneira errada essas palavras de Jesus a Pedro,
  fazendo ao mesmo tempo sempre presente que a sua sede estava perto do
  sepulcro de Pedro, porque impelidos pelo seu orgulho e pela sua sede de
  poder. Queriam em suma ter o primado sobre a Igreja universal presente em
  todo o lugar. Que arrogância, que presunção! Mas esta sua ambição de dominar
  sobre toda a Igreja encontrou a oposição de muitos que justamente viram
  naquela atitude do bispo de Roma uma demonstração de arrogância. Mas a
  semente má tinha já sido semeada pelos bispos de Roma e com o passar do tempo
  ela, com a ajuda dos imperadores e dos reis, cresceria até fazer o bispo de
  Roma tornar-se o soberano de um Estado.  | 
 
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   A supremacia do bispo de Roma recebeu um forte
  impulso no quarto século. Vejamos alguns acontecimentos que o demonstram.
  Constantino (306-337), depois de ter subido ao poder concedeu aos Cristãos a
  ‘liberdade’ de professar a sua fé com o édito de Milão (313) em que se dizia:
  ‘Desde longo tempo pensamos que não se deve negar a liberdade de religião;
  antes, a todo o homem deveria ser garantida a liberdade de manifestar os seus
  pensamentos e os seus desejos, permitindo-lhe assim considerar as coisas do
  espírito segundo a sua escolha. É
  por este motivo que ordenamos de permitir a qualquer um observar as suas
  crenças e a sua religião’. A Igreja podia finalmente, depois de tantos anos
  de perseguição [18], gozar da
  ‘liberdade de culto’ a par dos pagãos. Constantino restituiu às igrejas as
  propriedades que lhes tinham sido confiscadas pelos seus predecessores
  durante as perseguições, ele mandou também construir muitas basílicas [19] e concedeu-lhes vastíssimos latifúndios [20]. Os bispos por isso ficaram com enormes
  propriedades para administrar [21].
  Além disso os bispos foram isentos de diversos tributos; as suas propriedades
  estavam isentas. Foi também permitido deixar os seus bens às igrejas, e os
  deixados não eram sujeitos a nenhuma taxa. Mas Constantino desta maneira
  tornou-se uma espécie de ‘cabeça visível’ da Igreja porque começou a comandar
  em matéria de fé e doutrina também sobre os bispos que eram obrigados a
  inclinar-se diante das suas decisões também nas coisas espirituais se não
  quisessem perder os seus privilégios. Vejamos algumas destas suas ingerências
  nos assuntos internos da Igreja.   | 
 
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   Nos
  primeiros anos do século IV rebentou a controvérsia donatista. Tinha sucedido
  que naqueles anos na África setentrional um certo Ceciliano tinha sido
  ordenado bispo por um certo Félix. Mas como - era sustentado por alguns -
  este Félix debaixo da perseguição que havia de Diocleciano tinha cedido
  diante dos pagãos (pelo que era um traidor), muitos não aprovaram a ordenação
  de Ceciliano porque segundo eles o comportamento de Félix a invalidava. À
  cabeça destes se pôs um certo Donato, daqui o nome de Donatistas dado aos
  adversários de Ceciliano, que apelaram ao imperador pedindo a deposição de
  Ceciliano. Em 314 (enquanto estava em curso a controvérsia donatista)
  o imperador mandou convocar um concílio em Arles, no qual participaram bispos
  ou seus delegados da Gália, da Itália, de África, da Espanha e da Britânia.
  Neste concílio não participou porém Silvestre (314-335) bispo de Roma (tido
  por papa). Este concílio tomou posição contra a posição donatista porque aboliu
  o uso africano de rebatizar os heréticos convertidos, desde que o seu
  primeiro batismo tivesse sido administrado em nome da Trindade e aprovou as
  ordenações feitas por indígenas. Os Donatistas, ao contrário, faziam depender
  a validade das ordenações da conduta daquele que as fazia. Em 316 Constantino
  declarou definitivamente Ceciliano inocente e emanou uma lei muito severa
  contra os Donatistas: eles eram condenados ao exílio com a confisca dos bens,
  as basílicas por eles ocupadas deviam ser-lhes tiradas e dadas aos Católicos.
  Esta sentença não fez mais do que
  exacerbar os ânimos dos Donatistas. Em Cartago em 317 três basílicas
  donatistas foram ocupadas a preço de atrozes massacres; os soldados se
  abandonaram a toda a espécie de violência. Por toda a parte na África
  proconsular houveram saques, assassinatos de bispos, ultrajes às virgens. Em
  321 porém o imperador concedeu aos Donatistas liberdade de culto anulando
  assim as decisões do concílio de Arles [22].
  Ainda Constantino mandou convocar o concílio geral (ou ecuménico) de Nicéia
  (em 325) que condenou a heresia ariana e Ário [23]
  (com os bispos que a pensavam como ele) ao exílio; ele o abriu e ele tomou
  parte nele dominando sobre a assembleia reunida. Também neste concílio não
  participou o bispo de Roma porque enviou dois seus delegados.   | 
 
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   Em
  330 Constantino quis deslocar-se para Bizâncio, que chamou Constantinopola,
  para fazer dela a capital do Império, em Roma criou-se assim um vazio
  político que foi imediatamente tomado pelo bispo, que assim além de desempenhar
  funções religiosas começou a exercer também funções políticas tornando-se a
  pessoa mais poderosa da cidade [24]. Como
  veremos a seguir, no oitavo século nos ambientes papistas será redigido um
  falso documento chamado Donatio Constantini (a Doação de Constantino)
  em que se dizia que Constantino ao deslocar-se para Bizâncio deixava a
  jurisdição de Roma e de outros territórios ao bispo de Roma; documento que na
  idade média servirá aos papas para confirmar o seu poder temporal. A
  controvérsia ariana continuava porém ainda a perturbar a Igreja porque os
  Arianos tornavam-se cada vez mais. Ário conseguiu captar o favor do imperador
  o qual convidou Atanásio (295 ca. - 373), bispo de Alexandria, a readmitir
  Ário na Igreja, mas este se recusou a fazê-lo. Então Constantino em 335
  mandou convocar um concílio em Tiro (que se transferiu depois para Jerusalém)
  em que fez reabilitar Ário, declarar ortodoxa a sua doutrina, e fez depôr
  Atanásio, que defendia incansavelmente a divindade de Cristo Jesus. Atanásio
  foi portanto exilado (este foi o seu primeiro exílio e durou até à morte de
  Constantino ocorrida em 337).   | 
 
| 
   Sob o reinado de Constantino aconteceu assim
  que a Igreja se aliou com o imperador permitindo-lhe intrometer-se nos
  assuntos espirituais em troca de privilégios, e desde aquele momento em
  diante não seria mais a mesma porque de perseguida tornar-se-á perseguidora,
  de facto se servirá do braço secular para punir com o exílio e por vezes para
  exterminar os que dissentirão dela [25].  | 
 
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   Em 343 se realiza um concílio em Sárdica (a
  actual Sófia), em que ainda uma vez não esteve presente o bispo de Roma, que
  então era Júlio (337-352), que absolveu Atanásio e condenou Ário. Em um dos
  cânones deste concílio é recordado o costume de um bispo não poder ser
  julgado senão pelo concílio da sua província e é dito que em caso de o bispo
  condenado não ficar satisfeito com a sentença dada, os comprovinciais devem
  escrever ao bispo de Roma. Em outras palavras dá-se a faculdade a um bispo
  condenado de apelar para Roma. É o cânone terceiro o citado que precisamente
  diz: ‘Se nalguma província, alguém dentre os Bispos tem uma questão com um
  seu irmão e colega no episcopado, nem um nem outro deve apelar dela ao Bispo
  de outra província. Mas se um Bispo julga ser condenado injustamente, e
  considera a sua causa ser não fraca mas boa, a dever-se renovar o julgamento,
  - se agrada à vossa Caridade, honremos a memória de Pedro apóstolo, e se
  mande notícia, acerca daqueles juízes, a Júlio o Bispo de Roma, de maneira
  que por meio dos Bispos das províncias adjacentes, se renove, se for
  necessário, o tribunal, e ele (Júlio) estabeleça juízes instrutores...’. O
  cânone quinto depois acrescenta que em caso de apelo, o Bispo de Roma pode
  ordenar que a causa seja de novo examinada pelos Bispos provinciais. Este
  concílio porém foi abandonado pelos bispos orientais nele presentes, e os
  seus cânones não foram por eles reconhecidos. O concílio de Sárdica
  reveste-se de uma importância notável, direi fundamental, na evolução do
  poder espiritual de Roma porque pela primeira vez num concílio a sede de Roma
  era manifestamente exaltada acima das outras. E não é por acaso que os
  defensores do poder espiritual do papa ainda hoje citam muito o concílio de
  Sárdica para sustento do primado do bispo de Roma sobre a Igreja universal.  | 
 
| 
   Em 355 o imperador Constâncio mandou convocar
  um concílio em Milão. Este concílio condenou de novo Atanásio, o qual sofreu
  assim o enésimo exílio que desta vez durou até 362 [26]. Junto com ele foram exilados outros bispos
  que sustentavam a divindade de Cristo entre os quais também o bispo de Roma
  que então era Libério (352-366) o qual não tinha querido submeter-se ao
  imperador aceitando o arianismo e condenando Atanásio. Mas poucos anos
  depois, Constâncio, vendo que Libério durante o exílio tinha cedido, o fez
  voltar do exílio em ocasião do concílio de Sirmio (358) e o obrigou a
  subscrever a heresia ariana para poder voltar a Roma. Aconteceu assim que o
  imperador Constâncio fez voltar Libério a Roma. Mas entretanto em Roma tinha
  sido eleito bispo Félix. Se tinha pois vindo a criar uma situação difícil e
  embaraçosa porque haviam agora dois bispos de Roma, o velho e o novo. O
  imperador então mandou escrever a Roma pelos bispos do concílio de Sirmio,
  onde tinha sido aprovada pela enésima vez a heresia ariana, uma carta em que
  se dizia que ‘os dois bispos ocupariam em conjunto a sede apostólica e fariam
  de comum acordo as funções sacerdotais; e que era necessário esquecer todos
  os dolorosos acontecimentos verificados a propósito da ordenação de Félix e
  da ausência de Libério’. Mas as coisas não correram como queria o imperador
  porque em Roma se criaram duas facções que se combateram por diversos anos;
  houveram tumultos mesmo sangrentos segundo o que dizem alguns. Félix levou a
  pior e teve que ir embora dali, e hoje é considerado um antipapa [27].   | 
 
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   A Libério depois sucedeu Dámaso (366-384) o
  qual tornou-se bispo de Roma com a força e a violência. Eis como este se
  tornou bispo. Quando morreu Libério no ano 366, apresentaram-se como
  candidatos ao papado o diácono Ursino e o padre espanhol Dámaso. Ambos foram
  eleitos bispos pelos respectivos partidos. Mas quando se tratou de tomar
  posse da sede episcopal, os partidários de um e os partidários de outro
  pegaram em armas para decidir quem era o verdadeiro sucessor de Pedro. O
  combate fez-se pelas ruas e pelas basílicas; depois de muitas batalhas os
  seguidores de Ursino fecharam-se na basílica de Sicinnio (que depois será
  chamada por Sisto III ‘S. Maria Maior’). Os seguidores de Dámaso então
  treparam ao telhado, praticaram um foro e começaram a lançar contra os
  seguidores de Ursino pedras e telhas, enquanto os outros atacavam o portão
  central. Quando o portão cedeu, rebentou uma luta sangrenta no fim da qual se
  contaram 137 cadáveres entre os seguidores de Ursino. Este foi depois mandado
  para o exílio pelo representante do imperador. Dámaso sujou portanto as suas
  vestes de sangue para tomar posse do bispado romano. E agora este é contado
  entre os santos (Dámaso é o que sugeriu a Jerónimo para fazer uma nova
  tradução da Bíblia que agora leva o nome de Vulgata). E não foi a única vez
  que aconteceu que alguém se tornou bispo de Roma derramando ou fazendo
  derramar sangue pois destas lutas sangrentas entre os partidários de dois
  candidatos ao papado seguiram-se muitas delas no curso dos séculos
  sucessivos. Aliás, é necessário ter presente que o lugar de bispo de Roma
  tinha-se tornado muito ambicionado porque conferia um grande poder sobre as
  almas e privilégios e honras em grande número. Quem se tornava bispo de Roma
  tornava-se uma espécie de rei que poderia viver no luxo e nas delícias. Para
  perceber quanto isso era verdade há o testemunho de Amiano Marcelino
  (escritor pagão), que viveu no século IV, o qual falando do clero romano e em
  particular dos bispos diz: ‘Eu devo confessar que, vendo quanta pompa e
  magnificência acompanha a dignidade, não me admiro que aqueles que a
  ambicionam, tenham usado todos os meios possíveis para obtê-la (o cargo de
  bispo). Obtendo-a, podiam estar seguros de se tornarem ricos e poderosos
  pelos presentes que lhes davam as damas romanas. Não era mais mister que
  andassem a pé, mas faziam uso de tripulações magníficas e ricamente
  adornadas. Sobre as suas mesas haviam em abundância as comidas mais
  delicadas; eles ultrapassavam mesmo o próprio imperador em magnificência e
  dispêndio’. Jerónimo escreveu que quando Dámaso pediu ao prefeito de Roma, um
  pagão com muitos títulos sacerdotais, para se converter, este lhe respondeu:
  ‘Com todo o gosto, se me nomeares Bispo de Roma’. Eis pois o que se tinha
  tornado o bispo de Roma aos olhos dos pagãos; um príncipe, um rei da terra.  | 
 
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   Em 380 o imperador Teodósio emanou um édito que
  fazia do cristianismo a religião oficial do Império Romano; e em 381 o concílio
  de Constantinopola reconhecia o primado da sede romana, e estabelecia que o
  patriarca de Constantinopola tinha o primado de honra segundo logo depois ao
  do bispo de Roma. Portanto foi ainda uma vez um concílio a declarar a sede de
  Roma superior às outras; apesar disso o então bispo de Roma, Dámaso,
  declarava num concílio romano de 382: ‘A Santa Igreja de Roma tem a
  precedência sobre todas, não graças à deliberação deste ou daquele concílio,
  mas porque o primado lhe foi conferido pela frase de Nosso Senhor e Salvador
  reportada no Evangelho’!  | 
 
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   Do quinto ao sétimo século  | 
 
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   Também o bispo romano Inocêncio I (401-417)
  reforçou o primado do bispo de Roma; ele disse por exemplo: ‘Quem não conhece
  ou não vê que aquilo que foi declarado à Igreja de Roma por Pedro, Príncipe
  dos Apóstolos e que ainda aqui se conserva, deveria ser por todos observado?
  E que nada se deveria acrescentar ou introduzir sem a sua autoridade
  ou que parecesse provir de outras partes sendo manifesto que todas as igrejas
  de Itália, das Gálias, de Espanha, de África, de Sicília e das ilhas
  intermédias foram estabelecidas por ofício do venerável apóstolo Pedro e dos
  seus sucessores’.  | 
 
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   Em 445 o imperador Valentiniano III reconheceu
  o primado do bispo de Roma nas coisas espirituais, e decretou que o que
  decidia aquele bispo devia ser lei para todos. ‘Tudo o que a autoridade da
  sede apostólica sancionou ou vier a sancionar, seja lei para eles e para
  todos’. Este ulterior reconhecimento imperial não fez mais que reforçar
  ulteriormente o primado do bispo de Roma. E de facto o então bispo de Roma
  Leão I dito Magno (440-461) - que muitos chamam o primeiro ‘papa’ -
  sustentava abertamente e com grande força que Jesus concedeu a Pedro o
  primado da dignidade apostólica, que passou depois ao bispo de Roma ao qual
  compete o cuidado de todas as igrejas. Este Leão tinha tão estreitas relações
  com o imperador Valentiniano que obteve dele a promulgação de leis
  extremamente severas contra os Maniqueus [28].
  Isto demonstra ainda uma vez como o bispo de Roma podia livremente, em
  virtude da sua posição privilegiada que gozava junto do imperador, usar o
  poder civil para perseguir os heréticos. O primado de Roma recebeu uma
  ulterior confirmação por um facto acontecido no concílio de Calcedónia de
  451, convocado pelo imperador Marciano, que os papistas fazem notar com
  orgulho para sustentar o primado do bispo de Roma. Leão tinha enviado àquele
  concílio uma carta em que confutava a heresia de Eutiques (este era um monge
  de Constantinopola que dizia que a natureza humana e divina em Cristo se
  tinham fundido numa só, a divina). E o comentário da assembleia a essa carta
  foi: ‘Pedro falou pela boca de Leão!’ [29].
  Mas apesar disso a chamada supremacia da sede de Roma recebeu um
  redimensionamento por esse mesmo concílio de Calcedónia porque ele decretou
  no seu vigésimo oitavo cânone: ‘Os Pais atribuiram em bom direito o primado à
  sede da antiga Roma, porque esta cidade é soberana; com o mesmo intento os
  cento e cinquenta e três bispos teofilos outorgaram o mesmo primado à
  santíssima sede da nova Roma, pensando com razão que a cidade honrada (pela
  presença) do imperador e do senado, e que tem os mesmos privilégios da antiga
  Roma imperial, é grande como essa nas coisas eclesiásticas, sendo a segunda
  depois dela’ [30]. Os legados de Leão
  presentes no concílio (note-se ainda uma vez que o bispo de Roma não esteve
  presente pessoalmente num concílio da Igreja antiga) protestaram contra este
  cânone; para eles constituia uma injúria à ‘sede apostólica’. Leão I não
  aceitou o vigésimo oitavo cânone mas se lançou com veemência contra ele. À
  imperatriz Pulquéria escreveu até: ‘..pela autoridade de S. Pedro, ele
  anulava absolutamente o decreto de Calcedónia’.   | 
 
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   Durante o século V contribuiram para aumentar o
  poder temporal do bispo de Roma também as invasões barbáricas. Por volta de
  410 desceram os Godos sob Alarico os quais por três dias devastaram
  Roma, em 452 os Hunos sob Átila e em 455 os Vândalos sob Genserico. No caso
  do saque de Roma feito pelos Godos de Alarico aconteceu que Inocêncio I se tinha
  deslocado com uma embaixada romana a Ravena para pedir ao imperador Honório
  de tratar com os Godos e condescender às suas exigências para que Roma
  não fosse saqueada; mas a missão se revelou infrutuosa porque Alarico entrou
  em Roma e a saqueou por três dias. De qualquer modo, o bispo de Roma aos
  olhos do povo cresceu em importância porque era olhado como um defensor. No
  caso de Átila é dito que quando ele ameaçava atacar Roma e saqueá-la Leão I
  foi ao seu encontro e conseguiu convencê-lo (depositando-lhe nas mãos um
  conspícuo tributo) de não tocar Roma. No caso de Genserico (que provinha da
  África setentrional), Leão I conseguiu convencê-lo a poupar Roma do fogo e do
  sangue; mas teve que consentir-lhe saquear com as suas hordas a cidade por
  duas semanas. Os Vândalos
  espoliaram os templos das suas coisas preciosas e transportaram para África
  como escravos de guerra milhares de romanos. Desta maneira o bispo de
  Roma adquiriu aos olhos da população romana um maior prestígio. Uma outra
  devastação bárbara verificou-se em 472 sob Rechimero [31]. O império Romano do Ocidente caiu sob os
  ataques das invasões barbáricas em 476 quando Odoacro depôs Rómulo Augusto e
  recebeu o título de rei de Itália. A sua queda permitirá ao papado
  desenvolver-se ulteriormente porque ele não será mais controlado e governado
  pelo imperador do Ocidente. O bispo de Roma caído o império do Ocidente
  tornar-se-á ainda mais importante.  | 
 
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   Em 492 tornou-se papa Gelásio I (492-496) que
  contribui para reforçar o poder espiritual do bispo de Roma, com efeito
  escreveu ao imperador Anastásio: ‘Dois são os poderes, augusto imperador, que
  principalmente governam este mundo; o poder sagrado dos bispos e o temporal
  do rei. Destes dois poderes o ministério dos bispos tem maior peso, porque
  eles devem prestar contas ao tribunal de Deus também pelos reis dos mortais’,
  e ainda Gelásio reafirmou o primado de Roma dizendo: ‘E se convém que todos
  os fiéis se submetam aos bispos, os quais rectamente dispensam as coisas
  sagradas, quanto mais é necessário proceder com o chefe da sede que Deus
  constituiu sobre a todas as outras e pela Igreja universal foi sempre
  venerada com devoção filial’.  | 
 
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   Em 498 morreu o bispo de Roma Anastásio II. Na
  eleição do novo papa aconteceu que uma parte do clero e a maioria do senado
  elegeram papa o arcipreste Lourenço na basílica de Santa Maria
  Maior. Entretanto porém os adversários de Lourenço elegiam o diácono Símaco
  na basílica de Latrão. Rebentaram portanto tumultos entre as duas facções
  porque ambos se consideravam o legítimo sucessor de Pedro. As coisas chegaram
  a tal ponto que o rei ostrogodo Teodorico, que era ariano, interveio na
  disputa e fez vir os dois contendentes a Ravena. Foi reconhecido o direito de
  Símaco. Regressado a Roma Símaco fez convocar um concílio; Lourenço se submeteu
  a Símaco e foi-lhe entregue a diocese de Nocera na Campania. Mas a calma
  durou pouco, porque os adversários de Símaco o atacaram acusando-o de vários
  delitos considerando-o indigno de ocupar a ‘sede apostólica’. Teodorico
  convocou de novo Símaco a Ravena, mas este chegando a Rimini, decidiu fugir e
  voltar para Roma onde se fechou em São Pedro. A Teodorico este seu
  comportamento pareceu uma confissão. Os adversários se aproveitaram então
  desta situação e obtiveram que fosse enviado para Roma um visitante para
  governar temporariamente a igreja. Foi enviado Pedro bispo de Altino que
  chegando a Roma recusou ter relações com Símaco. Símaco protestou contra esta
  intrusão. Todos os bens eclesiásticos e todos os edifícios religiosos
  (excepto São Pedro) foram entregues ao visitante. O rei então para acabar com
  esta situação convocou um certo número de bispos italianos para julgar
  Símaco. O êxito do concílio foi que Símaco não podia ser considerado culpado
  e era necessário portanto reconhecê-lo como legítimo pastor. Os edifícios religiosos e os bens
  foram reentregues a Símaco. Os adversários de Símaco então a
  este ponto (dado que não se tinham rendido e queriam expulsar a todos os
  custos Símaco) obtiveram do rei o regresso de Lourenço. Lourenço voltou a
  Roma e aconteceram grandes tumultos. O Liber Pontificalis (a colecção
  das biografias dos bispos de Roma ‘de Pedro’ a Pio II) fala de padres e
  clérigos massacrados e mulheres queimadas. O rei Teodorico interveio
  de novo e Lourenço teve que retirar-se. Ficou portanto papa Símaco; à sua
  morte sucedeu no trono pontifício Hormisdas (514-523). Hormisdas foi seguido
  por João I (523-526). Durante o primeiro ano de pontificado de João aconteceu
  que o imperador Justino emanou um édito contra os Arianos; muitos deles por
  medo abjuraram, outros sofreram o martírio e diversas basílicas foram-lhes
  tiradas e dadas aos Católicos. Mas este édito fez indignar o rei Teodorico,
  que era também ele ariano, o qual convocou a Ravena o bispo de Roma e lhe
  ordenou ir a Constantinopola com uma embaixada composta por alguns bispos e
  quatro senadores. A missão que lhe tinha sido confiada era a de induzir
  Justino a retirar o édito contra os Arianos, restituir-lhes as suas basílicas
  e permitir aos que se tinham retratado poder voltar a professar a doutrina
  ariana. João foi a Constantinopola mas não pediu ao imperador para permitir
  aos que se tinham retratado de voltar ao arianismo; a coisa por isso não
  agradou a Teodorico que quando os componentes da embaixada voltaram a Ravena
  os mandou todos prender. João morreu assim na prisão.   | 
 
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   O imperador Justiniano (527-565) contribuiu
  para reforçar o primado de Roma porque afirmou que o papa de Roma é o
  primeiro de todos os sacerdotes. ‘Ordenamos, após a definição de quatro
  concílios, que o santíssimo papa da velha Roma seja o primeiro dos bispos, e
  que o altíssimo arcebispo de Constantinopola, que é a nova Roma, seja o
  segundo’. Este imperador emanou leis contra os heréticos. Foram por ele
  perseguidos tanto os Montanistas [32]
  como os Arianos. Também este imperador se imiscuiu nas coisas espirituais da
  Igreja de facto condenou com um édito os ‘Três capítulos’ [33] e depois em 553 fez convocar em
  Constantinopola um concílio para condená-los. E obrigou o então bispo de Roma
  Vigílio (537-555) a aceitar a decisão do concílio que Vigílio num primeiro
  momento tinha considerado nula. Ainda uma vez se pode ver com que
  desenvoltura os imperadores naquele tempo obrigavam os bispos a aceitar as
  suas opiniões em matéria de fé. Mas vejamos como se tinha tornado papa este
  Vigílio. Vigílio, diácono de nobre família, tornou-se papa - por quanto nos é
  dito - comprando o cargo e mandando matar o papa precedente Silvério
  (536-537). Este tinha sido feito papa pelo rei godo Teodato em 536. Pouco
  depois Teodato morreu e tomou o seu lugar o rei Vitige que pensou retirar-se
  com o grosso do exército para Ravena para preparar uma ofensiva contra
  Belisário, general bizantino, que já se encontrava em Nápoles. Belisário
  entrava portanto em Roma e as tropas godas saíam. E o papa se aliou com Belisário.
  Em março de 537 porém o rei godo voltou para tentar a reconquista da cidade e
  pôs sob assédio Roma. Então aconteceu que Vigílio deu dinheiro ao general
  bizantino Belisário para que depusesse pela força o papa Silvério e
  consagrasse ele como novo papa. Silvério foi assim deposto (a acusação era
  que ele tinha traido Belisário invocando a ajuda do rei godo para que
  libertasse Roma dos Bizantinos) e relegado ao estado de simples monge em
  Patara na Lícia, enquanto Vigílio foi consagrado papa pelo Senado e pelo
  clero aterrorizado por Belisário. A sua consagração teve lugar a 29 de Março
  de 537. Mas Silvério encontrou em Patara quem o defendia; era o bispo de
  Patara que obteve assim do imperador Justiniano que Silvério fosse reenviado
  a Roma para ser ali de novo julgado (como dissemos, de facto tinha sido
  acusado e condenado por traição para com Belisário). Mas Belisário, induzido
  por Vigílio, deportou Silvério para a ilha de Palmaria (Pôncia) debaixo da
  vigilância de dois mensageiros de Vigílio; e dado que Vigílio para ser
  reconhecido papa legítimo por todo o clero precisava que Silvério morresse,
  acelarou a sua morte privando-o de comida, em outras palavras deu ordens aos
  seus mensageiros para o fazerem morrer de fome (isto com base naquilo que diz
  o Liber Pontificalis). Ainda uma vez se pode ver ao que estavam
  prontos a recorrer os pretendentes ao trono pontifício; à corrupção e ao
  homicídio.   | 
 
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   À morte de Vigílio foi eleito papa Pelágio I
  (556-561). Deste deve ser dito que antes de se tornar papa tinha incitado
  Vigílio a resistir ao imperador Justiniano não alinhando contra os ‘Três
  capítulos’. E por esta sua posição foi posto na prisão, de onde continuou a
  defender os ‘Três capítulos’ opondo-se ao édito de Justiniano e à decisão do
  concílio de 553 e acusando Vigílio de ser volúvel e venal. Mas uma vez morto
  Vigílio e em liberdade ei-lo voltar a Roma mas com outras ideias, de facto
  condenou os ‘Três capítulos’ e aceitou o concílio de Constantinopola. Este
  volte-face explica-se com o facto de em virtude dele Pelágio ter tido o favor
  do imperador Justiniano para se tornar papa.   | 
 
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   Pelo ano de 590, em virtude dos eventos que se
  tinham sucedido até àquele tempo, os dois expoentes eclesiásticos mais
  importantes eram o bispo de Roma e o patriarca de Constantinopola. Porém
  enquanto o patriarca de Constantinopola estava sob o controlo directo do
  imperador, o bispo de Roma não o estava porque em Roma estava ele que mandava
  tanto nos assuntos religiosos como nos civis [34].
  Por volta desse ano o patriarca de Constantinopola que era João dito o
  jejuador, se auto-definiu ‘bispo universal’; mas Gregório dito Magno, bispo
  de Roma, se indignou por causa desta sua arrogância, e escreveu-lhe uma carta
  de admoestação entre cujas palavras estão estas: ‘...Possa pois tua Santidade
  reconhecer quanto é grande o teu orgulho pretendendo um título que nenhum
  outro homem verdadeiramente pio jamais se arrogou’. Deve ser dito porém que
  Gregório Magno enquanto por um lado não queria ser chamado ‘bispo universal’
  (como não queria também que outros bispos se proclamassem tais) porque ele
  preferia ser chamado ‘servo dos servos de Deus’, por outro nos factos exerceu
  o poder papal de monarca que era. Pouco depois, em 602, o imperador Maurício
  (juntamente com os seus filhos) foi morto por Focas (de quem é dito que
  era particularmente cruel para com os seus inimigos) que tomou o lugar dele,
  e Gregório Magno enviou-lhe uma carta de congratulação na qual dizia: ‘Glória
  a Deus nos lugares excelsos (...) Ouvimos com vivo prazer que a benignidade
  de vossa piedade é chegada ao poder imperial. Os céus exultam e a terra
  festeja, e toda a cristandade até agora tristemente afligida, jubila pelas
  vossas benignas obras’ (Epist. XIII, 31). Gregório tornou-se pois
  amigo do imperador Focas; as suas relações apesar de terem durado só cerca de
  dois anos foram óptimas. Focas, em 607, para retribuir a amizade e as
  adulações que lhe dirigia o bispo de Roma reconheceu a supremacia da ‘sede
  apostólica de Pedro sobre todas as igrejas’ (caput omnium ecclesiarum)
  e proibiu ao patriarca de Constantinopola usar o título de ‘universal’ que
  desde aquele momento devia ser reservado só ao bispo de Roma, que então era
  Bonifácio III e que à diferença de Gregório Magno, e esquecendo o que o seu
  predecessor tinha declarado a tal propósito, não recusou de modo nenhum de
  fazer-se chamar ‘bispo universal’. Este reconhecimento Focas o concedeu
  porque se encontrava em polémica com o patriarca bizantino Ciríaco e quis
  desta maneira desacreditá-lo em Roma, e dado que era odiado em Bizâncio
  procurava ser amado em Roma. Era tido em tão grande honra Focas pelos Romanos
  que estes em 608 elevaram aos pés do Campidoglio uma coluna montando em cima
  uma estátua de Focas em bronze dourado, tendo na base uma inscrição em honra
  do 'clementíssimo e piíssimo imperador, triunfador perpétuo, coroado por Deus
  sempre Augusto'.  | 
 
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   Do oitavo ao décimo século  | 
 
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   No oitavo século houveram tumultos no império
  por causa das estátuas e das imagens: o bispo de Roma teve uma parte
  principal neles. Eis como correram as coisas. O imperador do Oriente Leão III
  (717-741) por volta do ano 726 emanou um édito com o qual proibia o culto das
  imagens. Este édito fez enfurecer o bispo de Roma que então era Gregório II
  (715-731) o qual excomungou o imperador declarando-o herético e atiçou o povo
  romano, os Venezianos, o rei dos Longobardos, e todos os duques Longobardos
  contra o imperador bizantino. O povo em Itália se recusou a abandonar o culto
  das imagens e se revoltou contra os soldados imperiais; e por ambos os lados
  foi derramado sangue. Também o patriarca de Constantinopola se opôs ao édito
  imperial. Em 730, o imperador do Oriente, vendo que o culto das imagens não
  tinha sido abandonado, decretou que todas as imagens fossem destruídas por
  toda a parte começando por Constantinopola. Aqui rebentou entre o povo um
  motim sangrento atiçado pelos monges que foi reprimido pela guarda imperial.
  O imperador deu a mesma ordem também ao bispo de Roma que lhe respondeu para
  primeiro aprender melhor o seu catecismo e o chamou ‘um homem tolo, imbecil,
  um ignorante, um louco, que não sabia mais distinguir entre verdade e
  mentira, pior do que um herético’. O bispo lhe escreveu também: ‘Todos os
  povos ocidentais olham com antiga devoção para aquele do qual com ostentação
  tu ameaças abater a efígie, para S. Pedro quero dizer, que os reinos do
  Ocidente honram como Deus na terra. Desiste pois do teu propósito; a tua
  raivosa violência nada pode contra Roma, contra a cidade, contra as suas
  costas ou os seus navios. A Europa inteira venera o santo príncipe dos apóstolos;
  se tu mandares destruir a sua imagem, nós nos declaramos desde agora
  inocentes do sangue que será derramado e declaramos que ele cairá
  inteiramente sobre a tua cabeça’. O imperador lhe escreveu outras vezes, mas
  o papa sustentou sempre a sua opinião e concluiu dizendo que ‘Cristo envie em
  corpo ao imperador o diabo’ (invocamus Christum, ut immittat tibi daemonem).
  Depois ele convocou um concílio em Roma no qual foi ordenado o culto das
  imagens e foram declarados heréticos e excomungados todos os que se
  opusessem. E segundo Bellarmino o bispo de Roma ordenou que os súbditos do
  imperador aqui em Itália não lhe deviam mais pagar algum tributo. Também o
  bispo sucessivo, Gregório III (731-741), permaneceu obstinado e não quis
  obedecer ao édito imperial. Convocou um concílio em Roma e excomungou os
  iconoclastas [35]. O imperador então,
  vendo a obstinação do bispo de Roma, tomou posse dos bens eclesiásticos na
  Sicília e Calábria. O imperador depois fez uma nova tentativa que foi a
  última, para obrigar o bispo a obedecer. Ele enviou em 734 a Itália uma
  frota; mas esta foi destruída por uma tempestade no mar Adriático. O que
  aconteceu neste período mostra até que ponto já se exaltavam os bispos de
  Roma e como estavam prontos a reagir às ordens imperiais quando estas se
  opunham às suas ideias (mesmo se erradas) ou aos seus interesses. Mas este
  comportamento dos bispos de Roma para com os reis se repetiria no curso dos
  séculos: haverão de facto bispos de Roma que deporão reis, desligarão os
  súbditos do juramento de fidelidade para com o seu soberano, e enviarão os
  seus exércitos ou exércitos estrangeiros contra eles para puni-los.   | 
 
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   Por volta da metade do oitavo século o papado
  se consolidou sobretudo porque o bispo de Roma conseguiu estender o seu poder
  temporal. Em 752 foi eleito pontífice romano Estevão II (752-757) o qual
  tinha à disposição um património imobiliário enorme. Este património chamado
  de São Pedro (Patrimonium Petri) compreendia muitos edifícios e vastos
  campos de terra que estavam em diversas províncias da Itália e nas regiões
  vizinhas, campos que eram cultivados por colonos e por escravos e dos quais a
  sede de Roma extraia grandes rendas. Ele tinha aumentado cada vez mais desde
  o tempo de Constantino em diante porque reis, rainhas, altos funcionários do
  Estado, e também privados tinham deixado antes de morrer os seus bens à sede
  de Roma para assegurarem a salvação eterna. Naturalmente entre as doações e
  os legados houveram os que foram voluntários e espontâneos e também os que
  foram extorquidos com a astúcia e as lisonjas. Por quanto respeita ao uso que
  deste património fazia a igreja deve ser precisado que uma parte era
  utilizado para satisfazer a glutonaria e a soberba dos bispos e dos seus
  colaboradores e uma parte era utilizado para socorrer às necessidades dos
  doentes e dos pobres e para fazer frente às diversas despesas que a igreja de
  Roma tinha que enfrentar para a manutenção das basílicas e do culto. Ora,
  Estevão estava à cabeça de um império imobiliário e o medo de cair sob o
  domínio dos Longobardos (os quais se tinham estabelecido em Itália depois do
  ano 568) que com Astolfo tinham ocupado os estados imperiais em Itália,
  conquistado Ravena e se preparavam para conquistar também Roma, o induziu a
  ir a França pedir ajuda militar a Pepino rei dos Francos. Não era a primeira
  vez, e nem foi a última, que um papa pedia ajuda militar a um soberano
  ocidental para que defendesse o seu território dos seus inimigos; de facto
  antes dele Gregório III tinha enviado ao rei dos Francos Carlos Martelo uma embaixada
  com ricos presentes a fim de obter uma ajuda militar contra os Longobardos,
  mas o rei franco tinha recusado atender o papa porque não queria renunciar à
  amizade com os Longobardos. Mas prossigamos com Estevão II. Cronistas
  históricos dizem que Estevão II se ajoelhou diante de Pepino rei dos
  Francos [36] e com lágrimas nos olhos
  lhe suplicou para ‘defender a causa de Pedro e da república romana’. Neste
  encontro o papa mostrou ao rei dos Francos a Donatio Constantini
  (documento que seria a seguir demonstrado falso) em que vinha dito que o
  imperador Constantino o Grande tinha entregado ao bispo de Roma todas as
  províncias e bairros da cidade de Roma e da Itália e das regiões ocidentais,
  e a supremacia sobre os patriarcas de Antioquia, Alexandria, Constantinopola
  e Jerusalém. E que ele, o imperador, reservava para si o Oriente com capital
  Bizâncio, para onde se mudava com o consentimento papal, não considerando
  justo que um imperador terreno exercesse a sua potestas na mesma sede
  do imperador celeste. O rei dos Francos prometeu ao papa a ‘restituição’ [37] dos territórios lhe subtraídos por Astolfo
  (como retribuição pelo favor que o seu predecessor Zacarias lhe tinha feito)
  e por ter tomado este compromisso foi nomeado por Estevão patricius
  Romanorum ou seja ‘patrício dos romanos’. Em 755 Pepino para manter o seu
  solene juramento desceu a Itália e assediou Astolfo em Pavia, capital dos
  Longobardos. Astolfo então prometeu com juramento ‘restituir’ ao papa o
  Exarcado de Ravena, a Pentápole e os territórios pontifícios ocupados. Mas
  logo que Pepino partiu de volta para França, Astolfo não manteve a promessa,
  antes foi e assediou Roma. Então o papa angustiado escreveu (imaginando ser o
  apóstolo Pedro em pessoa) ao rei dos Francos invocando a ajuda dele, e ameaçando-lhe
  a privação da vida eterna no caso de ele se recusar a socorrê-lo: ‘Se, embora
  nós não o acreditemos, vos fizerdes culpado de demoras ou alegardes
  pretextos, e não obedecerdes com solicitude ao nosso aviso de libertar esta
  cidade, o povo que nela mora, a Igreja apostólica nos entregue por Deus e o
  seu sumo sacerdote, sabei que por querer da Santíssima Trindade, em virtude
  da graça do apostolado nos concedido por nosso Senhor, sereis privado, por
  ter desobedecido às nossas intimações, do reino de Deus e da vida eterna’.
  Pepino então desceu de novo a Itália contra os Longobardos, arrancou-lhes os
  territórios que iam de Roma a Ravena e os concedeu em doação ao papa como uma
  possessão eterna [38]. Esta concessão,
  ocorrida em 756, marcou o nascimento do Estado pontifício [39] que duraria até 1870.  | 
 
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   Em 795 tornou-se papa Leão III que contribuiu
  para aumentar o prestígio do bispo de Roma coroando, no ano 800, Carlos Magno
  como Imperador do chamado sacro império romano. Carlos Magno confirmou a
  doação feita ao papa por Pepino em 756, e segundo alguns acrescentou mais
  territórios a ela.  | 
 
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   Por volta da metade do nono século nos dizem os
  documentos católicos, sob Leão IV (847-855), um grupo de falsificadores
  papistas produziu as falsas decretais, uma colecção de decretos de um certo
  número de papas (de Clemente I a Gregório II) e de concílios sobre pontos
  doutrinais e de disciplina que tinham como objectivo o de engrandecer e
  sustentar a autoridade papal. Destas decretais resultava que o papa tem a
  supremacia sobre todos os bispos, que os bispos postos sob acusação têm o
  direito de apelarem ao papa, que o papa tem o ‘pleno poder’ sobre a Igreja,
  que a igreja de Roma, com base num único privilégio, tem o direito de abrir e
  fechar as portas do paraíso a quem ela quer. Estas decretais, deste período
  em diante, serviram aos papas para reivindicar a sua suprema autoridade sobre
  a Igreja universal. Elas contribuiram muito para o reforço do poder papal
  durante a idade média.  | 
 
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   Em 896 torna-se papa Estevão VI (896-897). Este
  papa foi definido pelo cardeal Barônio ‘um intruso’. Ele fez desenterrar o
  cadáver do seu predecessor Formoso (891-896), o vestiu com as suas vestes
  pontificais, e o levou perante uma assembleia de cardeais, bispos e padres, e
  o pôs sentado para julgá-lo. Estevão começou então a acusar aquele cadáver de
  muitos delitos [40] e o incitava a
  responder em sua defesa. Mas como aquele morto não podia responder respondia
  um outro no seu lugar. No fim foi julgado culpado, foram-lhe cortados da sua
  mão direita três dedos, o polegar, o indicador e o médio, com os quais o papa
  costuma abençoar, foi despido das suas vestes e depois de ter sido arrastado
  pelas ruas de Roma foi lançado no Tibre por ordem de Estevão VI. Este papa
  foi depois preso por uma parte do povo romano e lançado na prisão onde
  segundo alguns foi depois estrangulado.  | 
 
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   À morte de Estevão foi eleito papa Romano (897)
  o qual foi papa por cerca de três meses durante os quais anulou os decretos
  de Estevão e reabilitou a memória de Formoso. Platina (católico) diz deste
  comportamento de Romano: ‘Esses papudos (pontificuli) não
  pensavam em mais nada senão em destruir e em desaprovar o que tinham feito os
  seus predecessores; o que é demonstração de pequena mente e de mau coração’.
  A Romano sucede Teodoro II (897), o qual viveu apenas poucos dias. Depois de
  Teodoro foi eleito papa Sérgio mas o partido contrário pegou em armas,
  expulsou Sérgio que se retirou para casa de Marózia, filha de Teodora I
  mulher de Teofilato, e fez papa João IX (898-900) que pensou também ele em
  reabilitar a memória de Formoso. A João sucede Bento IV o qual viveu poucos
  anos (900-903) [41]. A este sucede
  Leão V (903) o qual poucos dias depois da sua eleição foi lançado na prisão e
  ali morto pelo padre Cristóvão que se proclamou papa. Mas isto desagradou a
  Sérgio que fez prender Cristóvão e encerrar na prisão onde foi morto, e se
  declarou papa. Sérgio torna-se papa com a ajuda da poderosa família
  Teofilato, cujas duas filhas Teodora II e Marózia com as suas intrigas
  dominariam o papado por muitos anos de tal maneira a fazer nomear este
  período do papado a época do regime das prostitutas. Marózia era a amante de
  Sérgio e lhe tinha dado um filho que seria feito depois papa com o nome de
  João XI. O cardeal Barônio, de Sérgio III (904-911) [42] disse que não havia delito, por mais infame
  que fosse, de que não tivesse sido manchado papa Sérgio, que era escravo de
  todos os vícios, e o mais perverso de todos os homens [43]. Sérgio III foi seguido no trono pontifício
  primeiro por Anastácio III (911-913) e depois por Lando (913-914). Depois foi
  a vez de João X (914-928) que foi posto no trono pela família Teofilato.
  Durante o seu pontificado Marózia e Alberico (com quem ela se tinha casado)
  seu marido foram como que patrões dele. Ficando viúva de Alberico, Marózia se
  casou com Guido marquês de Toscana; depois por ordem sua João X foi lançado
  na prisão onde foi depois morto sufocado com uma almofada. Enquanto João
  desfalecia na prisão Marózia fez papa Leão VI (928) que vive apenas poucos
  meses. Morto este outro papa Marózia fez papa Estevão VII (928-931). À sua
  morte ela pôs sobre o trono papal seu filho João XI (931-935) a propósito do
  qual Barônio diz: ‘A santa Igreja, isto é, a romana, teve que vilmente ser
  pisada por um tal monstro’. Entretanto morria o segundo marido de Marózia, e
  logo ela pensou casar-se com Hugo rei de Itália. Mas havia um problema; Hugo
  era o cunhado de Marózia e as leis canónicas não permitiam tais uniões. Mas a
  dificuldade foi superada por João XI que concedeu a permissão para o
  matrimónio. E assim Marózia se casou com Hugo; a cerimónia nupcial aconteceu
  em Castel Sant’Angelo na presença de João XI. Mas a cerimónia foi seguida por
  um facto que marcou o fim de Marózia. Hugo se pôs a ofender Alberico II, o
  filho de Marózia e de Alberico de Camerino. Alberico que já não via bem
  aquele novo matrimónio de sua mãe saiu dali para fora e incitou o povo contra
  o rei Hugo. O povo então tomou de assalto o castelo e o rei fugiu. Alberico
  II então mandou lançar na prisão sua mãe e pôr sob apertada vigilância o seu
  meio-irmão João XI. Foi feito papa então Leão VII (936-939) a quem sucedeu
  Estevão VIII (939-942). Morto este Alberico fez papa Marino II (942-946). A
  Marino sucede Agapito II (946-955). Morto este torna-se papa João XII
  (955-964). Não tinha ainda vinte anos quando foi feito papa, e demonstrou uma
  conduta escandalosa porque era dado aos prazeres da carne e brutalmente
  violento. É afirmado que o Latrão durante o seu pontificado tornou-se um
  covil de prostitutas. Em 960 ofereceu a coroa imperial a Otto que aceitou com
  todo o gosto prometendo que defenderia os patrimónios da igreja. E assim a 2
  de Fevereiro de 962 Otto foi coroado junto com sua mulher. À coroação
  seguiu-se um pacto chamado Privilegium Ottonianum mediante o qual Otto
  confirmava a João XII e aos seus sucessores todos os direitos e patrimónios
  da igreja, e João por seu lado prestava juramento de fidelidade ao imperador
  prometendo que nunca o trairia. Também a nobreza e o povo romano fizeram o
  seu juramento de fidelidade. Mas logo que Otto partiu João lançou para trás
  das costas o juramento feito e se aliou com Berengário. Otto sabendo-o
  acorreu a Roma, mas João recolheu os tesouros da igreja e fugiu dele primeiro
  para Tivoli e depois para a Córsega. Entretanto Otto tomava posse da cidade.
  Poucos dias depois o imperador convocou um concílio para julgar João por
  causa dos delitos de que era acusado. João sabendo-o fez saber que declarava
  nulo aquele concílio. João foi julgado culpado e no seu lugar Otto pôs um
  outro papa de nome Leão VIII (963-965). Entretanto João desde Córsega
  fomentava revoltas, a primeira foi sufocada em sangue por Otto (foi uma
  verdadeira e própria chacina), a segunda, rebentada após a partida de Otto
  pôs em fuga Leão VIII enquanto João voltava a Roma pronto a vingar-se. João
  fez convocar um concílio em que declarou nulo o anterior concílio e depôs
  Leão VIII. João se vingou dos seus adversários cortando-lhes o nariz e a
  língua. Otto então decidiu acabar com João e se pôs em marcha para Roma, mas
  durante a viagem lhe chegou a notícia que João tinha morrido. Tinha sido
  assassinado por um marido que o tinha surpreendido em flagrante adultério com
  a sua mulher. O teria lançado pela janela fora. O cardeal Bellarmino deste
  papa afirmou que foi quase o mais iníquo dos papas. Mas antes que Otto
  pudesse chegar a Roma o povo romano, não reconhecendo Leão VIII, quis eleger
  um novo papa de nome Bento V (964-965). Chegando a Roma, o imperador a
  assediou e a tomou pela fome. Depois Otto fez convocar um concílio que depôs
  Bento V. Neste concílio em que presidia Leão VIII, Bento V foi acusado de ter
  usurpado o trono papal. Bento reconheceu a sua culpa dizendo: ‘Se pequei,
  tende piedade de mim’, e depois se lançou aos pés do papa e do imperador
  declarando ser antipapa e verdadeiro papa Leão VIII. Mas enquanto Otto estava
  comovido, Leão estava antes enfurecido contra ele. Para comprazer ao
  imperador que intercedia por ele lhe impôs o exílio. Assim Otto o levou para
  a Alemanha onde morreu. Ficou papa Leão VIII que morreu em 965. Os romanos
  então enviaram uma embaixada a Otto para pedir-lhe um papa; foi por ele
  escolhido João, bispo de Narni, que tomou o nome de João XIII (965-972). Mas
  este não era bem visto pelo povo romano pelo que pouco tempo depois da sua
  eleição houve uma revolta contra ele, mas o papa conseguiu fugir indo-se pôr
  debaixo da protecção do conde Pandolfo de Capua. Algum tempo depois João XIII
  voltava a Roma com uma escolta de soldados capuanos, seguido dali a pouco por
  Otto o qual chegando a Roma a saqueou e puniu os revoltosos enforcando alguns
  e cegando outros. Morto João, o imperador fez eleger Bento VI (973-974). Mas
  o povo se revoltou também contra ele, o lançou na prisão e fizeram papa
  Bonifácio VII. Bento foi depois estrangulado na prisão (alguns dizem que foi
  por mão do próprio Bonifácio). Mas eis que a um certo ponto Bonifácio teve
  que fugir de Roma, e não o fez de mãos vazias porque levou muitos tesouros da
  igreja, e se refugiou em Constantinopola. Entretanto, tendo ficado vazia a sede,
  o imperador fez eleger papa Bento VII (974-983). Morto Bento foi feito papa
  João XIV (983-984). Mas eis reaparecer Bonifácio VII o qual reentrando em
  Roma vai de novo ocupar o trono pontifício e encerra na prisão João XIV onde
  depois o fará morrer envenenado. Mas Bonifácio cerca de um ano depois será
  preso e assassinado pelos seus inimigos. O seu cadáver arrastado pelas ruas
  de Roma foi lançado aos pés da estátua equestre de Marco Aurélio. O papa
  sucessivo foi João XV (985-996) que se distinguiu pelo seu forte nepotismo e
  por ter sido o primeiro a canonizar santo alguém. Morto também este o
  imperador fez papa seu primo (ou sobrinho segundo outros) Bruno que tomou o
  nome de Gregório V (996-999). Mas logo que Otto partiu de Itália houve uma
  revolta que obrigou Gregório a fugir de Roma. No seu lugar o povo elegeu o
  papa João XVI mas dali a pouco eis reentrar em Roma Otto, que tinha sido
  chamado por seu primo, e vingar-se dos que se tinham revoltado contra
  Gregório. João XVI foi preso e por ordem de Otto lhe foram cortados o nariz e
  a língua e arrancados os olhos e lançado a sangrar numa cela de um mosteiro
  romano. Mas Gregório V não contente pegou o moribundo e pondo-o ao contrário
  na garupa de um burro o fez percorrer as estradas de Roma para que fosse insultado
  pelo povo. O chefe da revolta foi decapitado. A Gregório sucedeu Silvestre II
  (999-1003). Os cronistas do décimo primeiro e décimo segundo século
  dizem deste que ele tornou-se papa graças a um pacto com o demónio ao qual
  tinha vendido a sua própria alma. É recordado por diversos cronistas e
  historiadores medievais como o papa mago porque tinha aprendido magia,
  astrologia, necromancia e todas as ‘ciências’ proibidas a um cristão.   | 
 
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   Eis pois alguns episódios da história do papado
  do décimo século; o século de ferro e de densas trevas para o papado como os
  próprios historiadores católicos reconhecem. Papas libertinos, homicidas,
  ávidos de ganho desonesto, elevados e depostos por imperadores, por
  mulheres intrigantes levando a vida na luxúria e na cobiça. Por vezes
  depois haviam dois deles, e outras vezes três papas ao mesmo tempo dos quais
  os historiadores católicos não conseguem dizer com certeza quem era o
  verdadeiro papa e quem eram os antipapas porque cada um tem a sua opinião.
  Diante destes factos históricos não se percebe pois como os teólogos papistas
  podem demonstrar a sua sucessão apostólica mas sobretudo como aqueles
  perversos podem ter sido servos de Deus constituídos para a edificação da sua
  Igreja.  | 
 
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   Do décimo primeiro ao décimo
  terceiro século  | 
 
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   Saltemos alguns anos para chegar a Bento IX
  (1032-1044) porque este é o único papa a ter reinado três vezes! Este
  torna-se papa segundo alguns na idade de cerca de onze anos. Durante o seu
  pontificado se abandonou a toda espécie de iniquidade. Pier Damiani (prelado
  católico) disse dele: ‘Aquele miserável chafurdou na imoralidade do início do
  seu pontificado até ao fim dos seus dias’. E um outro observador escreveu: ‘A
  Cátedra de Pedro foi ocupada por um diabo do inferno disfarçado de padre’.
  Desidério de Montecassino, o futuro papa Vitor III, nos seus Diálogos
  escreve de Bento: ‘...um certo Bento (pelo nome e não de certeza pelas obras)
  filho do cônsul Alberico, seguindo as pisadas de Simão Mago em vez das de
  Simão Pedro, prodigalizado pelo pai não pouco dinheiro entre o povo, se
  arrogou o sumo sacerdócio. Qual tenha sido a vida dele após a ascensão ao
  sólio, como torpe, como indecente, cruel e execranda não posso contar sem
  horrorizar’. As extorsões, os
  roubos, as violências e as matanças de Bento IX irritaram a tal ponto os
  romanos que o expulsaram de Roma. Mas este apoiado pelo imperador
  Corrado que estava então em Itália conseguiu reentrar em Roma. Mas os
  Romanos, ainda porque estavam cansados de suportar Bento IX, o expulsaram de
  novo e elegeram papa Silvestre III. Mas Bento IX não se deu por vencido e
  apoiado pelos seus parentes conseguiu retomar o trono papal (1045), obrigando
  Silvestre III (que foi reconhecido por alguns como verdadeiro papa enquanto
  por outros um antipapa) a ir embora. No fim Bento IX decide demitir-se
  vendendo o cargo que ocupava ao arcipreste romano João Graciano que
  torna-se papa com o nome de Gregório VI. Bento se retirou para a casa
  paterna; mas depois de um pouco de tempo voltou ao assalto do trono papal com
  armas e a sediar-se em Roma como papa. Eis pois três papas reinar ao
  mesmo tempo e a dizerem-se todos, os três, os sucessores de Pedro! Mas o
  imperador Henrique III quis pôr fim a este escândalo e desceu a Itália com o
  seu exército para pôr as coisas em ordem. Ele convocou um concílio em Sutri,
  concílio que decretou a deposição de Silvestre III e de Gregório VI. Poucos
  dias depois o imperador fez convocar um concílio em Roma e declarar deposto
  Bento IX e eleger papa Clemente II (1046-1047). Este morreu poucos meses
  depois (é afirmado que foi envenenado por Bento IX); sucede então que Bento
  IX, vendo que o imperador tinha partido, retomou o papado pela enésima vez
  (isso aconteceu em 1047, mas isso não agradou aos romanos). Mas o imperador
  Henrique III expulsou Bento IX de Roma, e fez subir ao trono papal Poppo,
  bispo de Bressanone, que tomou o nome de Dámaso II (1048) que porém morreu
  muito cedo, após 23 dias do seu assentamento sobre o trono papal (também
  desta vez é afirmado por obra do veneno de Bento IX).  | 
 
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   Passemos agora a falar de Gregório VII
  (1073-1085) porque sob este papa o poder temporal sofreu um ulterior
  potenciamento. Mas antes de começar a falar de Gregório VII é bom ter
  presente que em 1054 houve um cisma entre a igreja católica romana e a igreja
  greco-ortodoxa. Antes desse ano tinham havido diversas disputas entre a
  Igreja do Ocidente e a do Oriente. Aquela sobre a data da Páscoa em que os
  Ocidentais diziam que era necessário festejá-la no Domingo mais próximo do
  dia catorze do mês de Nisan, enquanto os Orientais diziam que era necessário
  festejar a festa no dia décimo quarto do mês de Nisan, qualquer que fosse o
  dia em que calhasse. A disputa sobre o celibato; a Igreja do Ocidente o tinha
  proibido aos diáconos, aos padres e aos bispos; enquanto a Igreja do Oriente
  tinha permitido aos diáconos e aos padres manter a sua mulher depois da
  ordenação, proibindo o matrimónio aos bispos. A disputa sobre a barba na qual
  os eclesiásticos ocidentais podiam cortar a barba enquanto os orientais
  deviam ter barba. Mas a disputa que fez chegar as coisas à rotura foi aquela
  sobre a eucaristia. O patriarca de Constantinopola Miguel Cerulário
  (1043-1048) tinha condenado a Igreja do Ocidente pelo uso do pão não levedado
  na Eucaristia e tinha ordenado o encerramento dos mosteiros e das basílicas
  latinas de Constantinopola. Para pôr fim à disputa Leão IX enviou ao Oriente
  o cardeal Humberto com outros dois legados mas as discussões chegaram a tal
  ponto que em 16 de Junho de 1054 os legados romanos puseram sobre o altar da
  catedral de Santa Sofia um decreto de excomunhão contra o patriarca e os seus
  seguidores. Por sua vez também o patriarca de Constantinopola excomungou o
  papa e os seus seguidores. Estas
  excomunhões serão depois por ambas as partes retiradas em 1965 no tempo de
  Paulo VI. Permanece porém o facto de a igreja oriental continuar a não
  reconhecer o primado do papa sobre a Igreja universal e a ter divergências
  doutrinais com a igreja do Ocidente.   | 
 
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   Mas prossigamos com a história do papado
  falando de Gregório VII. Este tornou-se papa em 1073; ele considerava que só
  o bispo de Roma devia ser chamado bispo universal, que o papa como vigário de
  Deus na terra devia exercer não só o poder espiritual mas também o temporal,
  que a igreja não devia estar submissa ao poder civil antes o devia controlar,
  e que o papa tinha o poder de depôr os soberanos e de desligar os súbditos da
  obrigação de fidelidade aos seus príncipes. Estes seus princípios os expôs no
  Dictatus papae: eis algumas proposições deste documento: ‘Só o
  pontífice Romano tem o direito de ser chamado universal (...) O papa é a
  única pessoa a quem os príncipes devem beijar o pé (..) O seu nome é único no
  mundo. Só a ele é lícito depôr os imperadores (...) A sua sentença não pode
  ser anulada por alguém, mas ele pode anular as de todos os outros (...) Ele
  não pode ser julgado por ninguém (...) O papa pode desligar os súbditos do
  juramento de fidelidade feito aos soberanos indignos’ (Dictatus Papae;
  citado por Fausto Salvoni em Da Pietro al Papato, pag. 305-306).
  Gregório durante o seu pontificado procurou suprimir o matrimónio dos
  eclesiásticos ordenando aos sacerdotes casados que demitissem as suas
  mulheres [44], e se bateu também
  contra a investidura dos eclesiásticos por parte dos leigos e contra a
  simonia. Ele por isso se desencontrou com o rei Henrique IV que concedia
  investiduras após compensação em dinheiro. Além de conceder investiduras após
  remuneração Henrique IV se intrometeu nos assuntos internos do clero
  italiano, o que fez indignar mais o papa que o convidou a comparecer em Roma
  para desculpar-se sob pena de excomunhão. Henrique lhe respondeu convocando
  no início de 1076 um concílio em Worms que declarou papa ilegítimo Gregório.
  Gregório então lhe lançou a excomunhão libertando os seus súbditos da
  obrigação de fidelidade para com ele. Esta foi a decisão mais audaz tomada
  até então por um papa contra um soberano. Henrique então, temendo perder o
  reino porque havia o perigo de uma guerra civil, atravessou os Alpes e foi ao
  castelo de Canossa (no Appennino emiliano) onde se encontrava naqueles
  dias o papa. Chegando ao castelo em Janeiro de 1077 ele se humilhou diante do
  papa pedindo-lhe perdão (o papa não o fará entrar logo no castelo mas o fará
  estar três dias e três noites debaixo da neve, ao frio). E o papa por este
  seu acto de humilhação o libertou da excomunhão. Mas regressado à pátria Henrique IV atraiu de
  novo as iras de Gregório que o excomungou de novo. Henrique então
  invadiu a Itália e pôs sobre o trono um novo pontífice de nome Guiberto
  (1084) que tomou o nome de Clemente III. Gregório então se refugiou em Castel
  Sant’Angelo. Aconteceu então que Gregório chamou em sua ajuda os Normandos
  que vieram a Roma encontrando-a indefesa porque Henrique IV se tinha ido
  embora poucos dias antes porque considerava não poder enfrentar com o seu
  exército as forças dos Normandos. E os Normandos se dedicaram à violência
  contra a população de Roma exterminando milhares de pessoas, violando muitas
  mulheres, e saqueando as casas e incendiando-as. Depois que os Normandos
  devastaram Roma, Gregório teve que sair da cidade por causa da fúria dos
  sobreviventes (e com ele foram as tropas normandas), e assim ficou no trono
  pontifício Clemente III (que é definido porém antipapa). Gregório fugiu para
  Salerno onde morreu em 1085. As suas últimas palavras teriam sido: ‘Amei a
  justiça e odiei a iniquidade, por isso morro no exílio’ [45]. Gregório VII foi canonizado santo.  | 
 
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   Depois da sua morte em 1086 foi eleito papa
  Desidério, abade de Montecassino, que tomou o nome de Vítor III. Os
  historiadores dizem que ele era privado do espírito de pontífice que os
  tempos exigiam porque não tinha o espírito de guerreiro como o tinha tido o
  seu imediato predecessor. Morreu em 1087.  | 
 
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   A Vítor sucedeu Urbano II (1088-1099) cujo nome
  está ligado à primeira cruzada contra os Turcos. Reunido um concílio em
  Clermont em 1095 Urbano II exortou o povo que se dizia cristão a partir
  armado em direcção à Palestina para ir libertar os lugares sagrados das mãos
  dos Turcos. Em troca ele ofereceu uma indulgência plenária pelos pecados. Ao
  cruzado eram também concedidas imunidades de taxas e impostos. O povo cegado
  pelas trevas se pôs a caminho para a Palestina ao grito de: ‘Deus o quer!’.
  Os cruzados durante a viagem se deram a violências, prepotências e a
  exterminar também muitos Hebreus (cronistas históricos dizem milhares)
  considerados infiéis a exterminar a par dos Turcos. Chegados a Jerusalém
  conquistaram a cidade massacrando também ali muitas pessoas; e tudo isto com
  a benção papal.  | 
 
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   Eugénio III (1145-1153) foi o papa que convocou
  a segunda cruzada contra os Muçulmanos que teve lugar em 1147, mas esta
  cruzada se demonstrou um insucesso.  | 
 
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   Clemente
  III (1187-1191) proclamou solenemente em 1188 a terceira cruzada que não
  conseguiu reconquistar Jerusalém das mãos de Saladino. Ricardo de
  Inglaterra (o rei que chegou à Palestina como chefe dos cruzados) porém
  obteve de Saladino que fosse permitido aos peregrinos o acesso a Jerusalém.  | 
 
| 
   Passemos agora a Inocêncio III (1198-1216) o
  papa que juntamente com Gregório VII mais contribuiu dentre todos para
  reforçar o papado naquele tempo. Inocêncio III foi eleito papa em 1198.
  Segundo ele o papa era superior ao rei em virtude da autoridade recebida de
  Deus, e por isso tinha o poder de excomungar os reis e de depô-los. Para
  ilustrar este conceito usava-se de uma semelhança toda particular; dizia que
  Deus tinha posto dois luminares no firmamento para iluminar o dia e a noite,
  e estes eram o sol, o luminar maior, e a lua o luminar menor. O sol era a
  autoridade pontifícia enquanto a lua era a autoridade legal. ‘Por isso a lua
  recebe a sua luz do sol, e é portanto inferior ao sol tanto na grandeza como
  no calor, tanto na sua posição como nos seus efeitos. Do mesmo modo o poder
  régio deriva a sua dignidade da autoridade pontifícia e quanto menos se
  subpõe a ela, tanto menor luz recebe dela. Mas quanto mais lhe se submete,
  tanto mais aumenta o seu fulgor’ (citado por Fausto Salvoni in op. cit.,
  pag. 310). Para sustentar a sua autoridade absoluta sobre os reinos da terra,
  Inocêncio fez uso também das seguintes palavras que Deus dirigiu ao profeta
  Jeremias: "Ponho-te neste dia sobre as nações, e sobre os reinos, para
  arrancares, e para derrubares, para destruíres, e para arruinares; e também
  para edificares e para plantares" (Jer. 1:10). De facto Inocêncio III
  causou muitas turbulências em vários estados; em 1200 ele pôs sob interdito a
  França quando Filipe se recusou a deixar a sua segunda mulher Agnese e de
  retomar a sua legítima mulher Ingeborg. Este interdito do papa provocou um
  tumulto em França pelo que Filipe se submeteu ao papa, e de má vontade mandou
  embora Agnese e retomou consigo Ingeborg. Entre 1205 e 1213 Inocêncio III se
  desencontrou com João de Inglaterra porque este último não tinha
  querido reconhecer o arcebispo que Inocêncio tinha nomeado para a sede
  vacante de Canterbury. Inocêncio o excomungou e pôs também a Inglaterra sob
  interdito. Os seus súbditos então se opuseram ao rei o qual foi obrigado a
  humilhar-se diante de Inocêncio [46].
  Em 1213 João declarou que desde então em diante ele e os seus súbditos
  considerariam os seus domínios feudais papais e pagariam todos os anos mil
  marcos ao papa. Eis como Inocêncio III conseguiu humilhar os dois mais
  poderosos soberanos daquele tempo fazendo alavanca no seu poder temporal. Mas
  Inocêncio III além de tudo isto promoveu a cruzada contra os Albigenses no
  sul da França exterminando, segundo dizem os historiadores, dezenas de
  milhares deles. Segundo Inocêncio também os heréticos se deviam dobrar diante
  do papa, e a heresia devia ser extirpada com a força. Também Gregório IX
  (1227-1241) reprimirá os heréticos como tinha feito Inocêncio; ele de facto
  instituirá na Europa entre 1231 e 1234 os tribunais da Inquisição, confiando
  a direcção deles aos Dominicanos (vede a parte onde falei da Inquisição).  | 
 
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   O poder temporal dos papas sofreu um declínio
  sob Bonifácio VIII eleito papa em 1294. Durante o seu pontificado aconteceu
  que Filipe de França e Eduardo I de Inglaterra impuseram ao clero uma taxa
  para sustentar as despesas militares que eles estavam sustentando na guerra
  que os opunha um ao outro. Bonifácio então emanou a bula Clericis Laicos
  com a qual proibia aos leigos, sob a ameaça de excomunhão e interdito, impor
  qualquer taxa e imposto aos eclesiásticos sem o consentimento da igreja de
  Roma, e proibia aos padres, sob pena de excomunhão por parte da igreja
  romana, de pagar tais contributos a um chefe temporal. Eduardo reagiu
  declarando fora da lei o clero e fazendo aprovar pelo parlamento uma lei que
  proibia a ele de dar ouvidos às pretensões papais de autoridade temporal em
  Inglaterra. E Filipe reagiu proibindo as exportações de dinheiro da França
  para Itália, privando assim o papado das suas rendas francesas. Então
  Bonifácio se encontrou em grande dificuldade e decidiu chegar a uma
  acomodação da lei emanada na Clericis Laicos, autorizou portanto
  Filipe a cobrar os impostos do clero em caso de extrema necessidade, mesmo
  sem consulta papal. O rei por sua parte revogou as disposições contra o
  papado. E assim foi restabelecida a paz entre o rei de França e o papa.
  Bonifácio era um papa sedento do sangue dos seus inimigos de facto mandou
  destruir em 1299 a cidade de Palestrina, em mão dos Colonna seus inimigos (os
  cardeais Colonna afirmavam abertamente que a sua eleição era ilegítima), exterminando,
  segundo os cronistas, alguns milhares de pessoas. Ele era também
  sedento de dinheiro; sede que o levou a inventar o Jubileu (que se realizou
  em 1300) que segundo as estimativas dos cronistas levou a Roma
  centenas de milhar de peregrinos que naturalmente o enriqueceram notavelmente
  e aumentaram o seu prestígio. As relações entre Filipe e Bonifácio voltaram
  de novo a não ser boas quando em 1301 Filipe mandou prender um legado
  pontifício por traição contra o rei. O papa ordenou a Filipe soltá-lo, mas
  Filipe se opôs à ordem de Bonifácio. Então o papa emanou em 1302 a bula Unam
  Sanctam na qual sustentava que fora da igreja romana não havia salvação e
  nem remissão dos pecados e que o papa tinha autoridade espiritual e temporal
  sobre todos e que para ser salvo era necessário estar sujeito ao pontífice
  romano. Filipe reagiu violentamente à bula papal, e dado que em França
  estavam presentes junto do rei os cardeais Colonna (que excomungados e
  expulsos por Bonifácio se tinham refugiado junto de Filipe) que acusavam o
  papa dizendo que era ilegítimo, herético e simoníaco, ele aproveitou a
  ocasião para ordenar a Guilherme de Nogaret ir prender o papa e conduzi-lo a
  Paris onde seria depois processado. Nogaret chegando a Itália organizou junto
  com a família dos Colonna (inimiga acérrima de Bonifácio) uma conjura contra
  o papa que se encontrava então em Anagni. Entrando na cidade assaltaram o
  palácio pontifício; o papa foi preso, mas após três dias de prisão os
  habitantes de Anagni se revoltaram contra os conjurados expulsando-os e
  libertando Bonifácio. Regressado a Roma morreu em 1303. Dele foi dito por
  historiadores católicos que ‘entrou no pontificado como uma raposa, reinou à
  leão e morreu como um cão’.   | 
 
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   Do décimo quarto ao décimo sexto
  século  | 
 
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   A Bonifácio VIII sucedeu Bento XI (1303-1304),
  e depois Clemente V (1305-1314) que em 1309 transferiu a corte papal para
  Avignon, onde estava sob o directo controlo do rei de França. Iniciou assim
  aquilo que foi definido o cativeiro de Avignon que durou até 1377 quando Gregório
  XI levou novamente a sede papal para Roma. O poeta Petrarca, durante a sua
  permanência em Avignon, descreveu a corte papal como ‘a vergonha do género
  humano, um receptáculo de vícios, uma cloaca onde se recolhe toda a imundícia
  do mundo. Lá se despreza Deus e se adora somente o dinheiro, e se espezinham
  as leis humanas e divinas’. Depois que morreu Gregório XI (1378) houve um
  período de tempo em que houveram dois papas, Urbano VI e Clemente VII que se
  diziam ambos o legítimo papa e o verdadeiro sucessor de Pedro. Urbano VI
  estava em Roma enquanto Clemente VII levou a capital para Avignon pela
  segunda vez. Aconteceu assim que algumas nações reconheceram como verdadeiro
  papa o primeiro enquanto outras o segundo. O cisma se prolongou até ao início
  do século sucessivo quando se reuniu o concílio de Pisa (1409) que declarou
  ilegítimo o então papa de Avignon Bento XIII e o de Roma Gregório XII (eles
  foram declarados decaídos do seu cargo pontifício como cismáticos e excluídos
  da comunhão da Igreja), e elegeu papa Alexandre V. Mas como as decisões do
  concílio de Pisa não tiveram uma aprovação geral aconteceu que passou haver
  não mais dois papas, mas três papas que reivindicavam a autoridade suprema
  sobre a Igreja e excomungavam solenemente os outros dois. Cada um deles tinha
  os seus apoiantes a nível internacional; Gregório XII tinha pela sua parte a
  Itália, a Alemanha e o norte da Europa; Bento XIII tinha a Espanha, a
  Escócia, a Sardenha, a Córsega e parte da França; Alexandre V a maior parte
  da França e numerosas ordens religiosas.   | 
 
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   Morto Alexandre V (1410) lhe sucedeu João XXIII
  que foi deposto pelo concílio de Constança (1415-1418) juntamente com Bento
  XIII; Gregório XII ao invés abdicou. No seu lugar foi eleito papa Martinho V.
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   Durante o período que vai do início do chamado
  cativeiro de Avignon ao concílio de Constança a corte papal foi sobremaneira
  corrupta, os papas se abandonavam a toda a dissolução, à impureza e se faziam
  culpados de toda espécie de delitos, e não obstante tudo isso se proclamavam
  vigários de Cristo; por isso se começaram a levantar de várias partes vozes
  de protesto. Entre os que
  reprovaram a conduta dos papas, o seu poder temporal e muitos dos seus dogmas
  estiveram João Wycliffe (1320-1384). Ele sustentava que o chefe da
  Igreja era Cristo e não o papa romano, que a única autoridade para o crente
  era a Bíblia e não a igreja romana, e que a igreja romana devia conformar-se
  aos preceitos do Evangelho dos quais se tinha profundamente afastado. As suas
  ideias foram condenadas em Londres em 1382. Além dele esteve também João Huss
  (1369-1415) que contestou ao papa o primado; este último foi excomungado e
  condenado à fogueira pelo concílio de Constança em 1415.   | 
 
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   Mas vejamos o que diz Ludovico Von Pastor, que
  é um historiador católico, sobre alguns papas que viveram neste período
  histórico a fim de perceber quais eram os costumes daqueles que se diziam os
  vigários de Cristo na terra.  | 
 
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   De Clemente VI (1342-1352) ele afirma: ‘Com o
  enriquecer e favorecer os seus amigos e com o luxo principesco da sua Corte
  ele trouxe prejuízos muito sensíveis aos interesses da Igreja (...) Para
  continuar os hábitos de uma vida esplêndida e esbanjadora Clemente VI
  precisou de novas fontes de dinheiro, e soube encontrá-las, mas em detrimento
  dos interesses da Igreja, pois aumentou os perniciosos artifícios financeiros
  de Clemente V e de João XXII (....) Quando lhe eram feitos protestos pelos
  abusos que derivavam disso e se assinalava que os seus antecessores não se
  teriam permitido tais coisas, respondia: Os meus antecessores não souberam
  ser papas’ (Ludovico Von Pastor, Storia dei papi [ História dos papas] , Roma 1910, vol. I, pag. 84-85, 87).   | 
 
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   De Bonifácio IX (1389-1404) Pastor afirma: ‘Os
  meios usados por Bonifácio IX para encher as caixas da Câmera apostólica
  prejudicaram grandemente o prestígio e a veneração da suprema dignidade
  eclesiástica. Densas sombras lança sobre a memória de Bonifácio IX também o
  seu nepotismo’ (Ludovico Von Pastor, op. cit., pag. 152).  | 
 
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   E por fim de João XXIII (1410-1415) ele afirma:
  ‘Este astucioso político era de tal maneira tocado pela corrupção do seu
  tempo que não podia responder nem de longe aos deveres da suprema dignidade
  na Igreja (...) É seguramente fundada a acusação de imoralidade pessoal
  contra o papa pisano; numa bula de Alexandre V, quanto sei não tomada até
  agora em consideração, eu encontro a prova documental de um filho
  publicamente reconhecido e de uma filha de Baldassarre Cossa’ (ibid.,
  pag. 177). O concílio de Constança disse de João XXIII quando o depôs: ‘..ele
  foi e é simoníaco notório, dilapidador público dos bens e dos direitos não só
  da igreja romana, mas também de outras igrejas (...) Com a sua vida e os seus
  costumes detestáveis e desonestos, notoriamente escandalosos para a igreja e
  para o povo cristão antes da sua assunção ao papado, e também depois até a
  estes dias, ele escandalizou e escandaliza abertamente, com o seu modo de
  viver descrito, a igreja de Deus e o povo cristão (...) enquanto indigno,
  inútil, danoso deve ser afastado, privado e deposto do papado e de todo o seu
  governo espiritual e temporal’ (Concílio de Constança, Sess. XII).   | 
 
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   De Martinho V (1417-1431) depois, que foi papa
  que como vimos foi eleito pelo concílio de Constança no lugar dos três
  existentes naquele tempo, Pastor diz: ‘Um olhar para as possessões dos
  Colonna faz ver que em favorecer os parentes e amigos Martinho V ultrapassou
  os limites do lícito e que foi além daquilo que as coisas exigiam’ (Ludovico
  Von Pastor, op. cit., pag. 209-210).   | 
 
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   Vamos
  agora falar de outros dois papas deste século, Sisto IV e Alexandre VI.   | 
 
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   Sisto IV (1471-1484) foi, como muitos outros
  papas nepotista e cheio de homicídio. Pastor diz dele: ‘O nepotismo excessivo
  de Sisto IV, que bem se pode explicar, mas não justificar, forma a grande
  ignominiosa praga deste pontificado (...) Resta uma verdade deplorável, que
  Sisto IV (...) no exaltar os seus parentes ultrapassou todas as medidas e
  entrou em muitos aspectos por caminhos completamente mundanos...’ (Ludovico
  Von Pastor, op. cit., Roma 1911, vol. II, pag. 612, 621). Ele teve
  também uma parte na conjura contra os Medici (na qual foi morto Juliano dos
  Medici e Lourenço escapou) de facto ainda Von Pastor afirma que: ‘De todo o
  modo se terá que deplorar profundamente, que um papa tenha sustentado uma
  parte na história desta conjura’ (Ludovico Von Pastor, op. cit., pag.
  513); (a conjura foi aprovada pelo papa porque os Medici naquele tempo
  constituíam um obstáculo aos seus objectivos expansionistas). Foi o primeiro
  papa a legalizar as casas de prostituição de Roma que lhe rendiam milhares de
  ducados ao ano e impôs uma taxa aos sacerdotes que tinham um amante. Todos os
  meios para recolher dinheiro lhe pareciam bons tanto que era habitual dizer:
  ‘O papa não necessita senão de caneta e tinta para a soma que quer’. O nome
  deste papa está ligado também ao terrível tribunal da Inquisição porque foi
  ele com uma bula de 1478 a instituir em Espanha a Inquisição que ceifaria
  milhares de vítimas.   | 
 
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   Eis aqui agora a Alexandre VI (1492-1503).
  Depois que Rodrigo Bórgia tornou-se papa (comprando os votos dos cardeais)
  com o nome de Alexandre VI, João dos Medici disse ao cardeal Cybo: ‘Agora
  estamos nas garras do lobo porventura mais selvagem que o mundo tenha alguma
  vez visto; ou fugimos, ou nos devorará’. Era dado à fornicação e ao adultério
  e teve diversos filhos. Nomeava os cardeias em troca de fortes somas de
  dinheiro e depois os envenenava para favorecer a alternância. Mandou além
  disso expropriar os latifúndios das grandes famílias romanas - os Colonna, os
  Caetani, os Savelli - e confiscar os seus patrimónios. Contra os seus
  escândalos pregou o frade dominicano Jerónimo Savonarola que Alexandre VI
  tentou calar oferecendo-lhe o chapéu de cardeal, mas tendo o frade recusado o
  mandou processar e condenar à forca e à fogueira. Dele alguns dizem que
  morreu de malária enquanto outros que morreu envenenado por engano com o
  veneno que ele próprio tinha destinado a um cardeal de quem queria confiscar
  os bens.  | 
 
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   Chegamos
  assim ao décimo sexto século: as coisas iam de mal a pior. A corrupção e toda
  a sorte de iniquidades dominavam a todos os níveis na igreja católica romana.
  Os papas não procuravam mais que divertir-se e estender o seu poder temporal.
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   Um
  exemplo desta vontade de dominar sobre um território cada vez mais vasto o
  temos em Júlio II (1503-1513). Este papa dentre todas as paixões possuía a da
  guerra. Infringindo a lei canónica vestiu a armadura e montado sobre o
  seu cavalo à testa do seu exército subiu ao norte para combater em nome de
  Deus e do Estado pontifício. Conseguiu estender o território do Estado
  pontifício anexando a ele diversos territórios que se tinham separado dele.
  Criou assim um vasto Estado pontifício, que ia desde Piacenza a Terracina,
  cujas dimensões permaneceriam praticamente inalteradas até Oitocentos. Júlio
  II tinha também a mania da grandeza, com efeito quis mandar começar a
  reconstrução da basílica de São Pedro.   | 
 
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   Um outro exemplo de papa que dos preceitos do
  Evangelho não queria ouvir porque era dado às paixões enganadoras o temos no
  sucessor de Júlio II, vale dizer Leão X (1513-1521). Eis algumas coisas que
  diz Pastor deste papa: ‘Várias vezes Leão X adquiriu instrumentos de música
  preciosos, ornados de ouro e de prata (...) Muitas vezes tomava parte em
  pessoa nos elegantes e espirituosos concursos, que decoravam a sua mesa de
  louça preciosa, de comidas seleccionadas e de vinhos finos (...) Permaneceu
  porém suficientemente filho do seu tempo para também achar sumo contentamento
  nas brincadeiras triviais dos bobos de profissão (...) Os
  contemporâneos revelam o nome de toda uma série de semelhantes bobos,
  mediante cujas brincadeiras e argúcias por vezes triviais Leão X passava o
  tempo, convencido que este alegre entretenimento lhe alongaria a vida (....)
  Leão X tratava esplendidamente os seus hóspedes. O seu sucessor ficou maravilhado
  pelas colossais despesas de cozinha, nas quais em espécie figurava fortemente
  um prato de línguas de pavão (...) Mais compreensível do que o prazer que
  provava pela arte dos bobos, é a grande predilecção do Mediceo pelo nobre
  passatempo da caça. Apesar da proibição da Igreja muitos cardeais, a partir
  dos tempos do Scarampo, aderiram a este desporto, ao qual agora dedicou-se
  também um papa (...) Nem chuva e vento, nem frio nem a seriedade da situação
  política conseguiam demovê-lo deste deleite’ (Ludovico Von Pastor, op.
  cit., Roma 1908, vol. IV, pag. 380, 381, 382, 385, 386.). A corte de Leão
  X estava cheia para além de bobos também de meretrizes [47]. Foi ele a decretar a venda das
  indulgências para a reconstrução da chamada basílica de São Pedro. E ainda
  ele disse a um dos seus cardeais: ‘Quanto bem nos fez essa fábula do
  Evangelho’. Quando foi descoberta uma conjura que o cardeal Petrucci tinha
  urdido contra ele para o matar, Leão X mandou estrangular este cardeal e
  esquartejar outros dois conjurados.   | 
 
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   Durante o pontificado de Leão X rebentou aquela
  que foi e ainda é chamada a Reforma. Mais que dizer rebentou a Reforma sob
  Leão X seria necessário porém dizer que sob este papa o protesto contra a
  igreja católica romana que se tinha manifestado no curso dos séculos
  anteriores de variadas maneiras e por parte de grupos diversos que tinham os
  mais variados nomes (Valdenses [os que se baseavam nos ensinamentos de
  Pedro Valdo, comerciante rico de Lião convertido por volta de 1176], Lolardos
  [os que se baseavam nos ensinamentos de João Wycliffe], Hussitas [os que se
  baseavam nos ensinamentos de João Huss], etc.) assumiu proporções muito
  grandes, nunca alcançadas anteriormente, porque a favor dele se alinharam ou
  sinceramente ou só por pretexto príncipes e reis (para eles de facto aceitar
  as ideias da Reforma significava implicitamente sacudir de cima o domínio do
  papado nos seus territórios de jurisdição, como também significava entrar em
  possessão dos bens eclesiásticos da igreja romana) que com a sua autoridade
  favoreceram nos territórios sobre os quais dominavam a difusão da Reforma.
  Deve ser dito porém que este movimento de reforma não só censurava ao papa e
  à cúria romana os escândalos perpetrados em desonra do Evangelho (como já
  tinham feito muitos) mas punha ênfase também na justificação só pela fé, ou
  seja, declarava com força que o homem para ser justificado por Deus deve
  somente crer no Senhor Jesus não podendo ser justificado por via de jejuns,
  de orações, de peregrinações, e outras obras prescritas pela igreja papista.
  Antes de começar a falar de Martinho Lutero, que foi o homem que em virtude
  de variadas circunstâncias preparadas por Deus foi o que se tornou, se assim
  podemos defini-lo, o iniciador deste vasto movimento de protesto, é bom
  referir algumas palavras do cardeal Bellarmino, cujos escritos são
  considerados pelos Católicos privados de erros porque foi feito ‘santo’, que
  dão bem a ideia de qual era a situação da igreja católica romana antes que
  ‘rebentasse’ a Reforma através de Lutero. Este alto prelado papista disse:
  ‘Alguns anos antes da explosão da heresia luterana e calvinista, já não havia
  nem severidade nos tribunais eclesiásticos, nem pureza de costumes, nem
  conhecimento das santas escrituras, nem respeito pelas coisas divinas; numa palavra,
  já não havia religião’. Estando assim as coisas não surpreende que as ideias
  de Lutero tenham logo encontrado terreno fértil em toda a Europa e se tenham
  difundido como um furacão porque, apesar de não partilharmos diversas
  doutrinas de Lutero, este homem procurou levar as pessoas a rejeitar o papado
  pelas suas iniquidades, superstições e abusos de todo o género, a ler a
  sagrada Escritura na sua língua (coisa que a igreja católica romana naquele
  tempo de facto proibia) e a rejeitar muitas heresias da igreja católica que
  não eram mais que uma fonte de ganho desonesto para os papas e toda a cúria
  romana (purgatório, missa como repetição do sacrifício de Cristo e sacrifício
  expiatório, indulgências, etc.). Mas sobretudo este homem pondo-se a pregar
  que o homem é justificado só pela fé sem a necessidade das obras de
  satisfação prescritas pela igreja católica romana, que constituíam para os
  homens cargas difíceis de transportar que não conseguiam trazer paz à sua
  atormentada alma porque impotentes para justificá-los das suas transgressões,
  fez reaparecer por baixo daquele cúmulo de imundícias papistas a boa notícia
  da graça de Deus para alegria de todos os que queriam ser justificados por
  Deus mas que, dado que até àquele momento tinham sido enganados pelos vãos
  raciocínios dos teólogos papistas, não tinham podido obter esta tão anelada
  justificação que dá vida.  | 
 
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   Lutero (1483-1546) era um monge agostiniano que
  procurava seguir escrupulosamente as regras da sua ordem submetendo o seu
  corpo a um duro regime de mortificações. Em 1510 ele foi a Roma para tratar
  de assuntos da sua ordem, e aqui acreditava encontrar um clero e um povo
  profundamente religioso, mas pelo contrário, ali encontrou sacerdotes
  ignorantes que celebravam a missa rapidamente e sem alguma devoção, e
  mulheres que nos lugares de culto da igreja católica tinham um comportamento
  vergonhoso. Vendo isso ficou indignado, desgostoso e convencido da
  necessidade de uma reforma no seio da igreja católica romana. Depois de ter
  voltado à pátria, entre 1513 e 1517 meditando as Escrituras foi persuadido
  pelo Senhor que só a fé em Cristo podia justificar o homem diante de Deus, e
  ao aceitar esta verdade se sentiu renascer. Eis o que escreverá a seguir
  Lutero sobre essa experiência que mudará o curso da sua vida: ‘Tinha ficado
  inflamado pelo desejo de entender bem um vocábulo usado na Epístola aos
  Romanos, no primeiro capítulo, onde é dito: ‘A justiça de Deus é revelada no
  Evangelho’; porque até então o considerava com terror. Esta palavra: ‘justiça
  de Deus’ eu a odiava, porque o costume e o uso que habitualmente fazem dela
  todos os doutores me tinham ensinado a entendê-la filosoficamente. Entendia a justiça que eles chamam
  formal ou activa, aquela pela qual Deus é justo e pune os culpados. Apesar da
  irrepreensibilidade da minha vida de monge, sentia-me pecador diante de Deus;
  a minha consciência estava extremamente inquieta, e não tinha alguma certeza
  que Deus fosse aplacado pelas minhas obras satisfatórias. Por isso não
  amava aquele Deus justo e vingador, antes, o odiava (...). Estava fora de
  mim, de tão perturbada que estava a minha consciência; e reflectia sem
  trégua aquela passagem de Paulo, desejando ardentemente saber o que Paulo
  tinha querido dizer. Finalmente, Deus teve compaixão de mim. Enquanto
  meditava dia e noite e examinava a conexão destas palavras: ‘A justiça de
  Deus é revelada no Evangelho como está escrito: ‘O justo viverá por fé’,
  comecei a compreender que a justiça de Deus significa aqui a justiça que Deus
  doa, e por meio da qual o justo vive, se tem fé. O sentido da frase é pois
  este: o Evangelho nos revela a justiça de Deus, mas a justiça passiva, por
  meio da qual Deus, na sua misericórdia, nos justifica pela fé, como está
  escrito: ‘O justo viverá por fé’. De repente me senti renascer, e me pareceu
  que se abriram para mim as portas do paraíso. Desde então toda a Escritura
  ganhou para mim um significado novo (...). Quanto tinha odiado o termo:
  ‘justiça de Deus’, igualmente agora amava, exaltava aquele doce vocábulo.
  Assim aquela passagem de Paulo tornou-se para mim a porta do paraíso’. Lutero
  percebeu então que todos os seus esforços que tinha feito como monge para ser
  justificado por Deus, isto é, os jejuns, as orações, as vigílias, tinham sido
  inúteis porque bastava somente a fé para obter a justificação [48]. Lutero, depois de ter feito este preciosa
  descoberta, se desencontrou em 1517 com o dominicano Tetzel que se
  tinha posto a vender indulgências nos arredores de Wittenberg onde ele
  ensinava [49]. A mensagem do
  Dominicano era: ‘A alma sai do purgatório no preciso momento em que a moeda
  ressoa na caixa’. Naquele mesmo ano Lutero afixava na catedral de Wittenberg
  as suas 95 teses com as quais condenava os abusos do sistema das indulgências
  e se declarava pronto para um debate sobre o assunto. Inicialmente portanto,
  Lutero atacou os abusos do sistema das indulgências pensando reformá-lo (com
  efeito, lendo as suas 95 teses pode-se ver que ele não negou ao papa o poder
  de conceder indulgências como nem o direito por parte do povo de adquiri-las;
  de modo que deve-se concluir que ainda não lhe era plenamente claro o caminho
  de Deus) [50], e por isso se deduz que
  ele inicialmente não tinha em mente separar-se da igreja católica romana mas
  somente reformá-la no seu interior. Mas pouco tempo depois, convencido que
  para operar uma reforma que permitisse aos homens voltar ao Evangelho era
  necessário separar-se do sistema instaurado pela igreja romana, ele atacou o
  primado do papa, a doutrina dos sete sacramentos como meios para receber a
  graça porque afirmava que se é justificado só pela fé, e o sistema
  hierárquico na igreja porque dizia que em virtude da fé todo o crente é um
  sacerdote. Foi então que o papa reagiu emitindo, em Junho de 1520, contra
  Lutero a bula Exurge Domine (com a qual o papa condenava os ‘erros’ e
  os escritos de Lutero e o ameaçava de excomunhão se não se retratasse dentro
  de 60 dias), que foi queimada publicamente (e com ela queimou os livros de
  direito canónico) por Lutero na praça de Wittenberg, dizendo: ‘Porque tu
  perturbaste o Santo do Senhor, assim o fogo eterno te moleste e consuma’. Em
  seguida, no princípio de Janeiro de 1521 Roma emanou a bula Decet Romanum
  Pontificem com a qual Lutero era excomungado. Lutero foi convocado pelo
  imperador Carlos V à Dieta imperial de Worms em 1521 para responder em mérito
  às suas teorias e retratar as suas afirmações. Lutero lá foi mas não quis
  abjurar, permaneceu firme. Ao pedido referente à sua retratação ele
  respondeu: ‘Nos meus escritos não há nada de censurável: Roma exercita na
  Alemanha a tirania’ e concluiu dizendo: ‘Não posso e não quero retratar-me,
  porque não é nem seguro nem sincero agir contra a própria consciência. Que
  Deus me ajude. Amen’. No caminho de regresso da Dieta foi raptado por alguns
  seus amigos e posto no castelo Wartburg de propriedade de Frederico o Sábio,
  um príncipe que o defendia e protegia. Aqui permanecerá cerca de dezoito
  meses, durante os quais traduzirá em alemão o Novo Testamento, depois voltará
  a Wittenberg e se porá novamente a pregar contra as doutrinas papistas.   | 
 
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   Depois da sua partida de Worms a Dieta imperial
  emanou um édito com o qual Lutero era, juntamente com os seus escritos,
  banido do Império, e quem o encontrasse era exortado a entragá-lo nas mãos da
  autoridade imperial. Mas este édito contra Lutero por vários motivos nunca
  foi executado.   | 
 
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   Mas apesar da oposição do papa e do imperador a
  Reforma continuou a propagar-se na Alemanha (com a ajuda de diversos
  príncipes) e dali se difundiu rapidamente para as outras nações da Europa. O
  luteranismo fora da Alemanha se difundiu muito na Dinamarca, Suécia, Noruega
  e Finlândia (nestas nações com o apoio dos soberanos que aderiram à Reforma);
  mas também em França, Holanda, e em Itália (começando pela república de
  Veneza), aqui porém um pouco menos. Hoje as igrejas que se baseam nos ensinamentos de Lutero se chamam
  igrejas luteranas.   | 
 
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   Além
  do luteranismo surgiu e se difundiu na Europa o calvinismo, ou seja, o
  conjunto de doutrinas ensinadas por João Calvino (1509-1564) reformador
  nascido em França que desenvolveu a sua missão sobretudo na Suíça, em
  Genebra, cujos escritos se difundiram também eles por toda a Europa. Apesar
  de haverem diferenças doutrinais entre Lutero e Calvino [51] os dois pregavam que o homem é justificado
  só pela fé sem as obras e rejeitavam o papismo. O calvinismo se difundiu
  muito em França (aqui os seus aderentes serão chamados huguenotes), na
  Holanda, na Escócia (aqui propagará o calvinismo João Knox, 1513-1572) e em
  Inglaterra (os que foram sobrenomeados os Puritanos por exemplo eram
  calvinistas). Hoje as igrejas que no continente (especialmente na Suíça,
  Holanda, França e partes da Alemanha) se baseam nos ensinamentos
  de Calvino são denominadas igrejas reformadas: em Inglaterra e na Escócia ao
  invés os Calvinistas são conhecidos habitualmente como presbiterianos.   | 
 
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   Um
  outro movimento reformador surgido naqueles anos que se difundirá na Europa é
  o anabatismo, surgido na Suíça nos arredores de Zurique por volta de 1523. O
  anabatismo era um movimento que se distinguia tanto do luteranismo como do
  calvinismo porque não aceitava o batismo dos infantes mas somente o dos
  adultos (daqui o nome dado aos seus aderentes de Anabatistas, isto é,
  rebatizadores), como não aceitava a união entre Igreja e Estado porque
  pregava a completa separação entre Igreja e Estado. Os Anabatistas eram
  também pacifistas não admitindo a violência nem com objectivo de ofensiva nem
  com objectivo de defesa, e não admitiam o juramento em tribunal e que um
  cristão ocupasse o cargo de magistrado [52].
  Os Anabatistas se difundiram muito nos Países Baixos. Do movimento anabatista
  surgiram os Menonitas (que tomaram o nome de Menno Simmons um ex-sacerdote
  católico, 1496 ca. -1561 ca.) e os Batistas.   | 
 
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   Um discurso um pouco diferente merece, pelo
  contrário, o anglicanismo radicado em Inglaterra. Porque ele começou como
  movimento político e prosseguiu como movimento religioso. Em Inglaterra
  existiam ainda Lolardos (seguidores de João Wycliffe), e após o rebentar da
  Reforma luterana se difundiram os escritos de Lutero que foram aceites por
  muitos. Naquele tempo era rei de Inglaterra Henrique VIII que era casado com
  Catarina de Aragão da qual já considerava não poder ter mais um filho macho
  que pudesse suceder-lhe no trono. Então o rei pediu ao papa Clemente VII o
  anulamento deste seu matrimónio e a permissão de voltar a casar com Ana
  Bolena. O papa porém recusou conceder o divórcio a Henrique, o qual então
  pensou em libertar-se do casamento pelo clero inglês. O rei se fez proclamar
  em 1531 pela assembleia do clero chefe e protector da igreja e do clero de
  Inglaterra. Assim o clero aceitou Henrique VIII como seu chefe e em 1533
  o matrimónio do rei com Catarina era declarado nulo enquanto ele se tinha já
  casado secretamente com Ana Bolena. Em 1534 Henrique fez votar ao parlamento
  a ‘lei de supremacia’ que reconhecia o rei como único chefe supremo da Igreja
  de Inglaterra na terra. Vem a consumar-se portanto o cisma; o rei de
  Inglaterra tinha se tornado o papa da igreja na sua nação. E nesta sua nova
  veste fez perseguir de morte aqueles prelados que recusaram a sua supremacia
  espiritual e mandou fechar muitos mosteiros cujos bens e cujas terras
  passaram em parte para a coroa e em parte foram doadas ou vendidas à nobreza.
  Deve ser dito porém que se bem que o rei tenha perseguido de morte aqueles
  prelados católicos que se recusaram a reconhecê-lo como chefe supremo da
  igreja, e ter mandado fechar muitos mosteiros, ele se manteve
  substancialmente católico na doutrina. Inicialmente tinha feito sim
  concessões aos Protestantes para poder ter o seu favor, mas de 1539 em diante
  tinha mudado de atitude fazendo promulgar a lei dos Seis Artigos que era
  fortemente católica. Esta lei afirmava a transubstanciação, a suficiência da
  comunhão sob uma espécie, o celibato dos padres, a perpetuidade dos votos, as
  missas privadas e a confissão auricular. Não obstante isso, pode-se dizer,
  que este rei favoreceu, contra as suas intenções, a obra de reforma no seio
  da igreja inglesa. Morto Henrique VIII, lhe sucedeu no trono o jovem filho
  Eduardo VI (1547-1553) que favoreceu a difusão da Reforma no país. Em 1547 o
  parlamento permitiu o cálice ao povo na comunhão e revogou a lei dos Seis
  Artigos: em 1549 tornou legal o matrimónio dos padres e ordenou o
  encerramento das capelas votivas onde se dizia a missa em sufrágio da alma do
  doador. Além disso foi declarado que os serviços religiosos deviam se
  realizar na língua falada em vez de em latim. Em 1549 era estabelecido o uso
  do ‘Book of Common Prayer’ (‘Livro da oração comum’), livro que era obra de
  um Protestante no qual vinha posto em primeiro lugar o uso do inglês nos
  serviços religiosos, a leitura da Bíblia e a participação dos fiéis na
  adoração. Em 1552 foi publicado uma segunda edição deste livro (na qual havia
  uma clara influência calvinista) cujo uso foi ordenado às igrejas. Em 1553
  por fim o rei sancionou Os Quarenta e Dois Artigos preparados por um
  Protestante e que eram fortemente calvinistas; estes artigos tornaram-se
  credo da igreja anglicana. À morte de Eduardo VI lhe sucedeu a católica Maria
  Tudor (1553-1558) que aboliu as mudanças trazidas por Eduardo e emanou
  severíssimas leis contra os que dissentiam da igreja inglesa. Muitos crentes
  foram mortos durante o seu reinado; daqui o sobrenome dado a esta soberana ‘a
  sanguinária’, bem amada naturalmente pelo papa. Outros foram obrigados a
  fugir para aqueles países europeus onde a Reforma era protegida. Depois de
  Maria subiu ao reinado Isabel (ou Elisabete) que reintroduz, com algumas
  modificações, as mudanças trazidas por Eduardo à igreja inglesa. E por esta
  sua decisão atraiu a excomunhão do então papa Pio V. Eis como surgiu a igreja
  anglicana (da qual depois se separariam os que serão chamados Puritanos
  porque consideravam que nela tinham ficado demasiados restos do papismo que
  deviam ser tirados, e os que foram denominados Metodistas) ainda hoje
  existente.  | 
 
| 
   Todos os que aderiram à Reforma, não importa se
  Luteranos, Calvinistas, Anabatistas, Anglicanos, foram chamados Protestantes
  [53].   | 
 
| 
   Depois de ter feito este necessário parêntesis
  para tratar a Reforma que representou do décimo sexto século em diante para o
  papado a perda do seu antigo poder em muitas nações europeias como também uma
  perda de muitos rendimentos e de muitos membros, prossigamos com o sucessor
  de Leão X.   | 
 
| 
   Morto Leão X em 1521, lhe sucedeu Adriano VI em
  1522. O novo papa era holandês. Este tinha intenção de reformar a igreja
  católica romana a começar pela corte papal expulsando as meretrizes, os
  poetas e os bobos. Mas os seus propósitos não agradaram à cúria romana que o
  tomou em aversão. Adoeceu repentinamente e morreu em 1523.   | 
 
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   Tomou o seu lugar Clemente VII (1523-1534) o
  qual por causa da sua posição política anti-imperial atraiu as iras de Carlos
  V que mandou as suas tropas contra Roma. Os soldados alemães chegados a Roma se deram ao saque, mataram muitas
  pessoas, violentaram as mulheres e destruiram muitas obras de arte. O
  papa se refugiou em Castel Sant’Angelo mas teve que se render, foi feito
  prisioneiro por alguns meses. O papa teve que pagar muito dinheiro e graças à
  complacência de alguns oficiais conseguiu fugir da cidade disfarçado de
  vendedor ambulante. Muitos interpretaram então aquele flagelo abatido sobre
  Roma como um castigo infligido por Deus por causa da vida escandalosa que
  levavam os papas e os eclesiásticos. Clemente VII pôde voltar a Roma,
  encontrando-a devastada e despovoada, apenas em 1528. Reconciliou-se depois
  com Carlos V em 1529. No ano seguinte Clemente VII coroou imperador Carlos V
  em Bologna. Carlos V fez emanar à Dieta de Spira de 1529 um decreto contra os
  Anabatistas segundo o qual ‘todos os anabatistas, e todas as pessoas
  rebatizadas, homem ou mulher que fosse, devia ser morta ou pela espada, ou
  pelo fogo, ou doutra forma’. Carlos V fará depois guerra à Liga de Esmalcalda
  (uma liga que se formou em 1531 à qual tinham aderido príncipes, condes e
  cidades protestantes para proteger com as armas o protestantismo na Alemanha)
  derrotando-a em 1547 em Muhlberg.  | 
 
| 
   Morto Clemente foi eleito papa Paulo III
  (1534-1549). Diz dele Pastor: ‘Em geral este papa não pode ser absolvido da
  má fama, de se abandonar ele próprio a uma vida mundana, que não convinha com
  a gravidade do tempo. Também agora como antes não só por cardeais, mas também
  pelo papa no Vaticano eram celebradas festas luxuosas, nas quais compareciam
  músicos, improvisadores, até cantoras, dançarinos e bobos’ (Ludovico Von
  Pastor, op. cit., Roma 1914, vol. V, pag. 235). Sob Paulo III surgiram
  os Jesuítas (1540), ‘os homens do papa’, que com intrigas e lisonjas
  de todo o género atiçariam reis e governadores contra os Protestantes para os
  extirpar dos territórios destes; foi instituída a Inquisição romana (1542)
  para combater a heresia em todo o lugar, e foi convocado o concílio de Trento
  em 1545 (que se prolongou até 1563) que não fez mais que reforçar o poder do
  papa e de toda a cúria romana e confirmar todas as falsas doutrinas católicas
  a que se opunham os reformadores lançando anátemas contra os que não as
  aceitassem.   | 
 
| 
   O papa sucessivo foi Júlio III (1550-1555).
  Ainda Pastor nos diz dele: ‘Ele assistia igualmente às representações
  teatrais com que terminavam os seus banquetes. Também mulheres eram
  convidadas para o Vaticano (...) Júlio III, que ainda a par dos negócios se
  tinha largamente abandonado aos prazeres, adorava em espécie esplêndidos
  convites (...) Como a par dos papas do renascimento saía para caçar, jogava
  grandes somas com cardeais amigos e outros confidentes e mantinha muitos bobos
  da corte, assim Júlio III não tinha sequer escrúpulo algum de intervir em
  representações teatrais inconvenientes’ (Ludovico Von Pastor, op. cit.,
  Roma 1922, vol. VI, pag. 46-47).   | 
 
| 
   A Júlio sucedeu por pouco Marcelo II (1555), e
  depois veio Paulo IV (1555-1559). Este se distinguiu pelas perseguições
  contra os Hebreus. Eis o que diz a respeito Pastor: ‘Solicitude para
  manter pura a fé foi também a causa das severíssimas prescrições, que Paulo
  IV emanou logo no princípio do seu pontificado contra os Hebreus (...) uma
  bula de 14 de Julho de 1555 decretava que em Roma e nas outras cidades do
  Estado pontifício os Judeus devessem habitar completamente separados
  dos cristãos num bairro ou numa rua com apenas uma entrada e uma saída. Foi
  estabelecido além disso: não é permitido mais do que uma sinagoga em cada
  cidade, os Hebreus não podem adquirir imóveis e devem vender dentro de um
  determinado tempo aos cristãos os que se encontram na sua posse. Como sinal
  distintivo se prescreveram aos Hebreus chapéus amarelos. Foi-lhes interdito
  ter servos cristãos, o trabalho público nos dias de festa para os cristãos,
  relações demasiado estreitas com os cristãos, de estender contratos fictícios
  (...) Finalmente não era lícito aos Hebreus exercer comércio algum de trigo
  ou outras coisas necessárias ao sustento humano, tratar como médicos os
  cristãos’ (Ludovico Von Pastor, op. cit., pag. 487,488). Este papa
  como se pode bem ver imitou Faraó do Egipto porque também ele maltratou os
  Hebreus; mas além de oprimir e perseguir os Hebreus fez perseguir de morte os
  que tinham abraçado a Reforma. Sob ele muitos crentes morreram por causa da
  sua fé. Foi um perseguidor cruel e impiedoso dos Protestantes. Em 1559 ele
  promulgou o primeiro Index Librorum Prohibitorum, isto é, o Índice dos
  livros cuja leitura era proibida aos Católicos (O Índice será abolido em 1965
  por Paulo VI).   | 
 
| 
   Depois de Paulo IV outros papas que perseguiram
  com grande ferocidade os Protestantes foram Pio V, Gregório XIII e Sisto V;
  todos os três prontos a encorajar a exterminar os Protestantes e os soberanos
  que os favoreciam na suas nações.   | 
 
| 
   Pio V (1566-1572) incitou o rei Carlos IX a exterminar
  os Huguenotes em França; em 1570 com uma bula excomungou a rainha Isabel de
  Inglaterra (porque favoreceu o protestantismo em Inglaterra) e dissolveu os
  seus súbditos do juramento de fidelidade para com ela; e além disso conspirou
  o assassínio desta rainha.   | 
 
| 
   Gregório XIII (1572-1585) com uma bula incitou
  Carlos IX a perseverar no extermínio dos Protestantes até que o seu reino
  estivesse inteiramente purgado das ‘heresias blasfemas’: o seu secretário de
  Estado, cardeal Galli, em nome do papa Gregório um dia respondeu ao núncio
  pontifício em Espanha, Filippo Sega (ao qual o Católico inglês Ely tinha
  submetido um plano para matar a rainha Isabel): ‘Todo aquele que a tira do
  mundo ao justo serviço de Deus, não só não peca, mas também adquire um mérito,
  sobretudo tendo em conta a sentença lançada contra ela por Pio V’.   | 
 
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   Sisto V (1585-1590) para reconquistar a
  Inglaterra para a igreja católica enviou contra ela o rei Filipe de Espanha,
  devoto católico, com a sua grande frota chamada ‘Armada Espanhola’ mas a
  empresa financiada por este papa sanguinário não foi bem sucedida, porque a
  frota espanhola foi derrotada pela inglesa.   | 
 
| 
   A contra-reforma católica (assim é chamada a
  reacção papista à Reforma protestante) produziu um período de duras
  perseguições durante as quais encontraram a morte na Europa muitos milhares
  de crentes. Foram afogados, sepultados vivos, queimados vivos, enforcados,
  decapitados, foram em suma tratados como se tivessem feito a obra dos
  malfeitores. O seu crime era o de não se quererem submeter ao papa aceitando
  os dogmas da igreja católica romana.  | 
 
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   Do décimo oitavo ao vigésimo século  | 
 
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   | 
 
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   Passemos agora ao décimo oitavo século e em
  particular vejamos quais foram os efeitos da revolução francesa sobre o
  papado; antes porém dizemos alguma coisa sobre Clemente XIV (1769-1774). Este
  papa passou à história pela sua decisão de suprimir os Jesuítas por causa das
  suas cometidas transgressões que tinham incrementado a aversão ao papado de
  muitos soberanos (na Rússia e na Prússia porém os Jesuítas continuaram a
  sobreviver até à sua reabilitação). Deste papa Pastor diz: ‘Clemente XIV
  costumava distrair-se jogando bilhar, ou, quando o tempo estava bom, bocce no
  jardim do Quirinal ou em Villa Patrizi (...) Quando Clemente XIV estava de
  bom humor, os seus íntimos podiam permitir-se a brincadeiras e zombarias
  bastante singulares...’ (Ludovico Von Pastor, op. cit., Roma 1933,
  vol. XVI, pag. 79, 80, 81). Morreu envenenado.  | 
 
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   Com a revolução francesa o papado recebeu um
  outro duro golpe. A Assembleia Nacional de 1789 declarou propriedade do
  Estado os bens da igreja católica. As ordens foram dissolvidas, os votos
  suprimidos, os bispos de agora em diante deviam ser eleitos pelo povo e o
  papa devia apenas receber a comunicação da sucedida escolha, os eclesiásticos
  deviam ser pagos pelo Estado e prestar juramento de fidelidade a ele. As
  coisas para o papado pioraram ainda mais quando o Directório considerou que o
  governo dos padres em Itália era incompatível com a existência da república
  francesa. Em 1797 em Roma durante uma sublevação popular houve a matança do
  general Duphot por parte de soldados pontifícios, o Directório aproveitou
  então a ocasião para cumprir o seu desígnio que era o de eliminar o Estado
  pontifício, e mandou as tropas francesas sob o comando do general Berthier
  invadir o Estado pontifício e ocupar Roma onde foi proclamada a República. O
  então papa Pio VI (1775-1799) que era muito velho pediu aos seus inimigos que
  queria morrer ali onde tinha vivido. Foi-lhe respondido que podia morrer em
  qualquer lugar; o seu quarto foi saqueado, tiraram-lhe do dedo o anel que
  trazia e o levaram para França onde morreu em 1799. Naquele mesmo ano em
  França subiu ao poder Napoleão Bonaparte. Ele fez em 1801 uma Concordata com
  a igreja católica romana (o então papa era Pio VII que tinha sido eleito papa
  em Março de 1800 num conclave realizado em Veneza e depois tinha ido para
  Roma onde já não havia papa desde Fevereiro de 1798) em que reconhecia a
  religião católica como ‘a religião da maioria dos Franceses’, contudo não
  fazendo dela a religião de Estado. Os bispos deviam ser nomeados pelo Estado
  e consagrados pelo papa. O clero devia ser pago pelo Estado mas à igreja não
  seriam restituídas as propriedades confiscadas em 1790. Em 1804 Napoleão
  convidou o papa a ir a Paris à cerimónia da sua coroação imperial. Pio VII
  aceitou (foi obrigado a fazê-lo porque Napoleão ameaçava puni-lo se ele
  recusasse) pensando que seria ele a coroar o imperador Bonaparte, como tinha
  feito o seu predecessor Leão III com Carlos Magno, e que com este gesto viria
  bem à igreja católica romana; mas quando chegou o dia da cerimónia na
  catedral de Notre-Dame aconteceu que Napoleão pegou na coroa e a pôs sobre a
  cabeça com as suas próprias mãos. O papa tinha sido mais uma vez humilhado
  por Napoleão e voltou a Roma onde entre os eclesiásticos reinava a
  insatisfação pelo seu comportamento. Depois disso Napoleão pediu a Pio VII
  para unir-se a ele contra os Ingleses (que segundo Napoleão não queriam a paz
  do Império) mas o papa recusou atraindo a si as iras de Napoleão o qual
  ocupou Ancona e Urbino, e enviou as suas tropas contra Roma ocupando-a em
  1808. Os cardeais que não lhe eram amigos foram afastados a começar pelo
  secretário de estado. Pio VII (1800-1823) foi deportado de Roma (primeiro foi
  levado para Savona e depois para Paris) e o Estado pontifício foi anexado ao
  império francês. Mas com a derrota de Napoleão as coisas voltaram ao que eram
  antes, porque Napoleão, obrigado pelas circunstâncias que lhe eram
  desfavoráveis, deu ordem para pôr em liberdade o papa o qual voltou para Roma
  triunfalmente. Era Maio de 1814; o Estado pontifício voltava para as mãos do
  papa.   | 
 
| 
   Em 1848 o então papa Pio IX foi obrigado por
  uma sublevação popular a fugir de Roma e a refugiar-se em Gaeta. A população
  estava cansada de ver o poder civil nas mãos do clero; ela queria que o
  governo civil fosse entregue só aos ‘leigos’, coisa que o papa não queria
  absolutamente porque segundo ele o Estado pontifício era a herança de São
  Pedro que ele tinha recebido de Cristo e portanto ele devia ser governado
  pelo sucessor de Pedro porque lhe pertencia. Mas Pio IX enquanto se
  encontrava em Gaeta, pensou recuperar Roma pela força fazendo apelo à
  Áustria, à Espanha, ao reino de Nápoles e à França a qual enviou as suas
  tropas para Roma (onde entretanto tinha sido proclamada a república romana
  com a sua nova constituição que trazia à cabeça o princípio da soberania
  popular, e declarada decaída a soberania temporal do papa) ‘para restituir a
  capital do mundo católico à soberania da Igreja, segundo o caloroso desejo de
  todos os católicos’. As tropas francesas depois de terem desembarcado em
  Civitavecchia, sob o comando do general Oudinot, bombardearam Roma e mataram
  muitas pessoas para restituir a cidade nas mãos do papa [54]. As tropas das outras potências ao invés
  ocuparam o resto do Estado pontifício. A república romana foi assim
  dissolvida; e o governo dos assuntos civis foi transferido para uma comissão
  cardinalícia nomeada pelo papa. Pio IX pôde voltar para Roma em 1850.   | 
 
| 
   Em 1859-1860 Vítor Emanuel II conseguiu anexar
  primeiro a Romagna e depois a Umbria e as Marche, iniciando assim a conquista
  do Estado pontifício. O Estado pontifício no fim de 1860 estava limitado
  apenas ao Lazio e à cidade de Roma onde haviam tropas francesas em defesa do
  Estado pontifício. Em 1870
  aconteceu que rebentou a guerra entre a França e a
  Prússia. E a França foi obrigada por razões militares a retirar as
  suas tropas que tinha em solo italiano em defesa do Estado da igreja
  católica. O Estado da igreja se encontrou portanto indefeso (e ainda por cima
  a França saiu derrotada da guerra) e desta condição se aproveitaram logo dela
  os Italianos para se desfazerem de uma vez por todas da tirania do clero.
  Naquele ano as tropas piemontesas comandadas pelo general Raffaele Cadorna entraram
  pela brecha da Porta Pia em Roma anexando a cidade do papa ao reino de
  Itália. Foi uma humilhação para o Estado pontifício [55]; o papa perdeu aquela que ele definia a
  herança ou o património de São Pedro [56]
  a que nunca renunciaria de sua espontânea vontade, e se declarou ‘prisioneiro
  do Vaticano’; excomungou o rei Vítor Emanuel II e todos os que tinham
  contribuído para a ocupação do Estado pontifício e proibiu aos Católicos de
  participar tanto na qualidade de candidatos como de eleitores em eleições de
  qualquer tipo. A qualquer oferta do Governo italiano para chegar a uma
  reconciliação Pio IX respondeu dizendo: Non possumus. Em 1871 o
  Parlamento italiano aprovou a chamada Lei das Garantias com que ia ao
  encontro das exigências da ‘Santa Sé’, incluindo as económicas atribuindo-lhe
  ‘uma dotação de renda anual de L. 3.225.000’ que estaria isenta de toda
  espécie de taxa ou ónus governativo, comunal e provincial. Mas tanto Pio IX
  como os seus sucessores recusaram a mão lhes oferecida pelo Governo italiano,
  não querendo reconhecer a Lei das Garantias.   | 
 
| 
   Em 1922 subiu ao poder Benito Mussolini [57], e no mesmo ano foi eleito papa Pio XI
  (1922-1939). Os dois perceberam que poderiam tirar enormes vantagens de um
  acordo reconciliador, e por isso iniciaram negociações secretas entre as
  partes para pôr termo à inimizade entre o papado e o governo italiano que já
  durava há diversas décadas. As negociações levaram à estipulação, em 1929,
  entre a ‘Santa Sé’, representada naquela ocasião pelo cardeal Gasparri, e o Estado
  italiano, comandado por Benito Mussolini, do Tratado de Latrão e da
  Concordata (ambos estes documentos trazem à cabeça a expressão ‘Em Nome da
  Santíssima Trindade’) e de uma Convenção Financeira. Com o Tratado a Itália
  reconheceu à ‘Santa Sé’ a soberania sobre um minúsculo território chamado
  ‘Cidade do Vaticano’ e a ‘Santa Sé’ declarou definitivamente concluída a
  ‘questão romana’, reconhecendo o Reino de Itália sob a dinastia da Casa
  Savóia com Roma capital do Estado italiano. Vejamos agora alguns artigos do
  Tratado e da Concordata de Latrão a fim de perceber as concessões feitas e os
  privilégios concedidos pelo Estado Italiano ao Vaticano.   | 
 
| 
   O art. 1 do Tratado afirma: ‘A Itália reconhece
  e reafirma o princípio consagrado no art. 1 do Estatuto do Reino de 4 de
  Março de 1848, pelo qual a religião católica, apostólica e romana é a única
  religião do Estado’; o art. 6 afirma que a Itália ‘providenciará, além disso,
  a comunicação com as ferrovias do Estado mediante a construção de uma estação
  ferroviária na Cidade do Vaticano..’; o art. 8 do Tratado diz que ‘a Itália,
  considerando sagrada e inviolável a pessoa do Sumo Pontífice, declara punível
  o atentado contra Ela e a provocação a cometê-lo com as mesmas penas
  estabelecidas para o atentado e a provocação a cometê-lo contra a pessoa do
  Rei. As ofensas e as injúrias públicas cometidas em território italiano
  contra a pessoa do Sumo Pontífice com discursos, com factos e com escritos,
  são punidas como as ofensas e as injúrias à pessoa do Rei’; o art. 13 diz que
  ‘a Itália reconhece à Santa Sé a plena propriedade das Basílicas patriarcais
  de São João em Latrão, de Santa Maria Maior e de S. Paulo, com os edifícios
  anexos...’; o art. 14 que ‘a Itália reconhece à Santa Sé a plena propriedade
  do palácio pontifício de Castel Gandolfo com todas as dotações, ligações e
  dependências’ e se obriga a ceder-lhe ‘a Villa Barberini em Castel Gandolfo
  com todas as dotações, ligações e dependências’ [58]
  e depois ‘para integrar a propriedade dos imóveis sitos no lado norte da
  Colina Gianicolense pertencente à Sagrada Congregação de Propaganda Fide e a
  outros institutos eclesiásticos e defronte para os palácios vaticanos, o
  Estado se compromete a transferir para a Santa Sé ou para as entidades que
  forem por Ela indicadas os imóveis de propriedade do Estado ou de terceiros
  existentes em dita zona... a Itália, por fim, transfere para a Santa Sé em
  plena e livre propriedade os edifícios ex-conventuais em Roma anexos à
  Basílica dos Santos XII Apóstolos e às igrejas de Sant’Andrea della Valle e
  de São Carlo ai Catinari, com todos os anexos e dependências..’; o art. 16
  diz que os imóveis citados nos três artigos anteriores (no art. 15 são
  citados diversos palácios da igreja católica romana situados em território
  italiano) ‘assim como os destinados a sedes dos seguintes institutos
  pontifícios: Universidade Gregoriana, Instituto Bíblico, Oriental,
  Arqueológico, Seminário Russo, Colégio Lombardo, os dois palácios de
  Sant’Apollinare e a Casa dos exercícios para o clero de São João e Paulo,
  nunca serão sujeitos a vínculos ou a expropriação para causa de utilidade
  pública, senão prévio acordo com a Santa Sé, e estarão isentos de tributos
  seja ordinários ou extraordinários tanto para com o Estado quanto para com
  qualquer outra entidade’; o art. 17 afirma quanto se segue: ‘As retribuições
  de qualquer natureza, devidas pela Santa Sé, pelas outras entidades centrais
  da Igreja Católica e pelas outras entidades geridas directamente pela Santa
  Sé também fora de Roma, a dignitários, empregados e assalariados, mesmo não
  estáveis, serão no território italiano isentos, a partir de 1° de Julho de
  1929, de qualquer tributo tanto para com o Estado quanto para com toda outra
  entidade’; o art. 20 recita quanto se segue: ‘As mercadorias provenientes do
  exterior e dirigidas à Cidade do Vaticano, ou, fora da mesma, a instituições
  ou ofícios da Santa Sé, serão sempre admitidas por qualquer ponto da
  fronteira italiana e em qualquer porto do Reino, ao trânsito pelo território
  italiano com plena isenção dos direitos aduaneiros e impostos’; o art. 21
  afirma: ‘Todos os Cardeais gozam em Itália das honras devidas aos Príncipes
  de sangue; os que residem em Roma, mesmo fora da Cidade do Vaticano, são,
  para todos os efeitos, cidadãos da mesma’; o art. 23 afirma que terão ‘plena
  eficácia jurídica, também para todos os efeitos civis, em Itália as sentenças
  e as disposições emanadas por autoridades eclesiásticas e oficialmente
  comunicadas às autoridades civis, acerca de pessoas eclesiásticas ou
  religiosas e concernentes a matérias espirituais ou disciplinares’.  | 
 
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   Cito agora algumas passagens de alguns artigos
  da Concordata. O art. 1 da Concordata diz: ‘.... Em consideração do carácter
  sagrado da Cidade Eterna, sede bispal do Sumo Pontífice, centro do mundo
  católico e meta de peregrinações, o Governo italiano terá cuidado de impedir
  em Roma tudo o que possa estar em contraste com dito carácter’. O art. 2
  afirma: ‘... Tanto a Santa Sé quanto os Bispos podem publicar livremente e
  também afixar no interior e nas portas exteriores dos edifícios destinados ao
  culto ou a ofícios do seu ministério as instruções, ordenanças, cartas
  pastorais, boletins diocesanos e outros actos que digam respeito ao governo
  espiritual dos fiéis, que acreditarão emanar no âmbito da sua competência.
  Tais publicações e afixações e em geral todos os outros actos e documentos
  relativos ao governo espiritual dos fiéis não são sujeitos a encargos
  fiscais... As autoridades eclesiásticas podem sem alguma ingerência das
  autoridades civis executar colectas no interior e na entrada das igrejas
  assim como nos edifícios de sua propriedade’. O art. 3 diz: ‘... ‘Os
  estudantes de teologia, os dos últimos dois anos de propedêutica à teologia
  encaminhados ao sacerdócio e os noviços dos institutos religiosos podem, a
  seu pedido, adiar, de ano em ano, até ao vigésimo sexto ano de idade o
  cumprimento das obrigações do serviço militar. Os clérigos ordenados em
  ‘sacris’ e os religiosos, que emitiram os votos, estão isentos do serviço
  militar, salvo o caso de mobilização geral. Em tal caso, os sacerdotes passam
  nas forças armadas do Estado, mas é-lhes conservado o hábito eclesiástico,
  para que exerçam entre as tropas o ministério sagrado sob a jurisdição
  eclesiástica do Ordinário militar conforme o art. 14. Os outros clérigos ou religiosos são de preferência
  destinados aos serviços sanitários. Todavia, mesmo se for disposta a
  mobilização geral, estão dispensados de apresentar-se à chamada os sacerdotes
  com cura de almas. Consideram-se tais os Ordinários, os párocos, os
  vice-párocos e coadjutores, os vigários e os sacerdotes estavelmente
  estabelecidos em reitorias de igrejas abertas ao culto’. O art. 5 afirma que
  ‘os sacerdotes apóstatas ou enredados por censura não poderão ser assumidos
  nem conservados num ensino, num ofício ou num emprego, nos quais estejam em
  contacto directo com o público’. O art. 8 afirma que ‘.... Em caso de prisão,
  o eclesiástico ou o religioso é tratado com o respeito devido ao seu estado e
  ao seu grau hierárquico. No caso de condenação de um eclesiástico ou de um
  religioso, a pena é descontada possivelmente em locais separados dos
  destinados aos leigos, a menos que o Ordinário competente tenha reduzido o
  condenado ao estado laical’; o art. 9 afirma que ‘em regra, os edifícios
  abertos ao culto estão isentos de requisições ou ocupações’ e que ‘salvo os
  casos de urgente necessidade, a força pública não pode entrar, para o
  exercício das suas funções, nos edifícios abertos ao culto, sem ter dado
  disso prévio aviso à autoridade eclesiástica’; o art. 10 diz que ‘não se
  poderá por qualquer que seja a causa proceder à demolição de edifícios
  abertos ao culto, senão com prévio acordo com a competente autoridade
  eclesiástica’; o art. 11 diz: ‘O Estado reconhece os dias festivos
  estabelecidos pela Igreja, que são os seguintes: todos os Domingos, o
  primeiro dia do ano; o dia da Epifania (6 de Janeiro); o dia da festa de São
  José (19 de Março); o dia da Ascensão; o dia do Corpus Domini; o dia da festa
  dos ss. Apóstolos Pedro e Paulo (29 de Junho); o dia da assunção da B.V.
  Maria (15 de Agosto); o dia de Todos os santos (1 de Novembro); o dia da
  festa da Imaculada Conceição (8 de Dezembro); o dia de Natal (25 de
  Dezembro)’ (cinco destas festividades foram suprimidas em 1977); o art. 14
  afirma: ‘As tropas italianas de ar, de terra e de mar gozam, nos cuidados dos
  deveres religiosos, dos privilégios e das isenções consentidas pelo direito
  canónico...’; o art. 29 afirma que ‘...b) Será reconhecida a personalidade
  jurídica das associações religiosas, com ou sem votos, aprovadas pela Santa
  Sé, que tenham a sua sede principal no Reino, e sejam ali representadas...
  Será reconhecida por fim a personalidade jurídica às Casas generalícias e às
  Procuradorias das associações religiosas, também estrangeiras. As associações ou as Casas religiosas, que já
  tenham personalidade jurídica, a conservarão. As acções relativas à
  transferência de imóveis, dos quais as associações já estão em posse, dos
  actuais proprietários para as associações serão isentas de todo tributo...
  h)... não será aplicado aos ministros do culto pelo exercício do ministério
  sacerdotal o imposto sobre as profissões e a taxa de patente, instituído com
  o Régio decreto de 18 de Novembro de 1923, n° 2538, em lugar da suprimida
  taxa de exercício e revenda, nem qualquer outro tributo do género’; o art. 30
  que ‘o Estado Italiano reconhece aos institutos eclesiásticos e às
  associações religiosas a capacidade de adquirir bens, salvo as disposições
  das leis civis concernentes às aquisições dos corpos morais’; o art. 34 diz
  que ‘o Estado italiano, querendo devolver ao instituto do matrimónio, que é a
  base da família, dignidade conforme às tradições católicas do seu povo,
  reconhece ao sacramento do matrimónio, disciplinado pelo direito canónico, os
  efeitos civis... As causas concernentes a nulidade do matrimónio e a
  dispensa do matrimónio rato e não consumado são reservadas à competência dos
  tribunais e dos dicastérios eclesiásticos. As disposições e as sentenças
  relativas, quando sejam tornadas definitivas, serão levadas ao Supremo
  Tribunal da Assinatura, o qual controlará se foram respeitadas as normas do
  direito canónico relativas à competência do juiz, à citação e à legítima
  representação ou contumácia das partes. As ditas disposições e sentenças
  definitivas com os relativos decretos do Supremo Tribunal da Assinatura serão
  transmitidos à Corte de Apelo do Estado competente por território, a qual,
  com ordenanças emitidas em câmera de conselho, os tornará executivos para
  efeitos civis e ordenará que sejam anotados nos registos do estado civil
  junto da acta de matrimónio’; o art. 36 diz: ‘A Itália considera fundamento e
  coroamento da instrução pública o ensino da doutrina cristã segundo a forma
  recebida da tradição católica. E por isso consente que o ensino religioso
  agora aprendido nas escolas públicas elementares tenha um ulterior
  desenvolvimento nas escolas médias, segundo programas a estabelecer-se de
  acordo entre a Santa Sé e o Estado’; l’art. 40 afirma: ‘As licenciaturas em
  sagrada teologia dadas pelas Faculdades aprovadas pela Santa Sé serão
  reconhecidas pelo Estado Italiano. Serão igualmente reconhecidos os diplomas,
  que se conseguem nas escolas de paleografia, arquivologia e diplomática
  documentária erectas na biblioteca e no arquivo da Cidade do Vaticano’.   | 
 
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   Além de tudo isto o Estado italiano se obrigou
  a dar muito dinheiro ao Vaticano, na Convenção Financeira lê-se no art. 1 que
  ‘a Itália se obriga a depositar, em troca das ratificações do Tratado, à
  Santa Sé a soma de liras italianas 750.000.000 (setecentos e cinquenta
  milhões) e a entregar contemporaneamente à mesma um consolidado italiano 5
  por cento ao portador (com cupão vencendo-se a 30 de Junho p.v) do valor
  nominal de liras italianas 1.000.000.000 (mil milhões)’ [59].  | 
 
| 
   Mas o que obteve o Estado italiano da igreja
  católica romana em troca de todos os favores e privilégios lhe concedidos (se
  tenha presente que não os citei todos)? Isto, que encontramos nos art. 12,
  19, 20, 21 e 43 da Concordata. O art. 12 afirma: ‘Nos Domingos e nas festas
  de preceito, nas Igrejas em que oficia um Capítulo, o celebrante da Missa
  Conventual cantará, segundo as normas da liturgia sagrada, uma oração pela
  prosperidade do Rei de Itália e do Estado italiano’; o art. 19 que ‘antes de
  proceder à nomeação de um Arcebispo ou de um bispo diocesano ou de um
  coadjutor cum jure successionis, a Santa Sé comunicará o nome da pessoa
  escolhida ao Governo italiano para assegurar que o mesmo não tenha razões de
  carácter político a levantar contra a nomeação. As relativas práticas se
  desenvolverão com a maior solicitude possível e com toda a discrição, de modo
  que seja mantido o segredo sobre a pessoa escolhida, até que não ocorra a
  nomeação da mesma’; o art. 20 diz: ‘Os bispos, antes de tomar posse da sua
  diocese, prestam nas mãos do Chefe do Estado um juramento de fidelidade...’;
  o art. 21 diz: ‘As nomeações dos investidos de benefícios paroquiais são da
  autoridade eclesiástica competente comunicadas reservadamente ao Governo
  italiano e não podem ter curso antes que sejam passados trinta dias da
  comunicação. Ao fim deste prazo, o Governo italiano, quando graves razões se
  oponham à nomeação, pode manifestá-las reservadamente à autoridade
  eclesiástica, a qual, permanecendo a divergência, deferirá o caso para a
  Santa Sé’; o art. 43 por fim afirma: ‘O Estado italiano reconhece as
  organizações dependentes da Acção Católica Italiana, enquanto elas, como a
  Santa Sé dispôs, desenvolvam a suas actividades fora de todo o partido
  político e sob a imediata dependência da hierarquia da Igreja para a difusão
  e actuação dos princípios católicos. A Santa Sé aproveita a ocasião da
  estipulação da presente Concordata para renovar a todos os eclesiásticos e
  religiosos de Itália a proibição de se inscreverem e militar em qualquer
  partido político’ [60].   | 
 
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   Pio XI expressa a sua satisfação pela
  Concordata em 13 de Fevereiro de 1929 falando aos professores e aos alunos da
  Universidade católica do Sagrado Coração nestes termos: ‘Nos era necessário
  um homem como o que a Providência nos fez encontrar, um homem que não tivesse
  as preocupações da escola liberal... E com a graça de Deus, com muita
  paciência, com muito trabalho, com o encontro de muitos e hábeis
  favorecimentos, conseguimos ‘per medium profundum’ concluir uma Concordata,
  que se não é a melhor de quantas delas possam haver, está certamente entre as
  melhores’ [61].   | 
 
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   Em 18 de Fevereiro de 1984 a ‘Santa Sé’ e a
  República Italiana assinaram uma Nova Concordata que trouxe modificações à
  Concordata Lateranense. A primeira diferença que se nota nesta nova
  Concordata é que à diferença da anterior esta não traz à cabeça a expressão
  ‘Em nome da Santíssima Trindade’. Uma outra diferença a se nota no primeiro
  ponto do protocolo adicional segundo o qual ‘se considera não mais em vigor o
  princípio, originariamente reclamado pelos Pactos Lateranenses, da religião
  católica como única religião do Estado italiano’ [62].
  Pelo que qualquer um é ‘livre’ (apesar de o Estado italiano continuar a
  assegurar o ensino da religião católica nas escolas públicas não
  universitárias de todas as ordens e graus) na escola de valer-se ou não do
  ensino católico. O art. 9 afirma com efeito que ‘no respeito da liberdade de
  consciência e da responsabilidade educativa dos pais, é garantido a cada um o
  direito de escolher se valer-se ou não valer-se de dito ensino’ [63].   | 
 
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   Por quanto respeita às facilitações fiscais
  lê-se no art. 7 que ‘para efeitos tributários as entidades eclesiásticas que
  têm fim de religião ou de culto, como também as actividades dirigidas com
  tais objectivos, são equiparadas às que têm fim de beneficência ou de
  instrução’ (n.3), mas também que ‘as actividades diferentes das de religião
  ou de culto, desenvolvidas pelas entidades eclesiásticas, estão sujeitas, no
  respeito da estrutura e da finalidade de tais entidades, às leis do Estado
  respeitantes a tais actividades e ao regime tributário previsto para as
  mesmas’ (n.3).  | 
 
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   Também a propósito do matrimónio nesta nova
  Concordata nota-se alguma diferença, com efeito o art. 8 depois de ter
  afirmado que ‘são reconhecidos os efeitos civis aos matrimónios contraídos
  segundo as normas do direito canónico, na condição que a acta relativa seja
  transcrita nos registos do estado civil, prévias publicações na casa comunal’
  afirma: ‘Considera a Santa Sé que a transcrição não poderá ter lugar: a)
  quando os esposos não respondam aos requesitos da lei civil acerca da idade
  exigida para a celebração; b) quando subsiste entre os esposos um impedimento
  que a lei civil considera inderrogável’. Quanto depois às sentenças de
  nulidade pronunciadas pelos tribunais eclesiásticos elas são equiparadas a
  sentenças estrangeiras, portanto é introduzido o instituto da deliberação.   | 
 
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   Como reage o
  papado quando um governo de uma nação se põe contra a igreja católica romana
  tirando-lhe os seus privilégios   | 
 
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   O Estado ‘Cidade do Vaticano’ é um Estado
  anómalo porque além de ser um Estado é também uma organização religiosa que
  possui centenas de milhões de membros em todo o mundo que apesar de não
  poderem definir-se cidadãos do Estado ‘Cidade do Vaticano’, porque são
  cidadãos de um outro Estado, têm como seu chefe quem governa este minúsculo
  Estado presente sobre a península italiana pelo que se encontram a ter que
  obedecer a dois chefes de Estado, o da sua nação da qual são efectivamente
  cidadãos e onde habitam e o do Estado do Vaticano aqui em Roma porque ele se
  considera também o chefe visível da igreja de que eles fazem parte e fora da
  qual - segundo eles - não há salvação. Naturalmente no caso de o chefe do
  Estado do qual eles fazem parte ir contra os interesses da igreja católica
  romana eles são obrigados a desobedecer ao chefe da sua nação e a
  opor-se-lhe com a força para obedecer ao seu sumo pontífice que para eles é o
  vigário de Cristo na terra não importa o que ele diz sob pena de excomunhão
  que comprometeria o seu destino eterno. Leão XIII (1878-1903) o disse
  claramente na encíclica Sapientiae Christianae o que devem fazer os
  cidadãos católicos neste caso: ‘Se as leis do Estado abertamente divergem do
  direito divino, se impõem ofensas à Igreja ou contrariam os deveres
  religiosos ou violam a autoridade de Jesus Cristo no seu Vigário, então é
  dever resistir e culpa obedecer..’ (aquele ‘resistir’ significa insurgir
  contra a autoridade civil). Eis por que muitos chefes de Estado procuram
  conciliar o favor do papa de Roma porque sabem que tendo o seu favor terão os
  seus cidadãos de religião católica do seu lado. E eis por que ainda o papa
  consegue influenciar politicamente muitas nações da terra porque sabe ter
  debaixo de si muitas e muitas pessoas, que estão convencidas que a sua
  salvação eterna depende dele e que para não irem para o inferno estão
  portanto prontas a obedecer-lhe em tudo e em todo lugar, pelo que ele se faz
  forte porque sabe tê-las do seu lado ou melhor no punho. Façamos um exemplo
  explicativo. Ponhamos o caso de que o Governo italiano um dia emanasse uma
  lei que ordena destruir todas as chamadas estátuas e imagens sagradas
  presentes em território italiano porque considera que elas sejam ídolos e
  suprimir as peregrinações que se fazem aqui a Itália e as procissões do
  Corpus domini e a oração a Maria, e tirar à igreja papista todos os seus
  privilégios (entre os quais recordamos está a isenção de impostos e tributos
  de vários géneros), etc. O que aconteceria? Que isso faria enfurecer o papa
  que lançaria logo uma excomunhão tanto contra o Governo italiano como contra
  todos os que ousassem destruir as estátuas e as imagens e obedecer às outras
  ordens governativas. E como o Governo italiano seria considerado herético e
  apóstata por ter tomado estas decisões os cidadãos italianos católicos não
  seriam mais obrigados a obedecer-lhe (porventura também não pagando os
  impostos) para não serem considerados também eles heréticos e apóstatas.
  Sucederia também que muitos zelosos Católicos (incitados e ajudados como
  sempre sucede nestes casos pelos Jesuítas) se revoltariam também contra o governo
  fomentando tumultos de todo o género, e, como sempre aconteceu nestes casos,
  muitos ficariam feridos e mortos. E porquê tudo isso? Por medo de incorrer na
  excomunhão do papa que os privaria do paraíso, a seu dizer. Mas há mais,
  poderia também suceder de o papa chamar o exército de uma nação sua amiga
  sobre território italiano a fim de defender as suas estátuas e as suas
  imagens e permitir as peregrinações e as procissões e que se continue a dizer
  o Avé Maria, e para restaurar a ‘liberdade cristã’ nesta nação (o que
  significa para fazer voltar a igreja católica à posse de todos os seus
  privilégios para que possa continuar a desenvolver tranquilamente a sua
  missão) em outras palavras para impedir que as referidas ordens governativas
  sejam postas em prática, e assim o Estado italiano se acharia invadido por um
  exército estrangeiro e obrigado a defender-se com a força pelo que muitos
  cairiam mortos. Recordai-vos de facto que o papa está à cabeça de um Estado e
  como chefe de Estado pode chamar em sua ajuda uma nação estrangeira quando
  estão em jogo os seus interesses económicos e temporais em Itália ou em
  alguma outra nação. Sucederia em suma o que já sucedeu no passado; nada de
  novo. Porventura alguns, ouvindo-nos falar desta maneira, dirão que
  semelhantes coisas não podem mais suceder no nosso século. Mas estes se
  enganam grandemente e para demonstrá-lo citarei dois casos ocorridos neste
  vigésimo século em que a igreja católica romana quando o governo de uma nação
  se pôs contra ela comprometendo os seus grandes interesses ela lançou-se
  contra ele fomentando entre o povo a revolução contra o governo a seu dizer
  rebelde. Os casos são os da Espanha e da Argentina, dois países onde a igreja
  católica gozou e goza ainda de muitos privilégios.  | 
 
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   Em
  14 de Abril de 1931 os espanhóis proclamaram a República. A nova
  constituição decretou a completa separação entre igreja e Estado. Entre as
  disposições contra a igreja católica estavam as seguintes: foi proibido o
  ensino às ordens religiosas porque o Estado adquiriu o monopólio sobre a
  educação, o Estado deixou de pagar os ordenados aos párocos com o dinheiro
  público e de manter às suas custas o aparelho da igreja, foi dissolvida a
  Companhia de Jesus e os seus bens foram confiscados. Em outras palavras a
  República espanhola não esteve disposta a reconhecer ‘a liberdade da Igreja’
  como a reconhecia o governo de Mussolini em Itália. Tais disposições
  constituiram um grande ataque aos enormes interesses da igreja católica então
  muito poderosa, rica e cheia de privilégios sobre território espanhol. Os
  Jesuítas tinham de facto o controlo da instrução pública, um terço das terras
  pertencia às congregações religiosas e a igreja tinha enormes somas de
  dinheiro investido nos bancos, nas indústrias, nos negócios. A 16 de
  Fevereiro de 1936 a Frente Popular dos republicanos venceu as eleições às
  Cortes (antes das eleições, Gomá, o cardeal primaz da Espanha, tinha ordenado
  aos Católicos para votar contra as forças republicanas). As hierarquias
  eclesiásticas então, com os Jesuítas à cabeça, sustentaram que os Católicos
  tinham o direito de se insurgir contra o governo da república espanhola. A 17
  de Julho de 1936 rebentou a revolta militar contra a República espanhola;
  esta revolta foi conduzida pelo general Franco, foi preparada pelas hierarquias
  eclesiásticas, e sustentada por Hitler e Mussolini com armas e homens (na
  América entretanto a imprensa católica apresentava o conflito em acção em
  Espanha como uma guerra santa para a salvação do cristianismo, e a igreja
  católica tinha um papel decisivo em impedir que fosse tirado o embargo de
  armas para Espanha, armas que muitos consideram permitiriam às forças
  republicanas vencer o conflito). A revolta, que levou ao extermínio por parte
  dos fascistas comandados por Franco de dezenas de milhar de pessoas, teve o
  sustento dos cardeias e dos bispos e recebeu a benção e a aprovação papal que
  pensava desta maneira poder retomar o seu domínio em Espanha. As forças
  armadas comandadas por Franco (que incluiam alemães e italianos no seu
  interior) levaram a melhor sobre os republicanos e assim a igreja católica
  pôde voltar a ser senhora em Espanha. No caderno de Civiltà Cattolica
  de 28 de Maio de 1938, a revista reportou, do Boletim oficial do
  Estado espanhol, a motivação com a qual o governo nacional tinha dado a
  personalidade jurídica à Companhia de Jesus, restituindo-lhe os bens
  confiscados pelos republicanos: ‘No presente glorioso despertar da tradição
  Espanhola, é parte principal a restauração da Companhia de Jesus em Espanha,
  na plenitude da sua personalidade, e isto por várias razões. Em primeiro
  lugar, para reparar devidamente a injustiça consumada contra ela. Em segundo
  lugar, como o Estado espanhol reconhece e afirma a existência da Igreja
  católica como sociedade perfeita, com a plenitude dos seus direitos, assim
  deve também reconhecer a personalidade jurídica às Ordens religiosas
  canonicamente aprovadas, como é a Companhia de Jesus desde Paulo III, e
  posteriormente por Pio VII e pelos seus sucessores. Em terceiro lugar, por
  ser a Companhia de Jesus uma Ordem eminentemente espanhola, e de grande
  significado universal, que faz acto de presença no ápice do Império espanhol,
  participando intensamente em todas as suas vicissitudes, de modo que, com
  feliz coincidência, andam sempre juntas na história as perseguições contra
  ela e o processo de desenvolvimento do anti-Espanha. Finalmente, pelo enorme
  seu aporte cultural, que tanto contribuiu para o engrandecimento da nossa
  Pátria e para o aumento do tesouro científico da humanidade; por isso
  Menendes y Pelayo qualificou a perseguição contra ela um golpe mortal para a
  cultura espanhola e um atentado brutal e obscurantista contra a ciência e as
  letras humanas’. A 19 de Maio de 1939 Franco fez a sua entrada triunfal em
  Madrid. Pio XII no dia da vitória lhe enviou esta mensagem: ‘Elevando o nosso
  coração a Deus, damos graças a Ele e a Vossa Excelência pela desejada vitória
  da Espanha católica e oramos para que este nosso dilecto país, encontrada a
  paz, renove energicamente a sua antiga tradição cristã que o fez tão grande.
  Com tais sentimentos enviamos a V. E. e a todo o povo espanhol a nossa benção
  apostólica...’. O regime de Franco se desendividou para com a casta
  eclesiástica católica; lhe restituiu e até aumentou as suas possessões,
  introduziu especiais taxas a favor dos fundos eclesiásticos e assumiu a cargo
  do orçamento do Estado o mantimento da igreja e do clero, e a religião
  católica foi proclamada única religião de Estado.   | 
 
| 
   Da Espanha desloquemo-nos para a Argentina ao
  tempo em que governava o general Perón. A Argentina foi sempre um país
  católico, tanto que segundo a constituição de 1853 o Presidente e o
  Vice-Presidente da República deviam pertencer ‘à comunhão católica apostólica
  romana’. O general Perón foi eleito Presidente da República Argentina em 1946
  e esta sua eleição teve o benévolo consentimento da igreja católica romana.
  Subido ao poder Perón favoreceu a igreja católica romana aumentando as
  côngruas do clero e introduzindo novamente a instrução religiosa nas escolas.
  Ele mesmo demonstrava ser um Católico convicto porque invocava com
  apropriadas cerimónias Maria e os Santos para especiais protectores de
  particulares instituições; tanto ele como sua mulher Evita assistiam a
  funções religiosas e comungavam em público. A 15 de Novembro de 1953 de
  joelhos na Plaza de Mayo tinha até dirigido uma especial oração a Maria. Tudo
  deixava portanto pressagiar que a igreja católica sob o seu regime gozaria do
  favor do governo. Mas para o fim de 1954 as coisas tomaram um mau rumo para a
  igreja católica romana [64]; o Congresso
  em poucos meses aprovou muitas leis contra ela; supressão do ensino
  religioso, dos subsídios governamentais às escolas privadas, legalização do
  divórcio, abolição da isenção fiscal para os bens destinados ao culto,
  supressão do calendário civil das festas religiosas da Epifania, do Corpus
  Domini, da Assunção, de Todos os santos, da Imaculada Conceição e o
  encerramento dos locais da Acção Católica. O L’Osservatore Romano declarou
  tal política opressiva para o catolicismo. No princípio de 1955 mais de cem
  religiosos tinham sido privados da cátedra ou exonerados como inspectores
  escolares, e 200 escolas livres tinham sido fechadas. Em vez dos professores de religião apareceram
  nas escolas elementares e médias ‘conselheiros espirituais’. No fim de Junho 125
  religiosos e leigos católicos estavam na prisão por actividades sediciosas. Foi
  depois aprovado um projecto de lei que declarava tributáveis os conventos, os
  lugares de culto da igreja católica e em geral as propriedades eclesiásticas.
  A 16 de Junho o Vaticano excomungou ‘todos os que tinham espezinhado os
  direitos da Igreja’; embora Perón não fosse nomeado percebeu-se muito bem que
  a medida era dirigida para atingi-lo directamente (fazemos presente que a
  excomunhão o Vaticano não a lançou nem contra Hitler quando invadia outras
  nações e exterminava milhões de pessoas nos campos de concentração). Contemporaneamente
  à excomunhão papal, em Buenos Aires rebentou a revolta que tinha sido
  preparada pelo clero católico. Em Junho de 1955 alguns aviões militares
  bombardearam o Palácio do Governo e outros edifícios públicos; o ataque fez
  cerca de trezentas vítimas entre a multidão além de um milhar de feridos; mas
  poucas horas depois a insurreição era sufocada. O L’Osservatore Romano então
  anunciou abertamente que o Vaticano não desistiria da sua ofensiva senão
  depois de ter conquistado a autoridade secular na Argentina: ‘Quando um chefe
  se rebela contra Deus subscreve a sua própria condenação’ - ameaçou o orgão
  de imprensa do vaticano. Após
  alguns meses de tréguas a revolta rebentou de novo em meados de setembro de
  1955. Uma bomba caiu sobre a Capital Federal e se falou de 350
  vítimas; então o excomungado presidente Perón decidiu demitir-se e deixar a
  Argentina para ‘salvar a nação do massacre’ que tinha começado por obra do
  clero católico.  | 
 
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   Estes factos ocorridos em meados deste século
  mostram pois de maneira clara como o papado não mudou em nada; ele está ainda
  pronto a lançar excomunhões e a fomentar revoluções e violências de todo o
  género contra aqueles governos que decidem ‘oprimir’ a igreja católica romana
  nos seus países. Ninguém pois se iluda sobre o real carácter do papado; ele
  como na antiguidade é ainda uma besta feroz pronta a despedaçar os seus
  inimigos. Os sorrisos do papa, as suas doces palavras, os seus apertos de
  mão, os seus encorajamentos para fazer o bem, são apenas máscaras debaixo das
  quais se esconde um homem que se vê que algum chefe de Estado ousa pôr-se a
  ‘perseguir’ a sua igreja está pronto a encorajar o assassínio e a violência
  para remover o ‘perseguidor’. Mas está também pronto a calar, a fingir que
  nada vê, a não dizer uma palavra, no caso de um ditador, com quem ele se
  aliou e favorece a igreja católica, se abandonar a prepotências e violências,
  e crimes de todo o género contra os Hebreus, Protestantes, etc., para não
  perder a sua amizade e portanto os seus favores e privilégios. As excomunhões
  ele só as lança contra quem prejudica fortemente os interesses da igreja
  católica.  | 
 
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   Dois sonhos e
  uma visão dados por Deus sobre o presente papa  | 
 
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   Termino esta minha confutação sobre o papado
  referindo-vos o que eu e meu irmão sonhámos e o que uma nossa irmã em Cristo
  viu em visão acerca de João Paulo II [65].
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   Alguns anos atrás em sonho eu me vi em frente
  de Wojtyla e disse-lhe apontando o dedo contra ele: ‘Tu estás mandando para o
  inferno milhões de pessoas!’  | 
 
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   Meu irmão sonhou que se encontrava deitado e
  Wojtyla enfurecido batia-lhe no peito, e ele (meu irmão) disse-lhe: ‘A Igreja
  não é tua mas de Deus’.  | 
 
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   A irmã Maria (enquanto tinha os olhos abertos)
  o viu em visão vestido de branco com um colar negro ao seu pescoço. Esta
  visão foi-lhe concedida por Deus uma noite poucos instantes depois de eu ter
  referido na presença dela e de meu irmão o sonho que tinha tido sobre o papa
  anos antes e que referi acima.  | 
 
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   Quem
  tem ouvidos para ouvir ouça.  | 
 
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   CONCLUSÃO  | 
 
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   Vimos na segunda parte deste capítulo como
  surgiu este pequeno Estado ‘Cidade do Vaticano’, que exerce um enorme poder
  político sobre a face da terra [66].
  Para resumir muito brevemente a história do papado podemos dizer quanto
  segue. Se começou a dizer que a Igreja de Roma tinha sido fundada por Pedro e
  que ele tinha cumprido aí um longo episcopado, depois - fazendo alavanca
  sobre palavras de Jesus a Pedro - que Pedro tinha sido constituído príncipe
  dos apóstolos e chefe da Igreja e que à sua morte tinha deixado o seu ofício
  ao bispo de Roma, seu sucessor. Quando depois a Igreja começou a receber
  honras e privilégios do Imperador romano o bispo de Roma, apoiado pelo
  Imperador, reforçou notavelmente a sua posição até se tornar uma autoridade
  política à cabeça de um reino terreno e a considerar-se o chefe da Igreja
  universal. Acrescentemos a tudo isso as fraudes de todo o género, os enganos,
  as intrigas dos bispos de Roma e as alianças com os príncipes e os reis que
  se sucederam no curso dos séculos, e as guerras sangrentas excitadas pelos
  papas para salvaguardar os seus interesses e estender o seu poder e eis o
  papado de hoje. Muito tempo nos seria preciso para contar de maneira
  aprofundada a longa história do papado; por isso quis citar apenas os factos
  principais. Mas mesmo sem tê-la contada toda estou convencido que bem
  compreendestes como ele se funda sobre a arrogância, sobre a mentira e sobre
  prepotências e violências de todo o género perpetradas pelos bispos de Roma.
  Foi fundado sobre o erro e construído com o sangue, a violência e a fraude, e
  continua a subsistir mediante a sua arrogância e a sua maldade. Mas vem o dia
  que Deus lhe fará cair sobre a sua cabeça toda a violência e a maldade por
  ele perpetrada contra a humanidade em todos os tempos. Sim porque o papado
  fez mal tanto materialmente como espiritualmente a muita gente; derramou e
  fez derramar muito sangue; perpetrou crueldades de todo o género sem fim
  contra os homens; e seduções também. Deus viu e ouviu tudo, Deus vê e ouve
  tudo; e ele a seu tempo fará justiça de todo o sangue dos mártires de Jesus
  que ele derramou e fez darramar; ele fará justiça de todas as mentiras que
  ele pregou usando-se do seu santo nome.  | 
 
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   Com o papado não deve ser feita nenhuma
  aliança. A única coisa que vale a pena fazer em relação a ele é
  desmascará-lo, isto é, demonstrar como ele não é parte integrante da Igreja
  de Cristo, que não está - como ao invés querem fazer crer os Católicos - na
  base da Igreja, porque ele se opõe à Igreja de Deus, coluna e base da
  verdade, da mesma maneira em que se opõe o reino do diabo. Mas o faz de uma
  maneira particular, com sofismas todos particulares. Certamente o papado faz
  parte do reino do diabo; mas infelizmente muitos não se apercebem disso,
  porque na sua fronte traz a expressão ‘santa igreja católica apostólica
  romana’. Mas vem aquele dia em que todos, do primeiro ao último verão o que é
  verdadeiramente o papado.  | 
 
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   NOTAS  | 
 
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| 
   [1]
  Anteriormente ao concílio Vaticano I muitos Católicos negavam a
  infalibilidade papal. Por exemplo, nos Estados Unidos antes do Vaticano I
  tinha sido publicado o livro Controversial Catechism que trazia o Imprimatur
  do arcebispo de New York, Hughes, em que havia a seguinte pergunta com a
  relativa resposta: ‘Pergunta: os católicos não devem crer que o papa é
  infalível? Resposta: é uma invenção dos protestantes, e não um dogma da fé
  católica; nenhuma sua decisão pode ser vinculativa sob pena de heresia, a
  menos que seja aceite e aplicada pelo corpo doutrinal, isto é, pelos bispos
  da Igreja’. Esta pergunta foi suprimida do Catechism na posterior
  edição. A razão é evidente, depois do Vaticano I a infalibilidade papal não
  era mais uma invenção dos Protestantes mas um dogma católico a aceitar por
  força, sob pena de excomunhão.   | 
 
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   | 
 
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   [2] A propósito
  da votação deste dogma deve ser dito que na véspera da votação cento e
  cinquenta e cinco bispos da oposição deixaram Roma em sinal de protesto,
  depois de terem subscrito uma declaração em que afirmavam que, em sinal de
  respeito pelo papa, preferiam abster-se da votação pública do que pronunciar
  diante do papa o non placet. Na votação depois entre os 535 chamados
  padres presentes 533 votaram a favor da aprovação do dogma enquanto 2 (o
  cardeal americano Kenrick e o italiano Guidi) disseram non placet.   | 
 
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   | 
 
| 
   [3] As
  declarações feitas por um papa ex-catedra, sobre as quais no âmbito católico
  há unanimidade, são raras. A definição da imaculada conceição, feita por Pio
  IX em 1854, foi por exemplo uma delas, uma outra foi a da assunção de Maria
  ao céu feita por Pio XII em 1950 com o relativo anátema contra quem a negar.
  Porém ainda não foi formulado um elenco de todas as declarações ex-catedra
  feitas pelos papas até agora. Como também não foi invocada a infalibilidade
  sobre declarações que concernem ao sacerdócio das mulheres, ao aborto, etc.
  De maneira que nem os Católicos sabem com certeza quais são as declarações
  dos seus papas em que devem crer como infalíveis. Mas aliás este
  comportamento do papado é compreensível; não lhe convém de facto fazer uma
  coisa que lhe impediria no futuro de desmentir alguma das suas actuais
  tomadas de posição e de introduzir outros dogmas. Sabe-se de facto que na
  tradição católica com o passar do tempo entram a fazer parte novas leis e
  novos dogmas papais que vão desmentir as de papas anteriores. Em outras
  palavras, o facto de muito raramente se ouvir dizer que o papa falou
  ex-catedra ou de esta ou aquela outra declaração foi feita ex-catedra
  demonstra que os próprios papas se dão conta do perigo que correm ao falar
  ex-catedra. João XXIII (1958-1963) teve a afirmar um dia: ‘Não sou infalível.
  Seria infalível somente se falasse ex catedra, coisa que não tenho intenção
  de fazer’. Esta sua afirmação que parece uma piada na realidade faz perceber
  o porquê de os papas não recorrerem com frequência a falar ex catedra.   | 
 
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   | 
 
| 
   [4] Ele tem o
  seu pessoal confessor, mas particularidade da sua confissão é que o confessor
  no fim recebe a benção do papa. ‘Sabe-se que ordinariamente às Sextas-feiras
  ao anoitecer o confessor do Papa se dirige ao Vaticano para ouvir a confissão
  dele como a de todo o fiel. Única diferença é que, depois da confissão, o
  confessor recebe a benção do Papa’ (Giuseppe Perardi, op. cit., pag.
  209).   | 
 
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   | 
 
| 
   [5] Libério
  tinha sido enviado para o exílio pelo imperador Constâncio porque se tinha
  oposto à deposição de Atanásio, ele sustentava de facto juntamente com
  Atanásio a idêntica natureza entre o Pai e o Filho (Ário ao invés sustentava
  que o Filho tinha sido criado e por isso não era da mesma substância e
  natureza do Pai). Mas enquanto estava no exílio escreveu cartas em que aderia
  à doutrina de Ário e excomungava Atanásio, a fim de cativar a amizade do
  imperador e poder voltar assim para Roma. Jerónimo escreveu: ‘Libério vencido
  pelo tédio do exílio, subscrevendo à maldade herética, entrou vitorioso em
  Roma’. Também Hilário e Atanásio censuraram a Libério a subscrição da heresia
  ariana.   | 
 
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   [6] O termo
  ortodoxo deriva das palavras gregas orthos que significa ‘correcto’ ou
  ‘direito’, e doxa que significa ‘opinião’ ou ‘honra’ e é usado para
  definir quem ensina a recta doutrina. Quando porém este termo é usado em
  referência aos Ortodoxos gregos é necessário dizer que é usado impropriamente
  porque a igreja ortodoxa greco-bizantina, de que dizem fazer parte, não
  possui uma doutrina recta.   | 
 
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   [7] Por esta
  razão este papa definiu heréticos os Franciscanos e os funcionários civis
  foram obrigados a enviá-los para a fogueira sob pena de serem tratados eles
  mesmos como heréticos.   | 
 
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   [8] Afirmação
  esta última que se desencontra com esta presente no decreto de Graciano:
  ‘Ninguém pode julgar os pecados do papa, porque ele pode julgar os homens,
  mas não ser julgado por algum, a menos que seja achado culpado de heresia’ (Decretum
  Gratiani, Divis. 1 Dist. XI c. 6), e com o que disseram outros teólogos
  papistas do passado. Pedro D’Ailly (m. 1420) por exemplo afirmou
  explicitamente que o papa pode errar em matéria de fé, como fez Pedro quando
  Paulo lhe resistiu na cara; e Gerson (m. 1429) disse que o papa pode errar,
  como Pedro.   | 
 
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   [9] A primeira
  canonização, de que existe ainda o documento pontifício, é a de Udalrico,
  bispo de Augusta, executada por João XV em 993 durante o Sínodo celebrado no
  Latrão. Segundo a Enciclopédia Católica o mérito de ter dirigido o
  procedimento canónico da canonização à austeridade e segurança que ainda
  vigora pertence a Urbano VIII (1623-1644) o qual fez publicar num pequeno
  volume todos os decretos e os sucessivos esclarecimentos emanados durante o
  seu longo governo em matéria de canonização, que tem de título Urbani VIII
  Pont. O. M. Decreta servanda in canonizatione et beatificatione sanctorum.   | 
 
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   [10] A
  propósito da cerimónia de coroação deve ser dito que antigamente era
  circundada de uma pompa e um luxo extraordinário. Com João Paulo I (1978)
  porém desapareceu uma parte da pompa e do luxo que a caracterizava. Foram com
  efeito banidos alguns luxos: nada de trirregno, nada de cadeira gestatória,
  nada de guardas nobres. Só o altar branco onde é celebrada uma missa pela sua
  consagração; depois a ‘profissão de obediência’ dos cardeais que desfilam
  diante dele, com o beijo do anel e o abraço. João Paulo II se adequou às
  inovações do seu predecessor.   | 
 
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   [11] Eis alguns
  exemplos; da morte de João XXI (1276-1277) à eleição de Nicolau III
  (1277-1280) a sede esteve vacante por seis meses; da morte de Nicolau IV
  (1288-1292) à eleição de Celestino V (1294) a sede esteve vacante por vinte e
  sete meses; da morte de Clemente V (1305-1314) à eleição de João XXII
  (1316-1334) a sede esteve vacante por cerca de dois anos.  | 
 
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   [12] Cuidai que
  com isto não se quer dizer que o papado não tenha surgido por querer de Deus
  porque sendo um Estado como tantos outros foi Deus que o fez surgir: sobre
  isto não há a mínima dúvida. Mas queremos apenas dizer que o papado não é a
  Igreja que Deus edificou sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas
  sendo ele mesmo a pedra angular, e portanto não tem nenhum direito de dizer
  que as suas origens remontam a Cristo quando ele disse a Pedro: "Tu és
  Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja...". Portanto nós não
  negamos que ele seja um Estado, mas negamos da maneira mais categórica que
  ele seja o resultado natural, espontâneo e justo das supraditas palavras do
  Senhor a Simão Pedro. O papado não tem nada a ver com o Evangelho, como o
  joio não tem nada a ver com o trigo.   | 
 
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   [13] A Vítor se
  opôs também Ireneu, bispo de Lião. É necessário dizer porém que o mesmo
  Ireneu com algumas suas palavras contribuiu para o nascimento do primado do
  bispo de Roma sobre toda a Igreja, com efeito ele disse: ‘Mas porque seria
  demasiado longo nesta obra enumerar as sucessões de todas as Igrejas,
  tomaremos a Igreja grandíssima e antiquíssima e a todos conhecida, a Igreja
  fundada e estabelecida em Roma pelos dois gloriosíssimos apóstolos Pedro e
  Paulo. Mostrando a tradição recebida dos Apóstolos e a fé anunciada aos
  homens que chegou até nós através das sucessões dos bispos confundamos todos
  aqueles que de alguma maneira, ou por enfatuação ou por vanglória ou por
  cegueira e por erro de pensamento, se reúnem além do que é justo. De facto com
  esta Igreja, em razão da sua origem mais excelente, deve necessariamente
  estar de acordo toda a Igreja, isto é, os fiéis que são de toda a parte - ela
  na qual por todos os homens sempre foi conservada a tradição que vem dos
  Apóstolos’ (Ireneu, Contra as heresias, Milano 1981, Livro III, pag.
  218). Não obstante esta oposição recebida por Vítor, os teólogos católicos
  persistem em afirmar a origem divina do primado do bispo de Roma. Um escritor
  disse por exemplo que a supremacia do bispo de Roma naquele tempo era
  ‘sentida mas não definida’, um outro diz que ‘Roma desde o fim do século II
  se demonstra consciente de uma missão que ela cumpre com uma rectidão e uma
  firmeza de procedimento deveras surpreendente!’. Conversas vãs, só conversas
  vãs.  | 
 
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   [14] Também no
  caso de Cipriano porém, como no de Ireneu, deve ser dito que apesar de nesta
  ocasião se ter oposto ao bispo de Roma, com palavras suas ele contribuiu para
  fazer surgir o primado do bispo de Roma sobre toda a Igreja. Porque ele
  sustentava que dentre todas as igrejas a de Roma tinha alguma superioridade
  sobre todas as outras. Por exemplo a Cornélio, falando dos cismáticos
  cartageneses, escreveu: ‘Depois de tudo isto, tendo criado até um pseudobispo
  para eles, ousam embarcar e levar à catedra de Pedro e à Igreja principal, da
  qual surgiu a unidade sacerdotal, cartas da parte de cismáticos e profanos’
  (Carta 59, 14). Em outras passagens, de qualquer modo, Cipriano parece
  excluir que para ele o bispo de Roma tivesse um primado de jurisdição sobre a
  Igreja universal, de facto diz: ‘Nós não fazemos violência a algum, nem
  estabelecemos uma lei, visto que no governo da Igreja cada bispo é senhor das
  suas decisões, pronto a prestar contas das suas acções ao Senhor (Carta 72,
  3) e ainda ‘Cada bispo é livre de exercer o seu poder como melhor crê, e não
  pode ser julgado por um outro, nem julgar ele próprio um outro..’.   | 
 
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   Também Firmiliano, bispo de Cesaréia de
  Capadócia (de 230 a após 268), se opôs a Estevão porque não considerava
  válido o batismo dos heréticos. Numa sua carta a Cipriano escreveu palavras
  duras contra Estevão, como por exemplo: ‘Como Judas: a pérfida traição
  consumada impiamente contra o Salvador não pode permitir-lhe apresentar-se -
  nem aparentemente - como promotor dos copiosos frutos maturados pela paixão
  do Senhor, pela qual tem origem a libertação do mundo e dos povos. Mas
  deixemos, entretanto, o comportamento de Estevão, para evitar o perigo, que
  enquanto demoramos na lembrança da sua temeridade e insolência,
  demasiadamente perdure em nós a tristeza causada pelo seu inconveniente modo
  de agir (...) É quanto, pelo contrário, agora ousou consumar Estevão com a
  iniciativa de romper com vós a paz, que sempre, com amor e respeito mútuo, os
  seus predecessores salvaguardaram em relação a nós. Pior: denegriu os
  bem-aventurados apóstolos Pedro e Paulo, como se a transmitir-lhe essas
  normas tivessem sido eles, que ao contrário nas suas cartas aborrecem os
  heréticos e nos dão admoestações, para que nos mantenhamos longe deles. Disto
  se pode tirar a evidente conclusão que é tradição de origem humana a que
  favorece os heréticos, sustentando à força que eles possuem o batismo, que
  não pode pertencer - e de modo completamente exclusivo - senão à Igreja (...)
  A este ponto, devida indignação me sobrevém defronte da evidente e tangível
  loucura de Estevão, sobretudo porque - enquanto anda inchado de soberba pela
  preeminência da sua sede episcopal e reivindica a posse da sucessão de Pedro,
  sobre o qual apoiam os alicerces da Igreja - não hesita em intrometer uma
  grande quantidade de outras pedras e de lançar assim, de fresco, o fundamento
  de outras igrejas, com o apetrecho do sustento da sua autoridade a existência
  de um batismo junto dos heréticos (..) Estevão que também se gloria de ocupar
  por direito de sucessão a cátedra de Pedro, de modo nenhum é estimulado por
  zelo na sua acção defronte aos heréticos...’ (Cipriano, Le lettere [ As cartas]
  , Ventimiglia 1979, pag. 494, 498-499, 510).   | 
 
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   [15] Os
  Gnósticos (não confundir com os agnósticos que são os que dizem que Deus não
  se pode conhecer) que tomavam o nome da palavra grega gnosis que
  significa ‘conhecimento’ estavam subdivididos em diversos grupos e alcançaram
  a sua máxima difusão em meados do segundo século. Para eles a matéria se
  identificava com o mal e o espírito com o bem, pelo que Deus não podia ser o
  criador deste mundo material. O criador do mundo material não era para eles o
  Deus bom de que fala o Novo Testamento mas o Deus do Antigo Testamento, que
  eles chamavam demiurgo e detestavam, e que para eles era uma emanação do alto
  deus do gnosticismo (em outras palavras para eles o Deus do Novo Testamento
  era um Deus totalmente diferente daquele do Antigo). Por quanto respeita a
  Cristo eles afirmavam que dado que a matéria era o mal e ele era absoluto bem
  espiritual ele não podia revestir um corpo humano; ele não podia unir-se à
  matéria. Para eles portanto o Cristo entrou no corpo de Jesus apenas pelo
  período que mediou entre o seu batismo e o início do seu sofrimento na cruz,
  deixando morrer na cruz o homem Jesus. Em outras palavras para eles Jesus não
  era o Cristo. Para eles depois este cristo que habitou em Jesus por um pouco
  de tempo teria ensinado uma especial gnose ou conhecimento que ajudaria o
  homem a salvar-se mediante um processo intelectual. Entre os Gnósticos em Roma
  se difundiram muito os seguidores de um certo Marcião, natural do Ponto.  | 
 
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   [16] Um
  escritor católico a propósito desta carta chega a dizer: ‘É o primeiro texto
  que na prática afirma a superioridade do bispo de Roma sobre todas as Igrejas
  espalhadas no mundo’.   | 
 
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   [17] A esta
  passagem depois foram acrescentadas também a que diz: "Quando te
  converteres, confirma teus irmãos" (Lucas 22:32) e a que diz:
  "Apascenta as minhas ovelhas" (João 21:17).   | 
 
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   [18] Os Cristãos
  foram perseguidos sob Nero (54-68) o qual acusou os Cristãos de Roma de ter
  causado o incêndio que depois destruiu parte da cidade e servindo-se deste
  motivo mandou matar muitos deles, entre os quais alguns queimando-os vivos. A
  tradição diz que foi sob o seu reinado que morreram mártires em Roma tanto o
  apóstolo Paulo como o apóstolo Pedro. Houveram perseguições contra os
  Cristãos também sob Domiciano (81-96): sob o seu império a tradição diz que
  João foi exilado na ilha de Patmos (onde escreveu o livro do Apocalipse). Sob
  Septímio Severo (193-211); sob Maximino (235-238); sob Décio (249-251) que
  ordenou aos Cristãos sacrificar aos deuses e muitos tendo recusado obedecer
  foram mortos; sob Valeriano (253-260); sob Diocleciano (284-305) que proibiu
  aos Cristãos reunirem-se e ordenou a destruição dos seus lugares de culto e
  dos Escritos sagrados, ordenou a deposição e a prisão dos bispos que
  persistiam em testemunhar do Evangelho. Os Cristãos foram punidos com a perda
  das propriedades, com o exílio, a prisão, com a execução por meio da espada
  ou das feras, e com trabalhos forçados.  | 
 
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   [19] Foi ele -
  segundo quanto nos é dito -, para atender aos desejos do bispo de Roma
  Silvestre I, a construir (sobre o túmulo do apóstolo Pedro, dizem) a
  antiquíssima basílica de São Pedro aqui em Roma, basílica que depois no curso
  do tempo seria embelezada por reis e papas e reconstruída a partir do século
  dezasseis por obra de Júlio II, reconstrução que foi terminada na sua
  totalidade no fim do século dezoito. A Fábrica no seu conjunto tinha custado
  até então a soma de cerca de 46.800.000 escudos. Outras basílicas mandadas
  construir pelo imperador aqui em Roma são estas: a basílica de S. Paulo que
  teria sido mandada construir por Constantino após pedido de Silvestre I; a da
  Santa Cruz de Jerusalém após o de sua mãe (nesta basílica sua mãe teria
  colocado um pedaço da verdadeira cruz de Cristo por ela mesma achada na terra
  santa); e a Lateranense que presenteou com estátuas de ouro e de prata,
  candelabros e louça de todo o tipo.   | 
 
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   [20] É dito por
  muitos que Constantino tornou-se um cristão. As suas obras porém não confirmam isso. Sabemos
  de facto que mandou matar sua mulher, um seu filho, mandou construir
  magníficos templos pagãos em Constantinopola, manteve o título de Pontifex
  Maximus (Pontífice Máximo) da religião romana e não deixou de oferecer
  culto ao deus sol.   | 
 
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   [21]
  Constantino deu ao bispo de Roma também o palácio do Latrão, propriedade
  pessoal da imperatriz Fausta; este palácio será a morada dos papas por toda a
  Idade Média.   | 
 
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   [22] Também sob
  outros imperadores os Donatistas foram perseguidos. Sucedeu então que veio a
  formar-se uma classe de gente que simpatizava com os Donatistas os quais
  foram chamados circumcellions porque vagavam em redor das cabanas dos
  camponeses. Estes se dedicaram a vingar-se de todos os que atacavam os
  Donatistas e muitos caíram suas vítimas. Os Donatistas mais moderados
  recusaram aliar-se com eles e aprovar as suas iníquas obras; mas outros
  buscaram a sua ajuda.   | 
 
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   [23] Ário
  sustentava que Deus não foi sempre Pai porque o Filho não existiu sempre. Em
  outras palavras ele negava que Jesus fosse Deus da mesma maneira em que o era
  o seu Pai. O concílio de Nicéia além de condenar a heresia ariana decidiu que
  de então em diante a Páscoa devia ser celebrada na mesma data por toda a
  Igreja; os Orientais tiveram que aceitar assim a posição dos Romanos.   | 
 
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   [24] A
  ingerência nos assuntos civis da cidade e nas vicissitudes políticas por
  parte do bispo de Roma fará exclamar em seguida Gregório Magno: ‘Quem é aqui
  pastor espiritual, está tão carregado de cuidados por coisas exteriores, que
  muitas vezes não se sabe, se ele ocupa o ofício de um pastor espiritual ou o
  de um Grande da terra’.   | 
 
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   [25] É claro
  que não se pode dizer que todos os crentes de então se mostraram de acordo
  com os que permitiram ao imperador imiscuir-se nas coisas espirituais, como
  também nem todos estiveram de acordo que a Igreja se servisse da autoridade
  civil para converter os incrédulos e os heréticos. E isto o dizemos porque
  sabemos que Deus teve sempre um resíduo de homens e mulheres mesmo nos tempos
  mais tenebrosos que se manteve apegado à sua Palavra. Um pouco como hoje em
  suma; muitas igrejas se aliaram com o Estado, mas nem todos os crentes estão
  de acordo com aqueles que contraíram esta aliança.  | 
 
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   [26] Atanásio
  sofreu durante a sua vida bem cinco exílios por causa da sua posição
  antiariana, e isto porque quando naqueles anos subia ao poder um imperador
  que se mostrava a favor da doutrina de Ário este fazia que aqueles bispos que
  se opunham a Ário fossem exilados. Demonstração esta que quando a autoridade
  temporal é feita entrar na Igreja e se lhe permite ditar lei em matéria de
  doutrina (ou em outras palavras quando a Igreja se alia com o Estado), pode
  obrigar a maioria de uma maneira ou de outra (em troca de favores) a aceitar
  também heresias porque tem a força material para fazê-lo e punir aqueles que
  não se quiserem submeter a ela.   | 
 
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   [27] Por
  antipapa os teólogos papistas entendem todo o que tenha recebido o nome de
  pontífice e tenha exercido ou pretendido exercer as funções sem fundamento
  canónico. O antipapa pode ser pois um papa eleito de maneira não canónica,
  após a morte ou a deposição de um pontífice regular, ou um concorrente
  designado em condições duvidosas em frente de um papa regularmente eleito, ou
  ainda um intruso que com a força se tenha imposto durante o pontificado. Ora,
  Félix, que era também ele ariano, é considerado um antipapa mas isto não pode
  corresponder à verdade porque a sua eleição tinha sido regular. A razão é
  clara; era preciso escolher quem pôr dentre os dois na lista dos papas
  legítimos porque ambos não podiam lá estar tendo ocupado o ofício de bispo
  daquela cidade ao mesmo tempo, e se acabou por escolher o velho e excluir o
  novo. Há depois quem afirme, para justificar os acontecimentos, que Félix era
  o vigário de Libério em sua ausência. Mas também isto não é verdade porque
  Félix foi pelo imperador, pelo clero e pelo povo eleito verdadeiramente bispo
  de Roma.   | 
 
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   [28] Seita que
  tomou o nome de um certo Mani ou Maniqueu (216 ca. - 267) proveniente da
  Mesopotâmia. Segundo este a alma mantinha o homem ligado ao reino da luz, mas
  o seu corpo o mantinha escravo do reino das trevas. A salvação acontecia com
  a libertação da luz existente na sua alma da escravidão da matéria do corpo. Esta
  libertação podia ser alcançada por meio da exposição à luz, Cristo. Entre os
  Maniqueus havia uma casta sacerdotal chamados os perfeitos que viviam uma
  vida ascética e executavam alguns ritos essenciais para a emanação da luz. Os
  auditores ou ouvintes tornavam-se participantes da santidade deste grupo
  eleito provendo as suas necessidades materiais, participando assim também na
  salvação. Na seita era exaltada a superioridade do celibato.   | 
 
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   [29] Se tenha
  presente que dois anos antes, ou seja em 449, tinha havido um outro concílio
  convocado para Éfeso pelo imperador Teodósio II o qual simpatizava por
  Eutiques; este concílio, em que houveram cenas de violência, aprovou a
  heresia de Eutiques. Foi definido o ‘latrocínio de Éfeso’. Neste concílio
  participaram também os legados do bispo de Roma que foram ameaçados; ele é um
  exemplo que mostra de maneira clara pela enésima vez como as decisões dos
  concílios eram influenciadas pelos imperadores.   | 
 
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   [30] Num livro
  de história da Igreja escrito por parte católica a propósito desta decisão
  tomada em Calcedónia se lê: ‘O concílio de Calcedónia não tinha intenção de
  negar o primado do papa, mas considerava que este primado da sede apostólica
  era fundado na função política de Roma capital; nisto estava o erro. Os papas
  fizeram sempre apoiar o princípio do seu primado na vinda de são Pedro a Roma
  e na sua dignidade de sucessores de Pedro’. Isto faz perceber que a cúria
  romana para sustentar o primado espiritual do papa se baseia principalmente
  na vinda de Pedro a Roma e na chamada sucessão apostólica segundo a qual
  Pedro teria deixado a um sucessor a sua presumida autoridade espiritual sobre
  toda a Igreja que teria recebido de Cristo. Ela não aceita que se diga que o
  primado do bispo de Roma inicialmente era inexistente porque foi o resultado
  natural de certas condições e certos acontecimentos históricos que se
  verificaram nos primeiros séculos depois de Cristo, porque isso significaria
  negar ‘a instalação divina’ do primado do papa.   | 
 
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   [31] Nós sabemos pelas Escrituras que uma das
  maneiras em que Deus pune os povos é chamando exércitos estrangeiros contra
  eles. Pelo que estamos persuadidos que foi Deus a chamar os bárbaros contra o
  império Romano para abatê-lo; império que nunca se deve esquecer tinha
  durante séculos devastado muitas nações e cidades e massacrado muitas
  pessoas, e que em diferentes momentos tinha perseguido os Cristãos por causa
  da sua fé. "Como tu fizeste, assim se fará contigo" (Obadias
  15) diz Deus.   | 
 
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   [32] Os
  Montanistas eram os seguidores de um certo Montano e surgiram na Frígia em
  135 até cerca de 160. Montano se considerava o paracleto ou advogado através
  do qual o Espírito Santo falava à Igreja. Ele sustentava também que o reino
  celeste de Cristo seria cedo estabelecido em Pepuza na Frígia e ele ocuparia
  um lugar preeminente nele. À morte de um dos cônjuges era proibido ao outro
  passar a novas núpcias, tinham que se observar muitos jejuns e comer
  alimentos secos. Tertuliano (160 ca. - 220 ca.), considerado um dos maiores
  pais da Igreja, aderiu ao montanismo.   | 
 
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   [33] O termo
  indicava os escritos de Teodoro de Mopsuestia e Teodoreto de Ciro, e uma
  carta de Ibas de Edessa. Este édito na realidade contrastava o concílio de
  Calcedónia que tinha reconhecido ortodoxos (de recta doutrina) tanto
  Teodoreto como Ibas.   | 
 
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   [34] Isto
  explica por que razão o patriarca de Constantinopola não pôde tornar-se chefe
  de um Estado como o bispo de Roma, porque o imperador o tinha sob controlo
  directo.   | 
 
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   [35] A palavra
  iconoclasta significa literalmente ‘quebrador de ícones ou de imagens
  sagradas, pintadas ou esculpidas, que figuram Jesus Cristo, Maria e os
  santos’. São chamados iconoclastas aqueles que reprovam o culto das chamadas
  imagens e estátuas sagradas definindo-o idolatria e destroem as estátuas e as
  imagens. Estes são também chamados iconómacos ou inimigos das imagens.   | 
 
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   [36] A
  propósito deste rei deve ser dito que pouco tempo antes tinha recebido um
  ‘favor’ do papa Zacarias (741-752). Tinha sucedido com efeito que o ‘mordomo
  do palácio’ Pepino estava em dúvida se podia ou não ir ao juramento de
  fidelidade feito ao seu rei Childerico III, destroná-lo e tornar-se ele mesmo
  soberano. Que fez então? Em 751 decidiu entregar a questão a um concílio e
  enviou a Roma um bispo e um abade para pedir ao papa, cuja autoridade moral e
  religiosa era considerada incontestável, se fosse possível o anulamento de um
  sagrado juramento feito a um rei. Zacarias, que naqueles dias precisava da
  ajuda dos Francos contra os Longobardos que ameaçavam Roma, respondeu que
  Pepino fosse coroado rei; em outras palavras declarou nulo um juramento para
  assegurar ao papado a protecção militar do rei franco. E assim Childerico III
  acabou num mosteiro e Pepino o Breve foi coroado por um bispo entre o fim de
  751 e o início de 752. Zacarias tinha assim concedido este grande favor a
  Pepino. Mas Zacarias não pôde beneficiar da retribuição do rei franco porque
  morreu logo depois da sua coroação.   | 
 
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   [37] É evidente
  que se de restituição à sede de Roma se podia falar para um certo número de
  territórios conquistados por Astolfo, certamente para muitos outros o termo
  restituição não se podia usar porque na realidade eram territórios que não
  eram de modo nenhum propriedade da igreja de Roma mas de outros. Por exemplo
  o Exarcado de Ravena e a Pentápole que Astolfo tinha conquistado pertenciam
  ao imperador. Mas Estevão apoiando-se na Doação de Constantino
  sentiu-se autorizado a pedir também estes não se preocupando de modo nenhum
  que com aquele seu gesto ele tomava posse de territórios de outros.   | 
 
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   [38] Fazemos
  notar que entretanto se tinham apresentado em Roma alguns legados do
  imperador Constantino V que transmitiram a Pepino o pedido da parte do seu
  soberano de tornar a entrar em possessão dos territórios bizantinos por ele
  reconquistados. Ao que Pepino respondeu-lhe que tinha feito duas expedições a
  Itália para a reconquista daqueles territórios por amor de São Pedro, ao qual
  pertenciam, e para a salvação da sua alma. E precisou que todos os tesouros
  do mundo não chegariam para induzi-lo a trair a palavra dada a S. Pedro e
  reiterou a sua intenção de entregar todos os territórios ao papa. Por quanto
  respeita aos territórios entregues ao papa, além do Exarcado o Liber
  Pontificalis os elenca por cidades: Ravena, Rimini, Pesaro, Cesena,
  Catolica, Fano, Senigallia, Jesi, Forlimpopoli, Forlì, Castrocaro,
  Montefeltro, Arcena, Monte di Lucaro, Serra dei Conti, Castello di S. Marino,
  Sarsina, Urbino, Cagli, Canziano, Gubbio, Comacchio, Narni, Roma e o
  território circunstante.   | 
 
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   [39] Gregorovius,
  historiador alemão, a propósito do nascimento deste Estado afirmou: ‘Com a
  fundação de tal estado, cessou o período da história puramente episcopal e
  sacerdotal e se encerrou a época mais bela e gloriosa da Igreja romana. Ela
  tornou-se coisa mundana e os pontífices que, contra a lei do Evangelho e das
  doutrinas de Cristo, associaram o sacerdócio ao principado, não poderão em
  seguida manter-se na pura missão de bispos apostólicos. A sua dupla natureza,
  contradição em si mesma, os arrastou continuamente mais para baixo, para o
  meio da agitação das ambiciosas artes políticas, por isso eles, por
  necessidade, foram levados a lutas depravadoras, a fim de se manterem na
  posse dos seus títulos temporais; foram obrigados a descer a guerras civis
  internas contra a cidade de Roma e a lutas contínuas contra os poderes
  políticos’ (Gregorovius, La Storia della città di Roma nel Medioevo [ A História da cidade de Roma na Idade
  Média] , Roma 1900, vol. I, pag.
  546).  | 
 
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   [40] Este
  Formoso quando era ainda bispo de Porto tinha sido segundo alguns o chefe,
  segundo outros tinha tido parte na conspiração conhecida sob o nome de
  conjura de Gregório o Nomenclador, conjura que tinha nada menos o objectivo
  de entregar Roma aos Sarracenos. Descoberta a conjura papa João VIII (872-882)
  excomungou Formoso e o depôs; mas o seu sucessor Marino I (882-884) o tinha
  reabilitado restituindo-lhe o bispado. Como papa (891-896) tinha-se feito
  culpado de ter renegado a casa de Spoleto invocando à traição a Itália um rei
  bárbaro. Por este acto tinha atraído um forte ódio da parte dos spoletinos;
  Estevão tinha sido eleito papa exactamente pelo partido dos spoletinos. Daqui
  o macabro acto de Estevão VI.   | 
 
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   [41] O cardeal
  Barônio nos seus Anais eclesiásticos começando a falar do papado do
  décimo século numa espécie de prefácio afirma: ‘São coisas que superam toda a
  imaginação aquelas que teve que sofrer a Igreja neste século. Ninguém pode
  imaginar quantas indignidades, quantas torpezas, quantas deformidades,
  execrações, e abominações, tenha sido obrigada a sofrer a S. Sede apostólica
  (...) Naquela santa Sede foram intrusos monstros, pelos quais vieram males
  infinitos, e se realizaram sangrentas tragédias; e assim ela que era
  imaculada foi coberta de toda a imundícia, e denegrida com infâmia perpétua’.
  E foi um Católico que disse estas coisas.   | 
 
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   [42] O
  arcebispo Genebrardo (1537-1597), adulador dos papas, na sua crónica, no ano
  904 diz: ‘Pelo espaço de cerca de 150 anos, houveram 50 papas, começando por
  João VIII até Leão IX, que foi por Deus chamado como um novo Arão, e tornou a
  chamar do céu para a sede apostólica a antiga integridade; mas os papas até
  ele tinham inteiramente abandonado as virtudes dos maiores, e devem ser
  chamados antes apóstatas que apóstolos’. Aelfric, arcebispo de Canterbury,
  falando da situação da cúria romana no décimo século se lamenta que:
  ‘Naqueles dias havia um descuido horrível na ordem dos padres e dos bispos,
  que deviam ser as colunas da Igreja; que eles não cuidavam nem de ler a
  Escritura sagrada, nem de instruir discípulos para fazer deles os seus
  sucessores; que aqueles padres e bispos eram apegados às honras mundanas, à
  concupiscência e à avareza mais que os leigos, dando maus exemplos ao seu
  rebanho, e não ousando falar da justiça, porque eles não a amavam e não a
  seguiam’ (Serm. ad Sacerd. m. s. m. bibl. collect. Bened. Cantab.).   | 
 
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   [43] O cardeal
  Barônio no ano 912 afirma: ‘Assim era então a face da Igreja romana! Oh quão
  horrível era ela! As cortesãs as mais infames, mas poderosas, dominavam em
  Roma, e a seu agrado distribuíam os bispados, trocavam os bispos; e, o que é
  mais horrível dizê-lo, na sede de Pedro, eram por elas introduzidos os seus
  amantes, falsos papas, os quais não devem ser registrados senão para a
  cronologia. Porque quem poderá crer que tenham sido legítimos papas, aqueles
  que sem alguma lei foram introduzidos por tais ímpias fêmeas? Jamais na
  eleição daqueles falsos papas se fala do clero que elege, ou consente ao
  menos na eleição: todos os cânones eram obrigados a calar-se; os decretos dos
  papas anteriores eram sufocados, as antigas tradições proscritas, os
  costumes, confirmados com o uso na eleição dos papas, e os sagrados ritos
  inteiramente tirados. A libido tinha tomado o lugar de tudo...’. Assim sendo,
  queremos perguntar a este ponto aos defensores do papado: ‘Como podeis
  afirmar que a sucessão apostólica, de que vós tanto falais nunca foi
  interrompida?’.   | 
 
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   [44] E por
  causa desta lei muitas mulheres, vendo-se separadas à força dos seus maridos,
  pela dor se suicidaram. Um grupo de bispos que se reuniu em Pavia em 1076
  excomungou o papa por ter separado os maridos das mulheres.   | 
 
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   [45] Pelo que
  respeita à tão debatida questão das investiduras o papado chegará a um acordo
  com o imperador em 1122 em Worms. No acordo estabelecia-se que a investidura
  do poder espiritual do bispo com o pastoral e o anel cabia exclusivamente ao
  papa; ao imperador cabia antes a investidura feudal. Na Alemanha esta última
  precedia a consagração episcopal, ao contrário de em Itália, onde o bispo
  devia ser primeiro consagrado. Além disso era consentido ao imperador estar
  presente na eleição episcopal.   | 
 
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   [46] Os
  comportamentos de Gregório VII e de Inocêncio III são uma manifestação da
  arrogância dos papas que pensavam ter o direito divino de depor os reis da
  terra quando lhes apetecia e de ‘desligar’ os seus súbditos do juramento de
  fidelidade para com eles suscitando assim tumultos nas suas nações. Este modo
  de considerar os seus comportamentos foi porém condenado por Pio IX que no
  seu Sílabo de 1864 declarou que é errado afirmar que ‘Os Pontífices
  Romanos (...) ultrapassaram os limites do seu poder, usurpando os direitos
  dos Príncipes...’ (XXIII). Também ele foi arrogante como o foram os seus
  predecessores; basta considerar que foi ele a fazer proclamar o dogma da
  infalibilidade papal.   | 
 
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   [47] A
  propósito das meretrizes presentes em Roma deve ser dito que Leão se mostrou
  muito tolerante para com elas, ou melhor complacente, e isto ainda por amor
  ao dinheiro. Eis, com efeito, o que declarou este papa: ‘Nós, de nosso pleno
  conhecimento, impulso, e plenitude de poder, decretamos que, para sustentar
  encargos assim feitos, todos e particulares bens, e espólios dos Curiais e
  das meretrizes - ganhos ilicitamente, vivendo na nossa Roma, fora do vínculo
  matrimonial, e que morrem sem faculdade de poder fazer testamento em qualquer
  habitação, sejam destinados para o mesmo mosteiro, e para a sua Congregação,
  e para as Freiras pro tempore ivi existentes; e, em virtude da supra-referida
  autoridade, moto e ciência, aplicamos, e incorporamos ditos bens, e decretamos
  aplicados e incorporados, agora e no futuro, excluído qualquer caso em
  contrário que possa acontecer. Porém, se esses Curiais e mulheres desonestas
  quiserem deixar, legar, ou doar ao supradito mosteiro, convento, e monjas,
  para suprir aos seus encargos, a quarta, ou a quinta parte dos seus bens,
  sejam móveis, ou imóveis, ou outro qualquer, nós então concedemos-lhes
  faculdade de poder fazer testamentos acerca dos outros seus bens de qualquer
  qualidade, quantidade e valor que sejam, e dispor deles livremente e
  licitamente desde agora, e pelo futuro, e isto pela supra-referida
  autoridade, moto, ciência e plenitude de poder’ (Bula Salvator noster).
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   [48] Eis o que
  dirá Lutero: ‘Eu fui um bom monge e observei a disciplina da minha ordem tão
  rigorosamente a poder dizer que, se alguma vez um monge pudesse ir para o céu
  pela sua disciplina monástica, esse era eu. Todos os frades do mosteiro o
  podem confirmar (...) Todavia a minha consciência não me dava a certeza,
  antes, duvidava continuamente e me dizia. ‘Isto não o fiz bem. Não estava
  suficientemente contrito. Isto não o confessei’. Quanto mais me esforçava
  para curar com tradições humanas esta minha consciência duvidosa, incerta e
  perturbada, tanto mais a encontrava, de dia para dia, mais duvidosa, mais fraca
  e mais perturbada’. E ainda: ‘Fui monge por vinte anos e me mortifiquei a tal
  ponto com orações, jejuns, vigílias, com não atribuir alguma importância ao
  inverno, ao frio, que por si mesmo poderia ter-me feito morrer; me torturei a
  tal ponto que por nada do mundo queria recomeçar, ainda que o pudesse. Se
  tivesse ficado no convento, para mim teria chegado bem cedo o fim. Durante os quinze anos que fui monge,
  afadigava-me a dizer a missa todos os dias, me extenuava com os jejuns, as
  vigílias, as orações e com outras práticas extremamente penosas. Pelo mundo
  todas estas práticas exteriores dos hebreus, dos turcos, dos papistas são
  observadas com a maior seriedade, e também eu sob o papismo bem me guardava
  de rir ou de escarnecer delas. Pois bem, quem o creria? Tudo isto é
  trabalho perdido... Quem creria que tudo isso era uma perda de tempo e que um
  dia chegaria a dizer-me: Os meus vinte anos de vida monástica foram perdidos?
  Não estive no convento senão para perder a minha alma, a minha vida eterna, a
  saúde física... Com a abstinência nós pensávamos, nós queríamos nos tornar
  tão merecedores a igualar o preço do sangue de Cristo e eu também na minha
  loucura nisto acreditava. Não sabia, então, que Deus queria que eu cuidasse
  do meu corpo e que não confiasse na temperança. Eu me teria morto com os
  jejuns, com as vigílias e a resistência ao frio. No coração do inverno não
  trazia senão um hábito ligeiro, quase gelava, tão louco e tolo que era. Por que é que no convento me submeti às
  austeridades mais duras? Por que é que afligi o corpo com os jejuns, as
  vigílias, o frio? Porque eu procurava chegar à certeza que estas obras me
  obtinham o perdão dos pecados’.   | 
 
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   [49] Vos
  recordo que uma parte do dinheiro arrecadado com a venda das indulgências ia
  para as caixas papais e serviam para a reconstrução da basílica de São Pedro.
  Leão X tinha com efeito promulgado em 1515 uma indulgência com o objectivo de
  reconstruir em Roma a basílica de São Pedro. Ao arcebispo de Mogúncia,
  Alberto de Brandeburgo, foi confiada a pregação de tal indulgência por uma
  parte da Alemanha. E Alberto delegou ao dominicano Tetzel a tarefa de pregar
  a indulgência.   | 
 
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   [50] Eis
  algumas das teses que testificam isso: 26) O papa faz muito bem, quando
  concede a remissão às almas não pelo poder das chaves (que não tem), mas em
  modo de sufrágio. 27) Pregam o homem os que dizem: ‘no momento em que a moeda
  soa ao cair na caixa uma alma voa directamente para fora (do purgatório)’;
  28) Aquilo que é certo, é que quando uma moeda soa na caixa, pode aumentar o
  ganho e a avareza; mas o sufrágio da Igreja depende só do beneplácito de
  Deus; 47) Deve-se ensinar aos cristãos que a compra das indulgências é
  matéria de livre escolha e não de mandamento; 49) Deve-se ensinar aos
  cristãos que os perdões do papa são úteis se não confiarem neles, mas que são
  enormemente prejudiciais quando por causa deles se perde o temor de Deus; 50)
  Deve-se ensinar aos cristãos que, se o papa conhecesse as extorsões
  praticadas pelos pregadores de indulgências, ele preferiria que a basílica de
  São Pedro fosse reduzida a cinzas a construí-la com a pele, a carne e os
  ossos das suas ovelhas; 54) Ofende-se a Palavra de Deus, quando, numa mesma
  pregação se dedica às indulgências um tempo igual ou maior do que a ela; 67)
  As indulgências, que os pregadores proclamam como as maiores graças, se
  percebe que são verdadeiramente tais quanto ao ganho que promovem; 81) Esta
  escandalosa pregação das indulgências faz com que não seja fácil nem mesmo a
  homens doutos, defender a reverência devida ao papa das calúnias, ou se se
  preferir, das subtis objecções dos leigos; 86) Por que é que o papa, cujas
  riquezas são hoje mais crassas do que as dos mais ricos Crassos não constrói
  uma só basílica de São Pedro com o seu dinheiro, em vez de fazê-lo com o dos
  pobres fiéis?   | 
 
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   De qualquer modo, é necessário reconhecer que
  as teses de Lutero, tomadas e vistas na sua globalidade, constituiram um
  ataque contra o papado e contra o seu poder de conceder indulgências, e disso
  se aperceberam logo os teólogos papistas do tempo e Leão X que procuraram
  logo travá-lo porque viam nas suas ideias algo que podia levar o povo a
  desprezar as indulgências e a pôr-se contra o papado.   | 
 
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   [51] Por
  exemplo Lutero afirmava que o pão e o vinho usados na santa ceia eram
  verdadeiramente o corpo e o sangue de Jesus Cristo (doutrina que é denominada
  consubstanciação), enquanto Calvino negava isso: uma outra diferença
  doutrinal entre os dois reformadores é a sobre as imagens, Lutero as admitia
  tanto é verdade que no seu Pequeno Catecismo no comentário aos dez
  mandamentos ele exclui da lista dos mandamentos o segundo mandamento (a
  diferença com a lista dos mandamentos dos Católicos é que o terceiro
  mandamento é ‘Lembra-te de santificar o dia do Senhor’ e o sexto ‘Não
  cometerás adultério’, o nono ‘Não cobiçarás a casa do teu próximo’ e o décimo
  ‘não cobiçarás a mulher do teu próximo, nem o seu servo, nem a sua serva, nem
  o seu gado, nem alguma coisa que lhe pertença’) enquanto Calvino não aceitava
  as imagens e as esculturas e de facto no seu Catecismo no comentário
  aos dez mandamentos se encontra o segundo mandamento assim como Deus o deu.   | 
 
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   [52] Por esta
  posição a dos Anabatistas foi denominada ‘Reforma radical’, para contrapô-la
  à propugnada pelos Luteranos e Calvinistas denominada ‘Reforma clássica’. Com efeito, os Anabatistas em diversas
  coisas, à diferença dos Luteranos e dos Calvinistas, se mostraram mais
  apegados à Palavra de Deus. É um dado de facto. E por este seu apegamento à
  Palavra de Deus sobre aqueles pontos sobre os quais os outros reformadores
  antes preferiram o compromisso serão perseguidos até por Lutero e Zwingli
  (1484-1531), para os quais a Igreja devia servir-se da força para levar
  avante a Reforma e protegê-la.   | 
 
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   [53] Eis a
  origem deste apelativo. Na Dieta (reunião de Estado) de Spira (Alemanha) de
  1526 os príncipes que tinham aceitado a Reforma obtiveram que até ser
  convocado um concílio o príncipe de cada estado era livre de seguir aquela
  que considerava a justa fé. Mas na Dieta de Spira de 1529 este direito
  foi-lhes negado porque foi reconhecida única fé legalmente reconhecida só a
  católica romana. Alguns príncipes alemães então protestaram e foram por isso
  chamados protestantes. Apelativo que desde aquele momento será dado a
  todos os que se oporão à igreja católica romana por aceitarem a doutrina que o
  homem é justificado só pela fé.   | 
 
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   [54] Eis como
  Gioacchino Ventura, um prelado católico francês, se exprimiu numa carta
  datada de 12 de Junho de 1849 a respeito daqueles trágicos acontecimentos
  causados pelo recurso à ajuda francesa por parte de Pio IX: ‘Caro amigo e
  irmão. Vos escrevo com as lágrimas nos olhos, e o coração despedaçado pela
  dor. Enquanto escrevo estas linhas, os soldados franceses bombardeiam Roma,
  destruindo os seus monumentos, matam com a metralha os seus cidadãos, e o
  sangue escorre em torrentes. Ruínas se acumulam sobre ruínas, e Deus sabe
  qual será o fim desta terrível luta. (...) O povo vê que os Franceses em nome
  do papa fazem escorrer o sangue romano e destroem a sua bela cidade. O povo
  vê que foi o papa que soltou quatro potências armadas de todos os meios de
  destruição contra o povo romano, como se soltam os mastins contra uma besta
  feroz; e, vendo tais coisas, ele não ouve mais nada e se levanta contra o
  papa e contra a Igreja em nome da qual o papa proclama ser seu dever readquirir
  pela força o domínio temporal’ (...) Ah! meu caro amigo, a ideia de um bispo
  que faz metralhar os seus diocesanos, de um pastor que faz degolar as suas
  ovelhas, de um pai que manda sicários aos seus filhos, de um papa que quer
  reinar e impor-se a três milhões de Cristãos por meio da força, que quer
  restabelecer o seu trono sobre as ruínas, sobre os cadáveres e sobre o
  sangue; esta ideia, digo, é tão estranha, tão absurda, tão escandalosa, tão
  horrível, tão contrária ao espírito e à letra do Evangelho, que não há
  consciência que não sinta repugnância, não há fé que possa resistir a ela,
  não há coração que não brama, não há língua que não se sinta empurrada a
  maldizer, a blasfemar! era mil vezes melhor perder todo o temporal e o mundo
  inteiro se fosse preciso, do que dar um tal escândalo ao povo (...) É provável que Roma sucumba sob o ataque
  das armas francesas: como de facto resistir à França? É possível que o
  papa reentre em Roma trazendo na mão a espada em vez da cruz, precedido pelos
  soldados e seguido do carnífice, como se Roma fosse Meca e o Evangelho o
  Corão. Mas ele não reinará mais sobre o coração dos Romanos; sob este aspecto
  o seu reino acabou, acabou para sempre; ele não será mais papa senão sobre um
  pequeno número de fiéis...’. Ventura, por esta sua carta, da qual citei
  apenas poucas passagens, foi obrigado a estar no exílio em Montpelier e
  depois em Paris e a perder o chapéu cardinalício que lhe tinha sido
  prometido.   | 
 
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   [55] Vos faço
  notar que esta humilhação Deus a infligiu ao papa precisamente no ano em que
  ele se fez declarar infalível ex-catedra: em verdade "Deus
  resiste aos soberbos" (1 Ped. 5:5).  | 
 
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   [56] Aquilo que
  era chamado o Estado pontifício era uma área de cerca de 41.600 quilómetros
  quadrados com cerca de 3 milhões de habitantes. É claro que vindo-lhe a
  faltar este Estado vieram a faltar ao papa também muitos recursos
  financeiros. O papa recusou todos os subsídios lhe propostos decidindo
  apoiar-se no Óbolo de S. Pedro. A igreja católica fez então distribuir às
  suas paróquias no mundo, cartolinas postais com a figura do papa deitado numa
  cama de palha numa prisão subterrânea. E isto para estimular os Católicos a
  dar ofertas ao papa prisioneiro dos ‘malvados italianos’. E muitos creram que
  o papa vivesse na mais profunda miséria e uma grande quantidade de pfennings,
  pennies, xelins, ducados, táleres, pesos e dólares novamente se derramaram
  nas caixas do Vaticano permitindo-lhe suprir as suas despesas.  | 
 
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   [57] O partido
  fascista de Benito Mussolini chegou ao poder com a ajuda do Vaticano. Este,
  com efeito, tinha impedido de todas as maneiras que o Partido Popular fundado
  por Luigi Sturzo (um padre católico) em 1919, partido que tinha no parlamento
  cerca de cem deputados e que era antifascista, se aliá-se com os socialistas
  de maneira a formar um governo antifascista que impedisse a subida ao poder
  do fascismo. Além disso o Vaticano numa circular de outubro de 1922 convidava
  os bispos e os padres a permanecer neutrais nas lutas políticas internas, o
  que favoreceu Mussolini. A propósito de Luigi Sturzo deve ser dito que foi
  obrigado pelo Vaticano a entregar a demissão de secretário político do
  Partido Popular e pouco depois a emigrar de Itália.   | 
 
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   [58] Na
  residência de Castel Gandolfo, Wojtyla, com o dinheiro dos polacos da
  América, mandou construir lá uma piscina.   | 
 
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   [59] Durante as
  negociações, um alto prelado, que se ocupava das finanças vaticanas, disse a
  um seu confrade: ‘Desta vez é preciso que a Itália pague caro as
  indulgências’. Os meios financeiros que o Estado italiano deu ao Vaticano
  constituíram o fundamento sobre o qual foi construído o império financeiro
  que o Vaticano constitui hoje. No próprio dia em que o acordo com Benito
  Mussolini foi ratificado Pio XI criou uma nova agência financeira, a
  Administração Especial da Santa Sé e nomeou dela seu director e manager
  Bernardino Nogara. Este aceitou a proposta do papa porque o papa satisfez as
  suas exigências entre as quais estavam estas: que todos os investimentos que
  ele escolhesse fazer fossem totalmente e completamente livres de quaisquer
  considerações religiosas ou doutrinais; que ele fosse livre de investir os
  fundos do Vaticano em qualquer sítio do mundo. E assim Nogara se pôs em
  movimento. Martin Malachi, Jesuíta ex-professor no Pontifício Instituto
  Bíblico de Roma, no seu livro Rich Church, Poor Church (Igreja Rica,
  Igreja Pobre) editado em 1984, diz: ‘Fiel aos seus planos iniciais, as
  primeiras maiores aquisições de Nogara em Itália foram actuadas no ramo do
  gás, dos têxteis, na construção pública e privada, no aço, na decoração, nos
  hóteis, em produtos mineiros e metalúrgicos, produtos da agricultura, energia
  eléctrica, armas, produtos farmacêuticos, cimento, papel, madeira de
  construção, cerâmica, pasta, engenharia, caminhos-de-ferro, navios de
  passageiros, telefones, telecomunicações e bancos’ (pag. 40). Antes do
  rebentar da segunda guerra mundial o Vaticano adquiriu o controlo de muitas
  companhias e bancos tanto em Itália como no exterior e em muitas outras
  companhias conseguiu ter uma participação menor mas substancial. Por volta
  dos anos ‘30 o Vaticano possuía cerca de 3 milhões e 716.000 metros quadrados
  de bens imóveis em Roma, e com o tempo tornar-se-ia o maior proprietário de
  terra em Itália depois do próprio governo italiano. Quando Mussolini precisou
  de armamento para a invasão da Etiópia em 1935 uma substanciosa parte dele
  foi provida por uma fábrica de munições que Nogara tinha comprado em nome do
  Vaticano. A 27 de Junho de 1942 Pio XII, por proposta de Nogara, fundou uma
  nova sociedade financeira no Vaticano chamada Instituto para as Obras
  Religiosas (IOR). A proposta de Nogara tinha sido esta: ‘Estabelecer uma
  sociedade eclesiástica central para a Igreja Universal, uma sociedade dotada
  do status de um banco dentro do Estado soberano da Cidade do Vaticano e que
  tivesse a vantagem de pertencer ao papado e ao Vaticano; uma sociedade que se
  especializasse em investir e em negociar os fundos e os recursos das
  entidades eclesiásticas da Igreja inteira’ (Martin Malachi, op. cit.,
  pag. 43). Através do IOR os vários organismos eclesiásticos estavam em
  condições de investir o seu dinheiro em completo segredo e isentos de
  impostos. (Recordamos que o IOR diversos anos atrás, quando era dirigido por
  Paul Marcinkus, esteve envolvido em alguns escândalos financeiros por causa
  de manobras financeiras ilegais por ele praticadas com a ajuda do financeiro
  siciliano Michele Sindona - o mandato de captura emitido contra Sindona
  falava ‘de provas documentais de operações irregulares efectuadas por Sindona
  por conta do Vaticano’ -, e de Roberto Calvi, presidente do Banco
  Ambrosiano). Depois da segunda guerra mundial, ainda sob Nogara, o império
  financeiro vaticano continuou a crescer. Quando Bernardino Nogara morreu em
  1958 deixou um Vaticano enormemente rico. A obra realizada por este
  financeiro em prol do Vaticano fez dizer ao então cardeal Spellman de New
  York: ‘Depois de Jesus Cristo a maior coisa que sucedeu à Igreja Católica foi
  Bernardino Nogara’! Mas também depois da morte de Nogara as finanças
  continuaram a crescer. Em meados dos anos sessenta, as agências financeiras
  do Vaticano controlavam metade das agências de crédito em Itália. Muitas
  indústrias tinham por trás dinheiro do Vaticano. O Instituto Farmacológico
  Serono de Roma por exemplo era de propriedade Vaticana. Este Instituto no
  período em que a igreja católica romana condenava a contracepção artificial
  (Paulo VI a condenou explicitamente com a encíclica Humanae Vitae de
  1968) lançava no mercado um contraceptivo muito popular chamado Luteolas, que
  fez embolsar muito dinheiro ao Vaticano (isto para demonstração que quando
  estão no meio os seus interesses financeiros o Vaticano não tem algum temor
  de renegar nos factos aquilo que ensina em palavras). Em 1968, segundo quanto
  declarou o então ministro das Finanças Preti, a ‘Santa Sé’ possuía títulos
  accionários italianos num valor de cerca de cem mil milhões de liras, com um
  dividendo que oscilava dos três aos quatro mil milhões ano. Também no
  exterior o Vaticano possuía títulos accionários para muitos mil milhões. Ele tinha pacotes accionários em
  diversas grandes companhias internacionais entre as quais a General Motors, a
  Shell, Gulf Oil, General Electric, Betlehem Steel, International Business
  Machines (IBM), e TWA. O Vaticano possui uma forte reserva áurea nos
  Estados Unidos, em Forte Knox. Quanto ao valor das actuais riquezas em mão do
  Vaticano não há dados que permitam dizer com uma certa exactidão quanto na
  realidade possui em títulos, acções, bens imóveis; há um véu sobre tudo isso.
  De seguro há que o Vaticano é muito rico materialmente, e que se sobre as
  suas finanças a cúria romana mantém uma forte reserva, há várias razões para
  isso. Uma das quais é a de poder fazer crer ainda às pessoas que a igreja
  católica romana é ‘a igreja dos pobres’ e necessita continuamente do dinheiro
  dos seus fiéis para levar avante a sua missão no mundo.   | 
 
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   [60] O Vaticano
  se aliou também com Hitler (que - se tenha presente - tinha subido ao poder
  com a ajuda do partido católico de centro), com efeito, em 1933 foi
  estipulada uma Concordata entre a ‘Santa Sé’ e o Reich alemão. Nesta
  concordata se encontram artigos semelhantes aos que se encontram na
  estipulada com o governo de Mussolini. Por exemplo o Vaticano no art. 32 se
  comprometia a proibir aos eclesiásticos e aos sacerdotes a pertença aos
  partidos políticos e todas as actividades em seu favor; no art. 14 de
  comunicar ao lugar-tenente do Reich o nome das pessoas que tinha intenção
  escolher como arcebispos e bispos; no art. 16 de fazer prestar aos bispos um
  juramento de fidelidade ao Reich; no art. 30 de fazer recitar todos os
  Domingos e nas festas de preceito uma oração pela prosperidade do Reich e do
  povo germânico. O Vaticano em troca obteve que o ensino religioso passasse a
  ser obrigatório nas escolas elementares, profissionais, médias e superiores
  ‘em conformidade com os princípios da Igreja católica’. O Vaticano foi
  asperamente criticado mesmo por jornais católicos que viram nesta Concordata
  a ‘canonização do hitlerismo’. Mas o Osservatore Romano de 27 de Julho
  respondeu que ‘a Santa Sé tratava com os Estados enquanto tais, para
  assegurar os direitos e a liberdade da Igreja, prescindindo de toda a
  consideração e apreciação de outra natureza’. Estas palavras fazem claramente
  compreender que a igreja católica está disposta a aliar-se com o governo de
  qualquer nação, não importa se democrático ou ditatorial, para salvaguardar
  os seus próprios interesses. E interesses o Vaticano tinha muitos a defender
  também na Alemanha aos dias de Hitler. Eis por que a chamada santa Sé, apesar
  de Hitler a seguir infringir a Concordata perseguindo diversos prelados
  católicos e organizações católicas, nunca condenou o hitlerismo pois um
  semelhante comportamento significaria chegar à rotura com o Führer coisa que
  ao papa metia medo porque significaria consequentemente comprometer os seus
  interesses na Alemanha. E ainda esta é a razão pela qual o papa (Pio XII)
  perante o o extermínio dos Hebreus nunca exprimiu uma palavra de solidariedade
  para com os Hebreus (como se está habituado a ouvir que faz hoje quando em
  alguma guerra são perpetrados os chamados crimes contra a humanidade) que
  eram levados às dezenas de milhares para os campos de concentração nazistas e
  ali exterminados nas câmeras de gás, porque a sua preocupação era a de
  salvaguardar os interesses do Vaticano na Alemanha, e uma sua palavra de
  condenação contra o extermínio ordenado por Hitler comprometeria aqueles
  interesses. A respeito deste silêncio do papa durante as perseguições
  nazistas contra os Hebreus durante a segunda guerra mundial numa nota do
  livro Il manganello e l’aspersorio de Ernesto Rossi se lê: ‘O
  embaixador alemão junto do Vaticano e o Núncio em Berlim continuaram a manter
  ‘boas relações’ entre os dois governos, e os relatos sobre as atrocidades na
  Alemanha e na Polónia, que o Núncio junto do governo alemão enviava para
  Roma, ficaram nos arquivos do Vaticano. Boas relações: de facto o Embaixador
  alemão junto da Santa Sé, barão Ernst von Weizsäcker, ficou no Vaticano até
  26 de Agosto de 1946, enquanto o último diplomata japonês o tinha deixado em
  Janeiro’ e ainda: ‘Depois da razia perpetrada pelas SS em Roma a 16 de
  Outubro de 1943, o embaixador Weizsäcker (condenado depois como criminoso de
  guerra, pelo tribunal de Nuremberga, a quinze anos de prisão por delitos
  contra a humanidade) escreveu a Keppler e a Ritter um telegrama, datado de 28
  de Outubro, em que se lê: ‘Apesar de solicitado por toda a parte, o Papa não
  se deixou convencer a exprimir oficialmente qualquer reprovação pelas
  ocorridas deportações dos hebreus de Roma. Embora sabendo que tal sua atitude
  nesta circunstância virá severamente julgada pelos nossos inimigos, e será
  explorada pelos ambientes protestantes dos países anglo-saxónicos na sua propaganda
  contra o catolicismo, ele se comportou, nesta delicada circunstância, de modo
  a não perturbar minimamente as relações com o governo alemão e com ambientes
  alemães de Roma’. O nazismo será claramente condenado pelo papa só depois da
  rendição incondicional da Alemanha; quando já o Vaticano não tinha nada a
  temer dos nazistas.   | 
 
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   [61] Benito
  Mussolini, mediante estes pactos Lateranenses, ganhou a estima e o favor da
  cúria romana e dos Católicos romanos que não o deixaram de manifestar-lhe a
  pouco mais de um mês de distância da assinatura dos Pactos nas ‘eleições
  plebiscitárias’. Cardeais e bispos desceram ao terreno incitando abertamente
  os Católicos a dar o seu voto de aprovação a Mussolini. O plebiscito de 24
  Março deu 8.506.676 ‘sim’ sobre 8.650.470 votantes. Além disso deve ser dito
  que Mussolini teve o apoio da cúria romana quando quis conquistar a Etiópia. Dentre as mensagens dadas por prelados
  papais aos Católicos em favor daquela guerra reportamos apenas as seguintes. A
  28 de Outubro de 1935 o cardeal Schuster de Milão disse aos Católicos
  reunidos na catedral de Milão: ‘Cooperemos com Deus nesta missão nacional e
  católica de bem, sobretudo neste momento em que, nos campos da Etiópia, o
  estandarte da Itália leva o triunfo da Cruz de Cristo, quebra as cadeias aos
  escravos, aplana as estradas aos missionários do Evangelho (...) Paz e
  protecção ao exército valoroso que, em obediência intrépida ao comando da
  Pátria, a preço de sangue, abre as portas da Etiópia à fé católica e à
  civilização romana’. A 12 de Dezembro Giorgio Maria Del Rio, arcebispo de
  Oristano, publicou no boletim da arquidiocese um apelo aos Católicos em que
  se lê entre outras coisas: ‘As populações abissínias estão num ínfimo nível
  religioso e moral, estão longe da verdadeira fé, da nossa religião católica,
  que é fonte de civilização e de progresso. Tudo o que se faz portanto para
  dar à Itália os meios necessários para afirmar naquelas terras a sua
  influência e a sua autoridade não é só em vantagem da Pátria e da
  civilização, mas também da religião católica. A nossa pobre mas generosa
  Itália, após os seus soldados, leva para Abissínia não só o pão, as estradas,
  a libertação da escravidão, todas as providências da civilização; mas leva
  ainda para lá a Cruz de Jesus Cristo, os ensinamentos e as ajudas da Religião
  católica, apostólica, romana, que nas mãos dos nossos missionários nunca
  serviu para preparar conquistas políticas’. Recordamos que na guerra da
  Etiópia Mussolini autorizou o emprego de gás lacrimogénio e de iperite (mais
  conhecido com o nome de gás-mostarda), pela artilharia e pela aviação. As
  vítimas entre os Etíopes foram milhares. A 5 de Maio de 1936 as tropas
  italianas com à cabeça Maresciallo Badoglio entraram em Addis Abeba.
  Regressado a Itália um mês depois, Badoglio foi recebido por Pio XI. ‘O
  colóquio com Pio XI se prolongou por mais de uma hora e meia, superando
  largamente os vinte minutos protocolares das visitas pontifícias. Pela tarde,
  o Legado do Papa lhe restituiu a visita no seu apartamento na via XX
  settembre’ (Vanna Vailati, Badoglio racconta, Torino 1955, pag. 323).
  Evidentemente o papa tinha ficado muito contente pela conquista da Etiópia
  por parte do exército italiano.  | 
 
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   [62] A
  Conferência Episcopal Italiana, de qualquer forma, a propósito desta
  modificação, para tranquilizar os Católicos, disse: ‘Se depois o Protocolo
  adicional adverte que ‘se considera não mais em vigor o princípio... da
  religião católica como única religião do Estado’, podem-se compreender as
  razões de uma semelhante mudança que, também à luz da Declaração do Concílio
  sobre a liberdade religiosa, se inspira no respeito devido a todo aquele que
  tenha outra fé ou diferente convicção de consciência. Esta mudança nada tira
  aos valores da religião católica. Ela pertence desde sempre ao povo italiano no
  qual se largamente enraizou pela força do Evangelho, até a ser fermento da
  sua história, da sua civilização, da sua cultura, dos seus empenhos por uma
  ordenada convivência civil, por abertas relações de colaboração na Europa e
  no mundo, pelo progresso de todos os povos e pela paz’.   | 
 
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   [63] A
  propósito desta ‘liberdade’ concedida aos não Católicos de professar a sua fé
  deve ser dito que a igreja católica foi obrigada pelas circunstâncias (tão
  diferentes em muitos aspectos das de séculos atrás) a lhes concedê-la porque
  se as circunstâncias tivessem sido outras esta ‘liberdade’ ela jamais a teria
  concedido. Em outras palavras ela se adaptou aos tempos, como sempre fez, mas
  sem renunciar com isto à tese que só ela tem o direito de ser completamente
  livre de divulgar a sua doutrina porque só ela é a depositária da verdade.
  Para confirmação que na realidade a igreja católica mesmo quando dá a outros
  liberdade religiosa o faz com desgosto e hipocritamente eis quanto se lê num
  artigo da Civiltà cattolica: ‘Ora a Igreja católica, convencida pelas
  suas divinas prerrogativas de ser a única verdadeira Igreja, deve reclamar
  para si somente o direito à liberdade, porque unicamente à verdade, nunca ao
  erro, este pode competir; quanto às outras religiões ela não empunhará a espada,
  mas exigirá que com meios legítimos dignos da pessoa humana, não lhes seja
  consentido difundir falsas doutrinas. Por conseguinte num estado católico, em
  que a maioria é católica, a Igreja pedirá que ao erro não seja dada
  existência legal e que, se existem minorias de religião diferente, estas
  tenham só uma existência de facto, sem a possibilidade de divulgar as suas
  crenças... em alguns países depois, os católicos serão obrigados a pedir a
  plena liberdade religiosa para todos, resignados de poder conviver, lá onde
  só eles teriam o direito de viver. Neste caso a Igreja não renuncia à sua
  tese, que soa como a mais imperativa das leis, mas se adapta às hipóteses,
  isto é, às condições de facto, das quais a sua vida concreta não pode
  prescindir... A Igreja não pode ruborizar-se desta sua intransigência, assim
  como a afirma no princípio e assim como a aplica na prática’ (F. Cavalli, S.
  J. ‘As condições dos protestantes em Espanha’ em Civiltà Cattolica, 3
  de Abril de 1948). Traduzido na prática isto significa que se em Itália ou em
  Portugal ou no Brasil ou em outra qualquer nação subisse ao poder um ditador
  como Hitler ou Mussolini a igreja católica se aliaria com ele e pediria logo
  que aos Protestantes fosse tirada (ou pelo menos reduzida) a liberdade de professar
  a sua fé e de divulgar a Palavra de Deus - coisa que julgamos não lhe seria
  recusada pelo ditador porque o papa sabe como persuadir qualquer ditador a
  conceder-lhe favores - e por isso voltariam as perseguições de outrora.   | 
 
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   [64] Quero
  fazer presente que precisamente naquele mesmo ano Deus visitou a Argentina
  porque houve um grande avivamento naquela nação. Naquela ocasião Deus se usou
  de Tommy Hicks um irmão americano. No The Christian Century de Julho
  de 1954 se lêem a propósito das reuniões tidas por este irmão em Buenos Aires
  as seguintes coisas: ‘Hicks ora por eles. Ele grita: ‘Satanás, deixa-os ir,
  sai deles, deixa-os ir’. De repente um histerismo de massa parece atingir
  cada um. Os paralíticos se movem e começam a andar. As mães gritam com gratidão
  enquanto os pequenos filhos andam. O ar da noite é perturbado por milhares de
  gritos de ‘Te agradeço, Jesus’, ‘Glória, glória, glória’, ‘Amen, amen’.
  ‘Aleluia’. As lágrimas descem pelas faces de muitos. As pequenas crianças,
  curadas, correm para Hicks para beijá-lo. As bengalas e as muletas são agitadas no ar para
  significar que elas não servem mais. Um grita ‘Posso ver’ e um outro ‘Posso
  ouvir’.... Ministros com experiência e missionários de muitas nações dizem
  que nunca viram nada de semelhante’.   | 
 
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   [65] Karol
  Wojtyla nasceu na Polónia em Wadovice-Cracóvia a 18 de Maio de 1920. Foi
  eleito papa a 16 de Outubro de 1978. É muito devoto a Maria e promoveu
  altamente o culto dela. Viajou muito por todo o mundo e onde quer que tenha
  ido se ajuntaram centenas de milhar de pessoas para vê-lo e ouvi-lo. Ele diz
  que as viagens as faz ‘para anunciar o Evangelho... para confirmar os irmãos
  na fé... para consolar a Igreja... para encontrar o homem’. Financiou o
  movimento polaco de Solidarnosh fazendo-lhe chegar muito dinheiro para levar
  avante o protesto contra o regime comunista polaco de então. Adora nadar e
  esquiar. Segundo os actuais elencos do Vaticano João Paulo II resulta ser o
  264-ésimo papa. Mas é preciso dizer que sobre este número de papas entre os
  estudiosos e os teólogos católicos não há de maneira nenhuma unanimidade por
  causa de fontes históricas contraditórias e de algumas questões controversas.
  Por exemplo actualmente do elenco dos papas está omisso o de um Estevão
  eleito papa em 752 entre Zacarias (741-752) e Estevão II (752-757), porque
  este morreu três dias depois da sua eleição sem ter sido consagrado. O que
  constitui uma evidente contradição porque no mesmo elenco há papas que
  morreram sem terem sido coroados. Além disso há incertezas sobre o número dos
  antipapas (os papas ilegítimos); por exemplo são ainda reconhecidos 37 deles
  mas na realidade foram 39 porque não estão incluídos Clemente VIII
  (1423-1429) e Bento XIV (1425-1430); além disso há alguns considerados
  antipapas que porém receberam uma eleição regular. Depois permanecem as
  seguintes fortes dúvidas, Leão VIII (963-965) é colocado entre os papas mas
  deveria ser antipapa até à morte de João XII (955-964), como também Bento V
  (964-966) que é colocado entre os papas legítimos deveria ser considerado
  antipapa até à morte de Leão VIII. Como se pode bem ver resulta do presente
  elenco que Leão VIII foi papa legítimo junto com João XII por um certo tempo
  e que Bento V foi papa legítimo por um certo tempo contemporaneamente a Leão
  VIII. Além de tudo isto há a dúvida da tríplice eleição de Bento IX; no
  elenco dos papas este é feito reinar por três vezes (1032-1044: 1045;
  1047-1048) pelo que se deveriam considerar antipapas tanto Silvestre III
  (1045) como Dámaso II que pontificou em 1048 (colocados no elenco dos papas)
  se se considerassem ilegais as suas deposições. Como podeis ver os Católicos
  não estão seguros nem sequer sobre o número dos seus papas porque não sabem
  dizer com exactidão quem foram todos os antipapas; há antipapas que alguns
  reputam verdadeiros papas, e papas que outros reputam antipapas. Que confusão
  há sobre até a sua chamada sucessão apostólica!   | 
 
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   [66] O Vaticano é um pequeno Estado de cerca de 0,44 quilómetros quadrados (ainda mais pequeno que o Liechtenstein, o Mónaco e San Marino); se compõe de cinquenta edifícios, seis basílicas além da basílica de São Pedro, alguns cemitérios, os Museus e a Biblioteca, e hospeda cerca de dez mil quartos, átrios e galerias. Possui uma estação ferroviária, um heliporto donde levanta voo o helicóptero que deve levar o papa ao aeroporto de Fiumicino ou Ciampino ou à sua vila de Castel Gandolfo, alguns postos de correios, um tribunal, alguns quartéis, um posto de Bombeiros, e um laboratório onde se restauram tapeçarias. Há depois o Annona, uma espécie de supermercado onde os produtos, estando isentos de impostos, custam menos que sobre o território italiano, e por isso foi denominado ‘o paraíso do shopping’: um parque automóvel, uma garagem subterrânea e um grande e próprio parque de estacionamento; a tipografia Poliglota capaz de imprimir em quase todas as línguas conhecidas e por isso é considerada a estamparia mais rica do mundo em caracteres tipográficos; e os escritórios de algumas publicações vaticanas entre as quais a do L`Osservatore Romano. O Vaticano possui também um seu hotel, e uma farmácia. Possui também um exército entre cujo corpo mais famoso está o dos Guardas suíços que como diz o nome são todos suíços; o seu número foi reduzido por Paulo VI para setenta e cinco.  |